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Lideranças indígenas querem tocar projetos

A Crítica (Manaus - AM)
Autor: MARTINS, Luiz Otavio
10 de Set de 2001

A partir de hoje até o dia 17, lideranças de várias etnias indígenas serão reunidas no curso Compromisso com a comunidade – Capacitação em gestão de projetos. Promovido pela Fundação Estadual de Política Indigenista do Amazonas (Fepi) com apoio das secretarias estaduais, o evento será realizado no Centro de Treinamento Padre Anchieta (Cepan), com a presença confirmada de 60 integrantes de lideranças. Hoje, na abertura do evento, o presidente das Comissões dos Direitos Indígenas, Marcos Terena, dará o seu depoimento para as lideranças, pertencentes a 18 etnias diferentes (Tükuna, Munduruku, Parintintin, Marubo, Kubeo, Tukano, Tariano, Baré, Arapaço, Sateré-Maué, Jiahui, Tenharim, Mayoruna, Mura, Kambeba, Apurinã, Kulina e Waimiri-Atroari). O Cepan fica na avenida Perimetral D, 1984, Japiim 2 (Zona Sul).De acordo com o presidente da Fepi, o antropólogo Ademir Ramos, o curso é uma oficina de trabalho para atender à demanda de reivindicações das organizações indígenas, principalmente as dos rios Negro, Solimões e Madeira. As organizações dessas áreas reivindicam muito da Fepi um curso sobre lideranças,informa Ramos, observando que as lideranças dessas comunidades precisam ter autonomia para negociar e colocar em prática os próprios projetos. Elas serão as gestoras e nós daremos assessoria, explica. O salto de qualidade que estamos dando é este trabalho de capacitação que era feito por agências missionárias ou órgãos governamentais. Agora, o Governo do Estado está assumindo pouco a pouco esse dever.O curso faz parte de uma nova fase da política indigenista do Amazonas, que teve início com a criação da Fepi, no dia 7 de agosto. A finalidade da fundação é coordenar as ações do Governo do Estado perante os povos indígenas, além de intensificar o trabalho que o Departamento Estadual de Política Indigenista (Depi) vem desenvolvendo.Na ocasião, serão apontadas as principais contestações dessas comunidades. Esse levantamento é importante para discutir o que é ou não prioridade, justifica Ramos, adiantando algumas das prioridades que, certamente, serão discutidas durante o evento. Na área da educação, ele cita a implementação da Universidade Indígena, uma proposta que visa dar continuidade à formação escolar de professores e alunos, sobretudo nas regiões dos rios Negro e Solimões (ver matéria).O presidente da Fepi cita, ainda, como prioridades, o atendimento às políticas de desenvolvimento local, incrementação no atendimento à saúde e a implementação de saneamento básico em regiões como Atalaia do Norte (a 1.138 quilômetros de Manaus), onde há muita tuberculose e malária, trabalhar a relação entre as comunidades indígenas e a questão ambiental, e repensar a política de demarcação das terras, vinculando-as a programas de sustentação de alternativas econômicas.Tais prioridades farão parte do programa Amazonas Indígena, que vai introduzir projetos de valorização étnica e de resgate da tradição cultural acumulada pelos povos indígenas. Como presidente da Fepi, tentarei negociar com o Estado e articular essas demandas, discutindo-as em termos de Governo, afirma Ramos.EVASÃODurante o curso, os participantes apresentarão relatos de experiências e farão a exposição de programas-modelo na área de etnodesenvolvimento, como os projetos Guaraná/Sateré-Maué, Mamirauá e Waimiri/Atroari. Também faz parte da programação o ensino de noções básicas de informática. A maioria das organizações indígenas já está trabalhando com a informática, que é indispensável para a comunicação simultânea, afirma Ramos. O presidente da Fepi lembra do problema de evasão das comunidades indígenas das suas áreas. A área dos Sateré-Maué possui quase 800 mil hectares demarcados, mas como não temos projetos de sustentabilidade, eles estão migrando para áreas como Parintins (a 325 quilômetros), onde ocupam bairros inteiros, e Barreirinha (a 328 quilômetros de Manaus). Então, temos de promover o etnodesenvolvimento e isso requer a capacitação das lideranças, explica. Precisamos estimular a consciência dos índios sobre o meio onde vivem e primar pela qualidade de vida desses povos.A partir do ano que vem, Ademir Ramos adianta que pretende deslocar ações semelhantes a do encontro que começa hoje para comunidades mais distantes, como a do Rio Juruá (a 672 quilômetros da capital). Também em 2002, ele espera realizar a Conferência Nacional dos Direitos Indígenas em Manaus.Universidade é sonho possívelO curso Gestão em projetos não pretende explorar, especificamente, a proposta de criação da Universidade Indígena, mas Ademir Ramos afirma que, se o assunto for mencionado, ele será discutido. Os próprios prefeitos do rio Solimões reivindicam a universidade, afirma o antropólogo.A implementação da Universidade Indígena serviria para dar continuidade à formação de professores e alunos indígenas. Segundo Ramos, a demanda de estudantes para essa universidade está fluindo também na área do rio Negro. Ele conta que o projeto já foi discutido há duas semanas com o reitor da Universidade Estadual do Amazonas (UEA), Lourenço Braga, e no momento aguarda uma decisão final. Essa universidade não representará grandes gastos para o governo, afirma. Em Tabatinga está sendo implantado um campus da UEA, o que iria beneficiar a formação de professores indígenas.Ramos informa que, atualmente, há quase 30 mil alunos indígenas, aproximadamente 600 escolas e 800 professores. É a maior comunidade escolar indígena do Brasil, diz. Outra proposta que apresentei foi a de usar uma escola agrícola federal em São Gabriel da Cachoeira, que está toda equipada com computadores e biblioteca. Bastaria que a UEA tivesse um convênio com essa escola e poderíamos ocupá-la pela parte da noite.Ademir Ramos acredita que o Estado já tem aparelhos para organizar e atender à demanda de alunos e professores das comunidades indígenas. A UEA tem de agir em consórcio com as prefeituras do interior para que sejam co-responsáveis na formação desses professores indígenas, sugere o antropólogo.

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