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Liberação da terra Awá

O Globo, Economia, p. 18
Autor: LEITÃO, Míriam
24 de Dez de 2013

Liberação da terra Awá

Míriam Leitão

Vai começar a desintrusão da Terra Awá. A palavra é estranha, mas quer dizer algo que se esperava que acontecesse ao longo deste segundo semestre, até por ordem judicial: a retirada dos não indígenas da área demarcada e registrada como dos índios do grupo Awá Guajá, no Maranhão. Chove muito esta época do ano, mas será assim que as tropas vão se deslocar.
A ordem do juiz federal no Maranhão José Carlos do Vale Madeira estabeleceu prazos e modos da retirada dos não indígenas. O governo já reuniu todos os órgãos envolvidos e concluiu o plano da retirada dos não indígenas.
Os que estiverem instalados na terra indígena receberão nos próximos dias notificações para deixar o local. Os moradores terão 40 dias para retirar seus bens. Ao final do prazo, serão desapropriados. Foram expedidos mandados de busca e apreensão de todos os equipamentos que estiverem ligados à prática criminosa.
Vão se deslocar para cumprir a ordem judicial, e o plano do governo, tropas do Exército e funcionários da Funai, ICMBio, Incra, Ministério Público, Força Nacional de Segurança, Polícia Militar do Maranhão. Foi criado, por ordem do juiz, o Comitê de Desintrusão da Terra Awá Guajá, com representantes de todos esses órgãos e mais a OAB, ABIN, Secretaria-Geral da Presidência, Ibama, um integrante da Assembleia Legislativa e outro do Governo do Maranhão.
Será instalada para executar a operação uma grande base em São João do Caru e outra em Vitória da Conquista, no Maranhão, onde há grande concentração de madeireiros.
O governo vai derrubar as cercas e fechar os ramais que foram abertos pelos madeireiros nas invasões frequentes da Terra Awá. A ideia é abrir apenas uma estrada que contorne a terra para facilitar o acesso da fiscalização. O risco é a estrada acabar facilitando novos ataques à mata onde vivem os índios, nessa área que é um dos últimos remanescentes de Floresta Amazônica no Maranhão.
Em agosto, o GLOBO publicou uma longa reportagem feita por mim e pelo fotógrafo Sebastião Salgado (*). "O Paraíso Sitiado" teve como título na primeira página o resumo do que vimos lá: "Eles estão em perigo." Era o começo da estação madeireira, e os índios estavam encurralados por madeireiros que atacavam a floresta por todos os lados. Ameaçavam reagir, mas como? São 400 pessoas de um grupo contactado no final dos anos 1990, depois de terem fugido por quase 500 anos.
Os Awá são nômades, acabaram de ser aldeados, poucos falam português, são do tronco Tupi e têm uma ligação intensa com a floresta, porque creem que a existência do mundo após a morte depende da manutenção da floresta em pé.
Como sempre, nestas situações, a ocupação da terra indígena foi feita tanto por grileiros e madeireiros, quanto pelos posseiros. A Justiça julgou que eles não são ocupantes de boa fé; ou seja, sabiam que era uma terra indígena. Apesar disso, há enorme diferença entre os dois grupos. A ordem judicial determina que os posseiros recebam ajuda do governo através de financiamentos do Pronaf, sementes, inclusão no Bolsa Família, inscrição no INSS e concessão de terra através do Incra. Há uma área próxima, em Bom Jardim, onde devem ser assentadas 60 famílias. Outras receberão crédito fundiário.
Há uma grande fazenda, o empreendimento agropecuário Alto Turiaçu, na terra indígena Awá Guaja, que terá que sair imediatamente. A Justiça determinou a desocupação da fazenda e a retirada - ou demolição - dos imóveis e dos bens móveis e animais.
A Coordenação dos Índios Isolados e Recém Contatados da Funai quer iniciar, em seguida, o trabalho de reconstituição da cobertura florestal na área desmatada da terra Awá Guajá.
(*) A série de reportagens sobre os índios Awá pode ser vista no Acervo O GLOBO, nas edições do dia 4 de agosto de 2013 e do dia 5 de agosto. Confira também o site especial Paraíso Sitiado.

O Globo, 24/12/2013, Economia, p. 18

http://oglobo.globo.com/economia/miriam/

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