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História de Barreirinha: Princesinha do Andirá completa 137 anos

Em tempo http://d.emtempo.com.br/
Autor: Itala Lima
09 de Jun de 2018

As águas esverdeadas do Rio Andirá revelam um lugar de pessoas fortes, ora pelas raízes indígenas e afrodescendentes, que em seu processo de luta ainda resistem sobre o progresso; ora pelas enchentes, que comandam a vida no interior do Amazonas.

É assim que o município de Barreirinha desenha sua história há 137 anos. Neste sábado (9), a Princesinha do Andirá, como é carinhosamente conhecido o município, faz aniversário. A história, cultura, fenômenos naturais, personalidades que ganharam destaque mundial e a luta de quilombolas são temas desta matéria especial sobre o município de Barreirinha. Também vamos mostrar aqui a programação para os festejos do aniversário.

Luta e Resistência de negros em Barreirinha

Parte da população de Barreirinha tem origem indígena. Também há muitos afrodescendentes. Os povos Sateré-Mawé habitam essa região e constantemente reivindicam melhor situação de vida, muitos falam português e fazem parte de associações indígenas que buscam diálogo com as autoridades locais. Os quilombos também se organizam em relação a seu território, um deles é o Quilombo de Santa Tereza do Matupiri, onde mora a Dona Maria Amélia do Santos, 58.

Dona Maria se criou na parte rural de Barreirinha, onde fica o Quilombo. Ela conta que as lembranças mais fortes se resumem as histórias que seu avô contava. "Nós somos remanescentes desde que o meu bisavô chegou na área onde é o quilombo, ele veio com os portugueses e ficou no Rio Andirá, depois se casou com uma indígena, chamada Gerônima. Na minha infância eu ouvia histórias que meu avô contava. Existia muita fartura, hoje não tem mais, porque as matas não têm tantas frutas, na época de janeiro e março era a safra da castanha. Eu sinto saúde de ter essa grande quantidade de frutas"

Em relação às lutas territoriais, Maria Amélia afirma que o seu quilombo ainda não foi demarcado. " Ainda não temos o título do território quilombola, ainda não fomos desmembrados. Quando foi feita a demarcação, a terra já tinha havia sido entregue na mão de cada posseiro e fazendeiros grandes". A quilombola afirmou também que já recebeu ameaças de fazendeiros devido à situação territorial. "Eu me mudei em maio para outra cidade, porque recebi uma ameaça de fazendeiros".

Para tentar fortalecer suas raízes, o povo do quilombo busca festejar suas tradições com danças "Nós dançamos o London que é uma dança onde os casais vão trocando de parceiro até terminar a música. A apresentação da Garcinha (pássaro) fazemos também, a gente se veste todo de branco. No mês de julho, dançamos quadrilha, que antigamente era chamada de contraponto", relata Maria.

Quando questionada sobre o que precisa melhorar na comunidade, ela afirma que é o acesso à saúde. "Aqui já evoluiu, o que melhorou mais na comunidade foi a educação. Na época que eu estudava, a gente ia de canoa as aulas, que às vezes ocorriam uma vez por mês. Hoje em dia já temos escolas, o que hoje não temos são as casinhas de saúde. Falaram em fazer uma UBS (Unidade Básica de Saúde) desde 2014, mas até hoje não temos".

Cultura: Thiago de Mello, o barreirinhense que encantou o mundo

Talvez Barreirinha seja mais conhecida por ser a terra natal de um dos maiores expoentes da literatura brasileira. A mata, os cantos do pássaro e o céu estrelado do município serviram de inspiração para o escritor e tradutor amazonense, Thiago de Mello. O poeta da floresta, como é conhecido, teve suas obras traduzidas para mais de trinta idiomas. Entre suas poesias estão: Faz escuro mas eu canto (1965), Os estatutos do homem (1977) e Mormaço da floresta (1984).

