VOLTAR

Governo incentivará consumo de orgânicos

FSP, Negócios, p. 25-26
24 de Jul de 2005

Governo incentivará consumo de orgânicos
Segmento, que cresce 3 0% ao ano, deverá ter a demanda e o crédito estimulados

Raquel Bocato

Zero de agrotóxicos, organismos geneticamente modificados e componentes químicos, mas crescimento de cerca de 30% ao ano. Os orgânicos têm ganhado espaço das gôndolas de mercados às das lojas de cosméticos.
Sobram dados que comprovam esse crescimento. "Haverá um incremento de até 50% no consumo desses produtos até 2008", projeta o secretário-executivo da BrasilBio (associação de produtores do segmento), Guto Mazzo.
Se depender do governo, esse aumento será ainda maior. De 10 a 16 de setembro, acontecerá a Semana dos Alimentos Orgânicos, uma iniciativa do MMA (Ministério do Meio Ambiente) e da Abras (Associação Brasileira de Supermercados), com a participação dos ministérios da Agricultura, do Desenvolvimento Social e do Desenvolvimento Agrário.
"A idéia é popularizar o consumo de orgânicos", diz o diretor de economia e ambiente da Secretaria de Desenvolvimento Sustentável do MMA, Gerson Teixeira. "Faremos uma ampla campanha com promoções sobre os benefícios do consumo de orgânicos." Em contrapartida, os supermercadistas conduzirão políticas de descontos durante o período.
Crédito
O esforço governamental não se restringe à semana de setembro. Segundo Teixeira, o país está negociando na OMC (Organização Mundial do Comércio) a inclusão de produtos orgânicos no rol dos bens ambientais. A mudança permitirá o aumento das exportações e a concessão de incentivos fiscais para quem investir na área.
"Estamos elaborando uma proposta de medida provisória para possibilitar o acesso ao crédito rural pelos produtores de orgânicos", adianta.
Mesmo sem os incentivos, há quem acredite que o cultivo já seja vantajoso. "O orgânico nunca será uma commodity", afirma o presidente da CNA (Confederação Nacional da Agricultura), Antonio Ernesto de Salvo.
Venda saudável
Em média, os orgânicos são 25% mais caros do que os similares convencionais. Essa diferença de valores, no entanto, não intimida os consumidores.
Se depender do poder de compra das mulheres, os empreendedores têm destino certo para os itens produzidos.
Delas, 96% afirmam pagar mais por uma comida saudável. O mesmo percentual diz procurar produtos que não prejudiquem o ambiente, segundo pesquisa realizada pela Latin Panel em novembro e dezembro do ano passado com 50 mil mulheres.
Mas o principal destino dos produtos brasileiros é o mercado externo. Segundo dados da BrasilBio, o comércio com outros países representou, em 2004, de 60% a 70% do faturamento total do segmento, de US$ 120 milhões. União Européia -Alemanha, Reino Unido, França e Itália-, EUA e Japão são os que mais demandam produtos brasileiros.
De acordo com Eduardo Caldas, gerente de produtos orgânicos da Apex (Agência de Promoção de Exportações), os principais produtos exportados são mel, cachaça, arroz, soja, peixe, café, açúcar, óleo de palma e algodão.
"Os produtos orgânicos estão se tornando estratégicos. O comércio com outros países tende a crescer bastante", prevê.

Certificação pode trazer benefícios
Para muitos produtores, a certificação é um martírio. É preciso ter na ponta do lápis até mesmo as horas gastas com o uso de trator no terreno. Conhecer da origem das sementes aos fornecedores e clientes é pré-requisito para conquistar o aval de uma das certificadoras de produtos orgânicos.
Apesar de tantas exigências, a certificação é a chave para abrir as portas do comércio nacional e internacional. Sem ela, é impossível fazer com que os produtos ingressem na Europa, nos EUA ou no Japão com o status de orgânico.
No Brasil, há dezenas de empresas que se dedicam à verificação da produção e do produto. Mas, se o interesse do empreendedor é ultrapassar as fronteiras nacionais, o melhor é recorrer às creditadas por entidades estrangeiras.
A periodicidade do documento é definida pelo tipo de produto cultivado. Porém, segundo o gerente da certificadora IBD, Jorge Vailati, "o selo tem de ser recebido ao menos uma vez ao ano".
"Para os itens industrializados, o processo é bem mais demorado. É preciso reunir dados dos agricultores e até mesmo dos produtores das embalagens", avisa.
Há quem acredite que o atestado possa trazer benefícios a médio prazo. "O produtor deve controlar todos os estágios de sua produção. Isso faz com que detecte desperdícios de insumos, manejo ineficiente e baixa produtividade de variedades não adaptadas à região", explica Tiago Ghion, da Aaocert, ONG de certificação.
Os valores do atestado variam de acordo com a classificação do produtor. Na agricultura familiar, é possível obter o documento por R$ 35 mensais. Pequenos e médios pagam mais -os testes e a verificação do terreno e dos produtos podem passar de R$ 1.000.

