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Incra planeja fundo com uso de créditos de carbono

Valor Econômico, Especial/Desenvolvimento & inovação, p. F4
12 de Nov de 2015

Incra planeja fundo com uso de créditos de carbono

Carlos Vasconcellos

O Instituto Nacional de Colonização e Reforma Agrária (Incra) está desenvolvendo um ousado plano para financiamento de projetos inovadores na cadeia agropecuária. Segundo a presidente da instituição, Maria Lúcia Falcon, a proposta já foi apresentada ao Ministério da Fazenda, junto com a indicação das fontes de recursos. Inicialmente, o fundo contaria com cerca de R$ 1,2 bilhão para o financiamento de projetos de inovação em indústrias e serviços ligados à cadeia produtiva do setor agropecuário. "É uma estimativa que pode ser considerada como conservadora", diz Maria Lúcia.
O dinheiro viria da alienação de uma parcela do patrimônio do Ministério da Agricultura, ou, como alternativa, da cobrança de foro sobre imóveis situados em antigas propriedades da União; do aumento de arrecadação do Imposto Territorial Rural ou da captação de recursos por meio de fundos lastreados em ativos ambientais.
O Fundo de Desenvolvimento Agrário seria operado pelo Incra, enquanto o repasse dos recursos seria feito pela Caixa Econômica. A captação de recursos em créditos ambientais, por sua vez, seria de responsabilidade do Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social (BNDES).
A ideia é emitir créditos de carbono usando como lastro as áreas de reserva legal dos 88 milhões de hectares já destinados para o assentamento de agricultores beneficiados pela reforma agrária no país. A reserva legal é uma área dentro da propriedade rural que, de acordo com o Código Florestal, deve ser preservada pelo proprietário por abrigar parcela representativa do ambiente natural da região onde está inserida. Esse percentual varia entre 15% a 80% da propriedade, dependendo do bioma onde esteja localizada a propriedade em questão.
"Esse é um ativo para o mundo", diz Maria Lúcia. O dinheiro captado junto a empresas que desejam compensar suas emissões de CO2 poderia ser usado para financiar o assentamento de 114 mil famílias no campo, e ainda melhorar a condição dos assentamentos de reforma agrária existentes.
Para Maria Lúcia, a reforma agrária deve ser encarada como um instrumento de política de desenvolvimento. "O modelo de reforma agrária nos moldes tradicionais está esgotado, porque é cada vez mais complicado conseguir terras adequadas para assentar agricultores", diz. Ela explica que as propriedades que poderiam ser alvo de desapropriação estão cada vez mais distantes e mais caras, ou têm problemas de degradação ambiental, ou óbices judiciais que podem custar mais caro no futuro. O Incra estima que a desapropriação de terras para abrigar essas 129 mil famílias custaria cerca de R$ 4 bilhões não haveria recursos disponíveis hoje para fazer isso.
O plano formulado pelo Incra também inclui a atualização dos valores cobrados pela manutenção do cadastro de imóveis rurais, que é de responsabilidade do Incra. "Hoje cobramos menos do que a Caixa cobra de nós para emitir o boleto", diz Maria Lúcia.
A cobrança efetiva do Imposto Territorial Rural (ITR) é outra medida nos planos do órgão. Segundo a presidente do Incra, hoje o volume arrecadado fica abaixo dos R$ 900 milhões anuais, mas poderia chegar a R$ 8 bilhões com um sistema de arrecadação mais eficiente. "O imposto é declaratório, e a Receita Federal, hoje, não possui expertise do perito agrário para fiscalizar essas declarações", diz.
Maria Lúcia afirma ainda que o Incra planeja cobrar foro sobre antigas propriedades que pertenciam à União e que hoje estão ocupadas. Para isso, é preciso fazer um trabalho de regularização fundiária para instituir a cobrança. "Só no Rio de Janeiro, a antiga Fazenda Nacional Santa Cruz engloba nove municípios. Precisamos gerir esses ativos", destaca.
Para impulsionar os projetos de regularização fundiária, o Incra precisa de uma infraestrutura de dados que não possui. Por isso, o órgão planeja o lançamento de um satélite de sensoriamento remoto, que seria desenvolvido pela Visiona Tecnologia Espacial, subsidiária da Embraer. Com o equipamento, seria possível vistoriar fazendas e limites de terreno à distância, com margem de erro de 30 centímetros.
"Estamos negociando a participação do Ministério da Agricultura, do ICMBio e da Embrapa no projeto", conta Maria Lúcia. O valor do investimento é de R$ 300 milhões em três anos. "Com R$ 25 milhões por ano de cada instituição, podemos ter o satélite", diz.
Se não houver recursos para investir em inovação na cadeia produtiva agropecuária, Maria Lúcia acredita que o país perde oportunidades de desenvolvimento. "Recentemente, fui a uma cooperativa extrativista no Acre, e conheci um jovem que desenvolveu uma máquina para beneficiar a castanha do Pará, mas o equipamento não é patenteado. A qualquer momento o projeto pode ser copiado", conta.
"Temos que trocar a lente dos óculos para enxergar essas oportunidades e direcionar as novas gerações para processos produtivos inovadores", afirma.

Valor Econômico, 12/11/2015, Especial/Desenvolvimento & inovação, p. F4

http://www.valor.com.br/brasil/4312180/incra-planeja-fundo-com-uso-de-c…

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