O escritor foi perseguido durante a Ditadura militar no Brasil e exilou-se no Chile por dez anos, onde teve intenso contato com Pablo Neruda. O livro Poesia Comprometida com a Minha e a Tua Vida rendeu-lhe, em 1975, ainda durante o regime militar, prêmio concedido pela Associação Paulista dos Críticos de Arte e tornou-o conhecido internacionalmente como um intelectual engajado na luta pelos Direitos Humanos. Após o exílio, o poeta retornou a barreirinha e continua visitando a cidade com frequência segundo os moradores do local.

A relação do escritor com o povo de Barreirinha é motivo de alegria e satisfação, pois uma das casas do Thiago de Mello, localizado no Distrito de Freguesia do Andirá, Zona rural de Barreirinha, recebia frequentemente visitas da população que tinha acesso à várias obras. É o que a técnica de enfermagem Thelma Castro, 35 revela. "A casa do Thiago de Melo é muito bonita, meus irmãos visitavam a casa, a gente podia entrar para ler livros. O Thiago de Melo é um poeta que alegra a todos e quando vem pra cá, ele fala do povo ribeirinho e pensa no bem estar da população de Barreirinha"

O poeta amazonense possui mais duas casas em Barreirinha, que foram vendidas para o Governo do Estado do Amazonas e são consideradas patrimônio do município de Barreirinha. Atualmente, permanecem abandonadas e apresentam aspecto de deterioração pela ação do tempo.

Segundo o secretário de cultura, Marcos Bahia, a situação das casas depende de iniciativas do estado do Amazonas. "O Ipham (Instituto do Patrimônio Histórico e Artístico Nacional) em 2016, visitou a casa e começou a trabalhar o projeto de tombamento da residência, o município ficou impedido de manter a conservação do local, pois a casa do Thiago não pode sofrer reforma e sim restauração". Segundo Marcos, o estado alega que não tem recurso para licitação da obra e a prefeitura está tentando outras parcerias".

Uma das casas fica na margem do Paraná do Ramos e está sendo engolida devido à forte correnteza, já a outra casa que recebe o nome "Porantim do Bom Socorro" fica na parte de trás da cidade de Barreirinha. As obras foram projetadas pelo arquiteto Lúcio Costa, autor do plano piloto de Brasília.

Além da Literatura, o povo de Barreirinha também se destaca pelo "Festival do Touro Branco e Touro Preto", além de festas religiosas. O Festival Folclórico geralmente ocorre em julho e o povo se divide, ao longo do ano para organizar a festa. Os moradores relatam que o bumbódromo de Barreirinha há algum tempo recebeu reformas devido à grandes enchentes, fenômenos naturais que comandam a vida dos barreirinhenses.

Barreirinha e as Enchentes: entrevista com pesquisadora

Uma pesquisa realizada em 2015, por meio do Programa de Iniciação ao desenvolvimento tecnológico e inovação no Amazonas, mostrou os Impactos das enchentes em Barreirinha. A cheia ocorre nos rios Paraná do Ramos e Andirá, afluentes do Rio Amazonas. Em entrevista ao Em Tempo, a assistente social Kássia Karise Carvalho, responsável pela pesquisa explica a situação.

A pesquisa teve como público servidores e pessoas que moram em bairros mais afetados pela cheia, vale destacar que há dois anos, a cidade não sofre com grandes enchentes.

Quais são os principais impactos socioambientais e econômicos ocasionados pela enchente e vazante dos rios na zona urbana de Barreirinha?

Conforme os resultados da pesquisa, a dinâmica da cidade não é a mesma no período da enchente e vazante dos rios. Em grandes enchentes, a cidade fica 90% alagada. As escolas, o comércio, as instituições de saúde e assistenciais, as habitações, enfim, a dinâmica diária do modus vivendi é readequada para este período. Muitos serviços são paralisados nesse período pela inviabilidade de realizá-los, há dificuldades na locomoção. Várias instituições têm suas atividades paralisadas ou são transferidas para outras localidades situadas em áreas mais elevadas e não alagadiças. As escolas que ficam imunes da enchente passam a servir de abrigo para as famílias que não tem condições de permanência em casa. Dos entrevistados 84% têm sua renda ou trabalho prejudicado principalmente autônomos e trabalhadores informais, sendo um impacto direto no âmbito econômico. Os entrevistados relatam a maior incidência de doenças. Agrega-se a esta realidade o lixo, e tudo mais que é despejado na água de forma inadequada prejudicando também o meio ambiente.

