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Estatuto espera votação há 11 anos

Diário Catarinense-Florianópolis-SC
Autor: José Luiz Medeiros e CARLA PIMENTEL
17 de Fev de 2002

Emperrado na Câmara dos Deputados, novo texto não é uma unanimidade e traz pontos polêmicos, como a atuação de mineradoras em reservas indígenas

Iniciativas como festivais culturais, jogos e encontros de pajés ajudam a preservar as tradições de diferentes etnias

Os anos 70 deixaram lá suas heranças. As marcas deixadas pelo estilo de vestir e os ritmos musicais são conhecidíssimos. O que nem todos sabem é que também vem daquela época a lei 6001, conjunto de normas que até hoje regulamenta a questão indígena no país.

Só que, entre aqueles tempos e os dias de hoje, foi redigida uma nova Constituição Federal - a de 1998. E o que inquieta é que, na Carta Magna, muitas coisas foram mudadas, mas estão ainda à espera de regulamentação, já que o Estatuto das Sociedades Indígenas não foi aprovado.

Aliás, a aprovação do Estatuto está pendente há 11 anos. Por enquanto, o assunto continua empacado na Câmara dos Deputados, e a lei em vigor permanece tal qual idealizada há três décadas.

O problema é que, desde aquele tempo, muita coisa mudou. Para começar, a lei 6001 define o índio como um sujeito passível de integração - e isso o faria desaparecer. Em outras palavras: representantes dos povos indígenas poderiam deslocar-se para as cidades, e isso, de acordo com o entendimento da época, faria com que deixassem de ser índios. "Isso transformava os indígenas em seres temporários", descreve o coordenador geral de Direitos Indígenas da Funai, Marcos Terena.

Agora, a leitura não é a mesma: índios na cidade não deixam de ser índios. Além disso, na contramão desta tendência de desaparecimento, surgem campanhas de auto-afirmação de diferentes culturas - através de jogos indígenas, festivais culturais, encontros de pajés e outras iniciativas. Mas, mesmo que os tempos sejam outros, a legislação continua assentada sobre velhas concepções.

A proposta do novo estatuto, para Marcos Terena, traz alguns avanços em relação ao anterior, o que o atualiza. Para a antropóloga Maria Fátima Roberto Machado, as vantagens do documento começam pelo nome: o Estatuto, agora, pretende regulamentar diversos aspectos da vida das sociedades indígenas, e não simplesmente dos índios de maneira uniformizada. A mudança pode ser semântica, mas abandona a noção genérica de "índios", para abrir caminho para a idéia da existência de diferentes povos, com suas manifestações culturais e formas de organização próprias.

Para o coordenador do Programa Xingu do Instituto Socioambiental, André Villas Boas, as novas regras poderão trazer alguns avanços para as sociedades indígenas, como a atribuição de poder de polícia aos membros da Funai - o que, a seu ver, facilitaria as atividades de monitoramento das reservas.

"Este estatuto já deveria ter sido assinado. Mas José Gregori (então ministro da Justiça) recuou, e a proposta continua engavetada na Câmara", reclama Marcos Terena.

PONTOS POLÊMICOS - O Estatuto das Sociedades Indígenas não é unanimidade, já que guarda alguns aspectos que despertam discussões. Os principais pontos de discórdia dividem-se em duas vertentes: de um lado, está a atuação de mineradoras para extração riquezas do subsolo de reservas. De outro, a possibilidade de que os índios não venham mais a ser tutelados pelo governo federal. Tanto em torno de uma questão quanto da outra, não há um denominador comum. Enquanto o novo texto gera polêmica e continua guardado em alguma gaveta de Brasília, a antiga lei que rege a questão indígena continua ditando as regras.

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