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Evento e publicação do ISA analisam e propõem soluções para incentivos econômicos à regularização ambiental

ISA - http://www.socioambiental.org
Autor: Oswaldo Braga de Souza
02 de Abr de 2012

As linhas de crédito para práticas sustentáveis e regularização ambiental da agropecuária continuam com níveis de acesso muito baixos. A solução para o problema passa por premiar os produtores que seguem a lei ou disponham-se a fazê-lo, por exemplo, reduzindo taxas de juros e ampliando os limites de financiamento nas linhas tradicionais de financiamento.

Essas são algumas das conclusões e sugestões do estudo "Financiamento Agroambiental - Subsídios para o desenvolvimento de políticas de crédito de apoio à regularização ambiental de propriedades rurais", de autoria do ISA.

A publicação foi lançada numa oficina que discutiu seus resultados e propostas para dar escala aos incentivos econômicos à adequação socioambiental da produção agropecuária, na quinta (29/3), na Universidade de Brasília (UnB).

Há poucas pesquisas sobre o assunto, daí a importância do estudo no momento em que se discute no País como estimular a recuperação de passivos e valorizar ativos ambientais.

"A publicação surgiu de uma preocupação da sociedade civil de dar coerência entre a política ambiental e a política agrícola, para que uma possa ajudar a outra", resumiu Raul do Valle, coordenador adjunto de Política e Direito Socioambiental do ISA, ao abrir o evento. "O desafio é como transformar a política agrícola também num mecanismo para cumprir a legislação ambiental", finalizou.

"Queremos ajustar o modelo operacional dos instrumentos de política agrícola", afirmou o secretário executivo do Mapa (Ministério da Agricultura), José Carlos Vaz, que participou da oficina. "Esse é um trabalho que começamos a fazer agora no plano de safra que vai considerar também regionalização, diferenciação em função do porte do produtor e o enquadramento em função das questões ambientais. Mas precisamos dar tempo para o produtor conhecer as tecnologias que precisam ser usadas, ter assistência técnica, incentivos para poder se posicionar em relação a isso", comentou.

Vaz disse que o ministério está aberto a discutir o assunto com a sociedade civil, outros ministérios e os bancos. "Temos de abrir esse diálogo e construir soluções conjuntas" (ouça aqui a fala do secretário executivo do Mapa na oficina).

De acordo com Léa Vaz Cardoso, assessora de políticas públicas do ISA e organizadora da publicação, o objetivo do estudo e da oficina foi ampliar e amadurecer a discussão na sociedade civil sobre propostas que possam se transformar em políticas públicas concretas. "Nossa expectativa é que já para as próximas safras possamos ter uma diferenciação positiva para os produtores que empreendam práticas de conservação."

Estudo

O estudo do ISA apresenta o perfil do crédito agrícola no Brasil e avalia algumas linhas de crédito agroambientais, disponibilizadas por instituições como o Banco do Brasil e BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e Social), analisando gargalos a sua operacionalização. As políticas agroambientais são aquelas com objetivo ambiental e destinadas ao produtor rural.

O livro aponta as razões da ineficiência dessas linhas. O levantamento foi feito com base em entrevistas a produtores e representantes de instituições bancárias (leia o resumo e a a íntegra do texto da publicação).

A necessidade de apoiar e premiar os produtores rurais que cumprem a legislação florestal e adotam práticas sustentáveis é hoje praticamente um consenso entre pesquisadores, técnicos, ambientalistas e lideranças do setor agropecuário. O desafio é como tirar a ideia do papel.

O estudo do ISA mostra, por exemplo, que na safra 2010-2011 foram desembolsados pelo BNDES em suas linhas agroambientais pouco mais de R$ 419 milhões. Parece muito, mas o total representa só 2,8% do crédito agrícola liberado pelo banco no período.

Além disso, esses R$ 419 milhões incluem todo os tipos de financiamentos previstos, como, por exemplo, para o plantio de florestas homogêneas (pinus e eucalipto). Para a recuperação de vegetação nativa, foi identificada apenas uma operação, no valor de R$ 557 mil ou 0,1% do total.

