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Lula veta expansão desordenada

GM, Meio Ambiente, p. A8
03 de Ago de 2004

Lula veta expansão desordenada

Artigo em lei imobiliária revogava código florestal nas áreas urbanas. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva vetou no início da noite de ontem a revogação do Código Florestal em áreas urbanas, proposta pelo artigo 64 do Projeto de Lei 2109/99, que trata de incorporação e crédito para o setor imobiliário no País. A aprovação do projeto de lei pelo Congresso Federal, com o artigo 64, preocupou os órgãos estaduais de meio ambiente, organizações não-governamentais e o próprio Ministério do Meio Ambiente (MMA), pois incentivaria a ocupação urbana em áreas de preservação.
O projeto de lei 2109/99, de autoria do ex-deputado Ayrton Xerez (PSDB-RJ), foi aprovado na Câmara e no Senado no início de julho. O artigo 64, no entanto, não constava do texto original e foi incorporado posteriormente pelo deputado Ricardo Izar (PTB-SP). A matéria destaca que "na produção imobiliária, seja por incorporação ou parcelamento do solo, em áreas urbanas e de expansão urbana, não se aplicam os dispositivos da Lei 4771, de 15 de setembro de 1965".
Na prática, as áreas de preservação localizadas no perímetro urbano deixariam de ter proteção legal, o que incluiria áreas de proteção de mananciais, margens de rios, encostas, restingas e manguezais, entre outros ecossistemas. O Código Florestal regulamenta o uso e a conservação florestal e do solo em regiões urbanas e rurais instituindo a Reserva Legal e as Áreas de Preservação Permanente (APPs), que são os espaços que podem ser usados apenas em regime especial ou que devem ser preservados por questões de segurança pública.
Coordenador da Frente Parlamentar de Habitação e Desenvolvimento Urbano,o deputado Ricardo Izar, ao inserir o polêmico artigo, qualificou a aplicação do Código Florestal no meio urbano como "um dispositivo esdrúxulo, que passou a engessar as administrações municipais, que precisam enfrentar seus problemas, exigindo que se apliquem às cidades normas gerais inerentes ao meio rural e às florestas".
Campanha
Na semana passada, o Ministério do Meio Ambiente encaminhou pedido ao presidente para que vetasse o referido artigo. Na abertura de seminário sobre licenciamento ambiental em São Paulo, a ministra Marina Silva disse estar confiante no bom senso do presidente Lula, pois o artigo 64 do projeto de lei "traria sérios danos à qualidade de vida no ambiente urbano e ao abastecimento público de água, visto que representaria desproteção aos mananciais". Ao mesmo tempo, entidades de proteção ambiental lançaram a campanha "Diga não à expansão urbana desordenada", solicitando ao presidente Lula o veto ao artigo 64. Na ocasião, foi entregue uma carta assinada por 161 entidades, entre ONGs e órgãos públicos.
Para a presidente da Associação das Entidades Estaduais de Meio Ambiente (Abema), Alexandrina Sobreira, o artigo 64 representava um estímulo ao desordenamento urbano. "Era preocupante porque destruía a proteção aos remanescentes da Mata Atlântica e expunha ainda mais os ecossistemas costeiros, como manguezais e faixas de restinga, à especulação imobiliária. Certamente a inclusão desse artigo foi fruto de pressões do setor", criticou.
A entidade defende a revisão do Código Florestal, visto que a lei data de 1965 e requer adaptações à realidade atual. "Para isso, há uma câmara técnica trabalhando na questão, no âmbito do Conselho Nacional de Meio Ambiente (Conama)", diz Alexandrina.
Além da Abema, outros órgãos ambientais públicos manifestaram-se contrários ao artigo 64 do projeto de lei. Para o secretário de estado do Desenvolvimento Social, Urbano e Meio Ambiente de Santa Catarina, Sérgio José Godinho, "não é admissível que sob o pretexto de acelerar o desenvolvimento, notadamente aquele ligado ao setor imobiliário e às questões de expansão urbana, venhamos a nos sobrepor às leis vigentes, comprometendo a sustentabilidade de importantes biomas". Para Godinho, que enviou carta de apoio ao MMA, a ocupação imobiliária das áreas de preservação reverteria em desequilíbrios ambientais que resultariam em alagamentos, deslizamentos de terras e assoreamento de drenagens, entre outros problemas futuros decorrentes do uso incorreto do solo.
Plano diretor
Em vigor, o projeto de lei 2109/99 deverá afetar os municípios que não possuem plano diretor ou outra estratégia de ordenamento urbano. Em São Paulo, que possui um plano diretor, a manutenção do artigo 64 não mudaria a forma com que a ocupação do solo vem sendo feita.
"As normas urbanísticas vigentes para a edificação em áreas no município não adotam os critérios estabelecidos pelo Código Florestal e, sim, os propostos pelo Código de Obras e pela lei federal de parcelamento", comunicou em nota oficial o secretário do Verde e do Meio Ambiente, Adriano Diogo. "No entanto, face às graves inundações e à crise de abastecimento de água que a cidade enfrenta todos os anos, a partir da edição do plano diretor em 2002, ficam estabelecidos os critérios do Código Florestal nas áreas de mananciais e com remanescentes de mata, como forma de atenuação dos problemas e garantia da sustentabilidade da metrópole", acrescenta o comunicado.

GM, 03/08/2004, Meio Ambiente, p. A8

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