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Lula nega apagao e reforca Dilma

JB, Economia & Negocios, p.A17
15 de Nov de 2005

Lula nega apagão e reforça Dilma
Presidente dá aval à política energética desenhada pela chefe da Casa Civil, enfraquecendo Palocci
Ricardo Rego Monteiro e Karla Correia
Uma semana após deflagrar uma crise na área econômica do governo, criticando a política fiscal avalizada pelo ministro da Fazenda, Antonio Palocci, a chefe da Casa Civil e ex-titular da pasta de Minas e Energia, Dilma Rousseff, recebeu ontem, indiretamente, um afago do presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Embora não tenha citado em nenhum momento o nome da ministra, Lula anunciou, durante seu programa Café com o Presidente, que o país não corre o risco, pelo menos até 2010, de sofrer um novo racionamento de energia. Segundo ele, os investimentos promovidos pelo atual governo garantirão a normalidade do abastecimento energético.
O cientista político Walder de Góes, do Instituto Brasileiro de Estudos Políticos (Ibep), interpreta as declarações do presidente Lula mais como uma mensagem subliminar de apoio à ministra do que propriamente uma manifestação gratuita de otimismo. No momento em que Palocci se encontra enfraquecido pelo fogo cruzado, intensificado após entrevista de Dilma, o elogio às medidas adotadas pelo governo no setor energético acabam ganhando uma conotação diferente.
Até o primeiro semestre, Dilma ocupava a pasta de Minas e Energia, da qual saiu fortalecida, diretamente para a Casa Civil, depois do afastamento do ex-ministro José Dirceu, alvo de uma série de denúncias. Foi ela quem coordenou a equipe responsável pela elaboração do novo modelo do setor elétrico, em 2003. Segundo os especialistas, o setor terá grande teste no leilão de usinas marcado para o dia 16 de dezembro.
– O presidente Lula tem estilo muito mais pautado pela espontaneidade das declarações do que propriamente por enviar mensagens subliminares ou cifradas. O problema é que, no atual contexto de enfraquecimento de Palocci, uma declaração como a de hoje (ontem) pode ser interpretada como manifestação de apoio à chefe da Casa Civil – afirmou o cientista político. Com a afirmação, o presidente quis rebater a avaliação do setor privado, que acredita na ocorrência de uma nova crise de energia entre 2009 e 2010. Lula também aproveitou a oportunidade para atacar o governo do ex-presidente Fernando Henrique Cardoso, ao atribuir o racionamento de energia a um suposto desleixo” da administração tucana.
– Nós tivemos que fazer contenção de gastos de energia elétrica porque não tinha energia e, quando se resolveu o problema, tivemos que pagar por uma energia que nós não utilizamos porque as empresas alegaram prejuízos. Então, nós pagamos duas vezes – criticou o presidente, sem citar nomes.
Lula citou ainda os investimentos da ordem de R$ 5 bilhões previstos na construção de 9.627 quilômetros de linhas de transmissão desde o início de seu governo e lembrou os dois leilões de energia que ocorrerão ainda este ano.

Petrobras desdenha recursos do exterior
Apesar de ter se tornado investment grade - ou seja, empresa que oferece baixo risco aos investidores -, a Petrobras não pretende captar recursos no exterior para financiar seus projetos de expansão. O diretor financeiro da estatal, Almir Barbassa, afastou ontem, em conferência voltada para analistas de mercado, a hipótese de operações do gênero no próximo ano.
Para o executivo, a geração de caixa (cerca de R$ 10 bilhões de janeiro a setembro) vem surpreendendo, o que minimiza a necessidade de buscar dinheiro barato lá fora. Outras grandes empresas nacionais, como a Vale do Rio Doce, se tornaram investment grade este ano, o que barateou emissões e ajudou a viabilizar projetos bilionários.
- Por não termos realizado nenhuma captação, o impacto nas taxas de financiamento ainda não foi verificado. Mas na última que fizemos, no ano passado, houve uma antecipação do mercado ao investment grade com boas taxas oferecidas à Petrobras, devido a seus resultados - lembrou Barbassa.
No mercado internacional, depois da queda das cotações do petróleo ao menor nível em quatro meses, na semana passada, o barril voltou a subir em Nova York. O motivo: temor de escassez de combustível durante o inverno americano, devido aos baixos estoques divulgados. O óleo leve subiu US$ 0,16 o barril, para US$ 57,69.
Representantes da Organização dos Países Exportadores de Petróleo (Opep) informaram que estão avaliando o mercado para depois decidir um possível corte na produção, forçando a alta das cotações.
Em Londres, no entanto, o barril do tipo Brent voltou a recuar, fechando em baixa de US$ 0,26, aos US$ 54,73.

Leilão tem 145 interessados
Apesar do otimismo presidencial, alguns dos principais analistas do setor elétrico afirmam que o risco de uma nova crise do setor não está definitivamente afastado. Os especialistas são unânimes em afirmar que a lentidão do processo de licenciamento ambiental tem afetado não só o ritmo de construção de usinas licitadas ao longo do último governo, como também atrapalhado a inclusão de novos empreendimentos hidrelétricos no próximo leilão de energia nova, previsto para o dia 16 de dezembro, no Rio.
Ontem, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) divulgou a lista de 145 empresas que pediram para ser credenciadas para a disputa. Além de estatais como a geradora Furnas Centrais Elétricas e a distribuidora Cemig, de Minas Gerais, a lista inclui grupos de engenharia como a construtora OAS e empresas estrangeiras como a Neoenergia (Espanha) e a franco-belga Suez.
Embora o sucesso da disputa dependa do licenciamento ambiental dos projetos que o governo pretende licitar, a expectativa oficial é de que sejam garantidos cerca de 10,9 mil megawatts de energia. O leilão tem por objetivo garantir a oferta de energia ainda descontratada para 2009 e 2010. Especialistas calculam que seja necessário licitar de 3,5 mil MW a 4 mil MW para que 2010 seja um ano marcado pela normalidade no abastecimento.
Com relação às declarações do presidente, consultores afirmam ser prematuro anunciar que ''os investimentos do governo'' tenham garantido a oferta de energia necessária para que, em 2010, não ocorra um novo racionamento. Um experiente consultor, que pediu para não ser identificado, justifica a cautela ao lembrar que a ocorrência de um novo racionamento dependerá, além da conjuntura econômica, do regime hidrológico, ou seja, das chuvas.
- Se a economia crescer muito e chover pouco, a probabilidade de termos um novo racionamento é muito grande - adverte o consultor, ao lembrar que, por enquanto, o país dispõe de uma capacidade de oferta energética cerca de 5% superior à demanda.
Esse percentual, segundo ele, equivale a aproximadamente 5 mil MW. O problema, alerta, é que o ritmo de construção de novas usinas encontra-se mais lento do que o necessário para garantir uma oferta suficientemente grande para atender à demanda, em caso de expansão continuada da economia brasileira. (R.R.M)

JB, 15/11/2005, p. A17

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