O que a população tem criado como estratégias para driblar as dificuldades?

A população utiliza-se de meios tradicionais como a maromba, uma medida imediata, assim como uma forma de adaptação foi a elevação do piso das residências, tendo como referência a última enchente. No que concerne o meio ambiente, os moradores demonstraram preocupação em relação à questão ambiental, evitando acúmulo de lixo nos quintais, para que posteriormente não tenham maiores problemas. Dentre outras questões.

O resultado da sua pesquisa saiu em 2016, você acha que houve mudanças na forma como as autoridades lidam com a situação das enchentes hoje em dia?

Acredito que não houve grandes mudanças, as iniciativas existem, mas ainda são rarefeitas, há muito a ser alcançado, pois esta é uma realidade que já permeia a região de forma contínua e acentuada. Há tendência a se acentuar ainda mais, uma vez que o município se localiza em área de várzea. É necessário planejamento, organização, ou seja, políticas públicas que possam garantir a melhoria de condições de vida das famílias atingidas pelo regime das águas na Amazônia. É preciso políticas públicas que possam atender as demandas das populações, no âmbito de enchentes e vazantes.

Saúde em Barreirinha

A situação da cheia preocupa profissionais da área de saúde, a Técnica de enfermagem Telma Castro, conta que casos crescentes de crianças com disenteria e vômito é comum. "Nas cheias ocorre muita diarreia, vômito e virose, crianças são as mais afetadas porque brincam na água suja"

Thelma credita que apesar dos avanços na saúde, ainda é necessário melhorias "Acho que Barreirinha precisa evoluir mais, os profissionais precisam ser mais humanizados, renovar métodos para área de saúde. Eu espero que a nova gestão de Barreirinha continue fazendo projeto para que todos tenham acesso aos seus direitos, projetos que abracem todo cidadão de todas as classe, penso dessa forma".

História: Barreirinha tem destaque na Europa

A fundação de Barreirinha ocorre em 1881 e surge com o desmembramento definitivo desta do município de Parintins. Registros históricos da Biblioteca de Barreirinha mostram que nos tempos que se seguiram à sua criação, a economia do município teve destaque internacional.

Países como Bélgica e Itália reconheceram a importância econômica da cidade devido à exportação de produtos regionais - castanha, guaraná, borracha, cacau, pirarucu, cumaru e madeira.

A princesinha do Andirá chegou a receber Menção Honrosa na Exposição Universal de Bruxelas, em 1910, e participou da Exposição Internacional da Indústria de Lavoura, em Turim, na Itália (1911), onde recebeu medalha de bronze.

Nos anos de 1920, fatos lamentáveis minaram a economia local: invasões, saques e enchentes que devastaram plantações de juta e cacau.

Programação do Aniversário de Barreirinha

A festa terá duração de dois dias, começando nesta sexta-feira (8) e encerrando no sábado (9). Torneios esportivos de handeibol, vôlei, futsal e futebol masculino prometem agitar os jovens de Barreirinha.

As modalidades fazem parte de times formados pelos bumbás locais. Já no dia 9, ocorrerá a Alvorada Festiva, com queimas de fogos pela rua da cidade, também será promovida uma corrida pedestre que sairá da orla da frente da cidade em frente à Igreja do Bom Socorro, dando uma volta na orla do município.

As atrações musicais ficarão por conta da apresentação de bandas e artistas locais, como Rapaziada do pagode, Banda Ressaquiar e Neto Cabral. Os bumbás Touro Preto e Touro Branco também realizarão uma apresentação.

Durante o evento haverá a escolha da Miss Barreirinha. Uma missa às 18h reunirá a população na Igreja Nossa Senhora do Bom Socorro.

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