Tecnologia e capacitação são fundamentais
Associações facilitam a produção
Frutas, ervas, carnes e flores. Aí estão os nichos de mercado ainda pouco explorados pelos produtores de orgânicos, de acordo com especialistas ouvidos pela Folha.
Mas, para vender esses produtos, é necessário mais do que eleger os itens ainda pouco cultivados no país. Capacitação, escolha de mudas que se adaptem às condições climáticas e geográficas do local e seleção prévia do mercado consumidor são indispensáveis.
A consultora do Sebrae-DF (Serviço Brasileiro de Apoio às Micro e Pequenas Empresas) Aimée Faria aconselha que os produtores se unam em associações. "Assim, a venda de itens e a compra de insumos são mais fáceis."
De acordo com estimativas da BrasilBio e do Ministério da Agricultura, o Brasil conta com aproximadamente 20 mil produtores, dos quais cerca de 90% enquadram-se na agricultura familiar.
A Horta & Arte, associação que reúne 135 agricultores, é uma das que apostaram na união para colher frutos mais saborosos. "Começamos em uma feira da capital paulista, mas ela se tornou pequena para tantos produtores", conta o diretor Filipe Mesquita.
Manter-se em grupo também facilitou-lhe uma parceria com a Embrapa (Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária) para o estudo do aumento de produtividade no cultivo de hortaliças.
Beleza à mesa
Nesse campo, inovação tecnológica é fundamental. Hoje, aparência é essencial: foi-se o tempo em que os orgânicos não faziam frente aos convencionais. "Eles têm de ser tão bonitos quanto os outros", analisa o diretor de agronegócios do Carrefour, Arnaldo Eijsink.

Cosmético volta-se para o exterior
Até o príncipe Charles, herdeiro do trono britânico, está se aventurando pelo mundo dos orgânicos. Com a marca Duchy Originals, comercializa, desde maio, sabonetes, hidratantes, loções corporais, xampus e condicionadores.
No exterior, produtos não testados em animais, compostos apenas por ingredientes vegetais e que têm um compromisso com o ambiente apresentam apelo popular. Por aqui, sua aceitação ainda é considerada uma incógnita.
"Montei a empresa para ingressar no mercado internacional", diz Fernando Lima, da Florestas. "No Brasil, as classes A e B têm conhecimento do produto. Mas é preciso um trabalho de base para estimular o consumo interno."
Estados Unidos, Hong Kong, Holanda, Inglaterra e França já conhecem a linha de produtos da empresa, que vende xampus, loções corporais e cremes faciais. "No último ano, tive um aumento no faturamento de 70% a 80%."
Quem também espera um incremento significativo nos lucros é a empresária Simone Valladares. "O conceito de cosméticos orgânicos começa a tomar força no país", diz a empreendedora, que não descarta a possibilidade de vender seus produtos lá fora.
Valladares já produzia óleos essenciais orgânicos e acaba de acrescentar sabonetes em barra a sua linha. "Quero aumentar o "mix", mas faltam matéria-prima e tecnologia para chegar a um item que atenda aos requisitos das certificadoras", afirma. (RB)

Mercados específicos são aposta do varejo
Em meio a milhares de frutas, legumes e verduras, uma única gôndola era reduto dos produtos orgânicos. O panorama de dez anos atrás era muito diferente do encontrado hoje nos supermercados. Agora, há espaços inteiros destinados às variedades de tomates, laranjas e alfaces.
A explicação está na procura pelos alimentos e no retorno financeiro proporcionado aos varejistas. "Temos um público cativo para esses produtos", explica a gerente de compras da Companhia Brasileira de Distribuição, Sandra Caires. Aliado a isso, as empresas do grupo, como o Pão de Açúcar, lançam mão de alternativas para conquistar novos consumidores. "Estimulamos o consumo por meio de promoções em dias específicos da semana", conta.
Com 20 lojas no Brasil, a Hortifruti vai transferir os orgânicos de geladeiras para alas próprias em quatro pontos-de-venda. "A aceitação do público será o termômetro para investir em comércios voltados somente à venda desses produtos", avalia o diretor comercial da rede, Carlos Lopes.
É o que fazem os proprietários da Caminhos da Roça e da Empório em Casa. Ambas as empresas dedicam-se à comercialização e à entrega de alimentos orgânicos na residência do consumidor.
"O distribuidor deve estabelecer parcerias com produtores para ter preços mais competitivos que os do varejo", explica Danilo Pellegrino, da Empório em Casa.
Marina Pascon, consultora e dona da Caminhos da Roça, acrescenta: "Para o negócio dar certo, é preciso estabelecer margens de lucros diferenciadas para cada produto". Outra dica é nunca deixar que os alimentos faltem na mesa do consumidor. (RB)

Praticas proibidas
Saiba o que não é permitido
No cultivo de alimentos orgânicos
Agrotóxicos
Água contaminada
Arações profundas
Desmatamento
Hormônios vegetais
Manutenção de monocultura
Plantio sem práticas conservacionistas
Queimadas
Sementes transgênicas
Sementes tratadas quimicamente
Umidade do solo fora do padrão

Na criação de rebanhos
Confinamento e imobilização prolongados
Manejo que leve animais ao sofrimento e ao estresse
Transferência de embriões
Uso de aminoácidos sintéticos, promotores de crescimento, uréia e restos de abatedouros
Descorna e outras mutilações
Presença de animais geneticamente modificados
fontes: especialistas

FSP, 24/07/2005, Negócios, p. 25-26

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.