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Jornada em preto e branco

OESP, Caderno 2, p. D12
03 de Mai de 2012

Jornada em preto e branco

SIMONETTA PERSICHETTI , ESPECIAL PARA O ESTADO

Cinco expedições durante o ano de 2011, uma câmera de médio formato, a Hasselblad, e centenas de imagens produzidas em filme - sim, em filme - preto e branco, e Edu Simões nos apresenta hoje o seu livro Amazônia. Mas talvez seja melhor dizer que ele nos mostra a 'sua' Amazônia. Assim como muitos viajantes, fotógrafos e sonhadores, a região faz parte do imaginário de Simões desde menino, quando folheava as revistas ilustradas como Realidade e O Cruzeiro.

A vida o levou para outras searas, primeiro para o fotojornalismo, no qual começou em 1976, e anos mais tarde, em 1996, para ser fotógrafo dos Cadernos de Literatura do Instituto Moreira Salles. Mas o sonho da Amazônia permanecia. Embora ele já andasse por lá desde os anos 1980, ainda restava a vontade de realizar um trabalho seu. Sua meta era desbravar por sua conta a imensa paisagem que permeia o ideário de muitos fotógrafos.

No ano passado, finalmente, este projeto se realizou. Em suas fotografias não há mais um cenário imaginado, mas pensado e construído, como se fosse um romance, uma prosa, por meio das sua imagens a tradução de suas descobertas que aconteciam dia a dia por meio das narrativas dos personagens que ia encontrando: "Meu objetivo era fazer um trabalho que não fosse nem jornalístico, documental ou realista, mas uma viagem pessoal que surgisse exclusivamente da vivência direta com a região amazônica, suas tradições e os seus habitantes", diz ele. "Nesse projeto, queria registrar o que mais me seduz e fascina, como a floresta, as águas, as pessoas."

Flagrantes do dia a dia, cenários e personagens, um olhar único de descoberta, com a sutileza e delicadeza de quem se aproxima querendo ouvir muito mais do que falar. Retratos posados, cenas escolhidas, paisagens que se não são épicas, são fortes e contundentes. Como afirma Edu Simões para Marcello Macca, responsável pelo texto de abertura do livro: "A realidade não é meu assunto. É meu instrumento de trabalho. Em fotografia, tudo é reinvenção. A realidade que se vê nas fotos é muito mais a realidade do fotógrafo. As minhas imagens são muito mais uma troca que faço com o teatro incessante do mundo." E foi nesse intercâmbio de olhares que encontrou os mais variados personagens.

Durante as cinco expedições de 2011, Simões passou por cidades como São Gabriel da Cachoeira, Novo Airão e Carauari, que ficam no Estado do Amazonas, além de várias localidades do Acre, Pará, Amapá, de Roraima e Rondônia. Chegou a ficar dez dias em um barco, percorrendo os rios Negro e Solimões e usou os mais variados tipos de transporte para alcançar locais de difícil acesso.

Em todos os lugares, o foco do fotógrafo paulista estava na sua visão pessoal, um diário do cotidiano do local, uma narrativa de sua epopeia. Um livro que prima pela excelência técnica, além da linguagem peculiar que nos devolve a riqueza do preto e branco num mundo onde a cor - nem sempre bem utilizada - impera.

Um mundo que se desvenda por meio de formas e volumes. Da força das pedras e das raízes da árvores à delicadeza de um voo de pássaro ou de paisagens aéreas, da dignidade dos olhares à estética dos interiores das casas, o encontro do homem com a natureza que transforma e que é por ela transformado. Não uma construção exótica, não imagens óbvias, construção de um romance em que as peças se encaixam à medida que folheamos o livro. Não uma leitura linear e muito menos um inventário da Amazônia, apenas uma entre as muitas leituras possíveis, Edu Simões nos apresenta seu romance imagético sobre a Amazônia que aprendeu a conhecer por intermédio de seus habitantes.

OESP, 03/05/2012, Caderno 2, p. D12

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