Os dados do Banco do Brasil, principal financiador do crédito rural, para a carteira de linhas de financiamento "florestais" indicam redução, tanto no volume de crédito (de cerca de R$ 250 milhões para pouco menos de R$ 232 milhões), quanto no número de contratos (de 3.376 para 2.670), entre as safras 2009-2010 e 2010-2011.

Nos municípios do Programa Arco Verde, aqueles da Amazônia que têm prioridade nas políticas de combate ao desmatamento, não foi identificado nenhum contrato concedido pelo Banco do Brasil nas linhas agroambientais no período de 2007-2008 a novembro de 2010. Apesar de haver restrição de crédito para produtores que não estão regularizados ambientalmente, não houve queda no montante de crédito agrícola convencional tradicional liberado na região entre 2008 e 2011.

Para a agricultura familiar, a participação dos programas agroambientais também apresenta uma baixa taxa de desembolso. Embora o volume de crédito desembolsado para essas linhas do Pronaf (Programa Nacional de Fortalecimento da Agricultura Familiar) tenha evoluído de R$ 8,4 milhões, na safra 2004-2005, para R$ 26,1 milhões, na safra 2009-2010, sua participação no volume total de crédito de investimento do programa continua irrisória, tendo variado de 0,14% para apenas 0,22%, entre as safras 2004-2005 e 2009-2010.

"A execução ainda é baixa e precisa dar um salto significativo", admitiu Marco Aurélio Pavarino, assessor de meio ambiente do ministro do Desenvolvimento Agrário. Para ele, as linhas de crédito agroambientais ainda são recentes, daí o desconhecimento de muitos produtores sobre elas.

A publicação do ISA mostra justamente que, além de um pacote de medidas que incentivem o produtor a regularizar-se, falta informação para que isso aconteça.

"O conhecimento da linha é muito importante, mas, no caso dos médios e grandes produtores, há também a questão do risco da parte do agente financeiro. A operação com linhas agroambientais é de longo prazo, com pacote tecnológico não tão bem definido. Isso implica um risco maior para o agente financeiro", analisou Léa Cardoso.

Ela avaliou que, mesmo que os desembolsos do crédito agroambiental ainda seja pequeno, há indícios de que o cenário está mudando. "Os próprios números do MAPA apontam uma melhora na execução nos últimos meses. Há todo um esforço da CNA [Conferação da Agricultura e Pecuária do Brasil], dos ministérios envolvidos, Banco do Brasil, Embrapa [Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária], das organizações não governamentais para que esse tipo de incentivo saia do papel. Já que consideramos que há avanços, a nossa preocupação agora é que consigamos focar e direcionar uma parte desses recursos para a recuperação de Áreas de Preservação Permanente e Reserva Legal", afirmou.

A ineficiência da assistência técnica e extensão rural é uma questão levantada no livro que também foi destacada na oficina. "Se não tivermos uma boa assistência, pesquisa e diagnósticos bem feitos, podemos ter todo crédito do mundo e não conseguiremos fazer as coisas do jeito certo", alertou Mauro Lúcio da Costa, presidente do Sindicato de Produtores Rurais de Paragominas (PA). O município foi o primeiro a sair da lista oficial dos maiores desmatadores da Amazônia e vem destacando-se por um conjunto de iniciativas socioambientais.

Evento

O evento contou ainda com a participação de representantes do Banco do Brasil, Organização das Cooperativas Brasileiras (OCB), Confederação Nacional dos Trabalhadores na Agricultura (Contag), dos ministérios da Fazenda e de Meio Ambiente e de organizações não governamentais socioambientalistas.

A oficina foi uma iniciativa do ISA no âmbito do projeto "Preparando o Brasil para o REDD", que conta com a participação da TNC (The Nature Conservancy), ICV (Instituto Centro de Vida), Fundo Brasileiro para a Biodiversidade (Funbio), Instituto do Homem e Meio Ambiente da Amazônia (Imazon) e Fundo para Defesa Ambiental (EDF). O projeto tem apoio da USAID (Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional). O evento também contou com apoio da RFN (Rainforest Foudation).

A publicação é uma iniciativa do ISA, em parceria com o ICV e TNC, com apoio da USAID, no âmbito do projeto "Governança ambiental e produção responsável". Contou ainda com apoio da RFN.

http://www.socioambiental.org/nsa/detalhe?id=3520

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