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Esperança verde

CB, Economia, p. 15
11 de Jan de 2007

Esperança verde
Produtores e fornecedores do setor agrícola acreditam em recuperação este ano. Segmento de máquinas, adubos e defensivos começaram a sentir o bom momento no início do plantio da safra 2006-2007

Luís Osvaldo Grossmann e Luciano Pires
Da equipe do Correio

O pior já passou. Ainda não será em 2007 que a agricultura brasileira voltará ao patamar de 2003-2004, mas o cenário difícil dos dois últimos anos parece estar ficando para trás. A valorização de preços de grãos, puxada especialmente pelo impulso dos combustíveis "verdes", já permite às indústrias de máquinas agrícolas e fertilizantes pensarem em recuperação.

"Parece que chegamos ao fundo do poço e agora começa a recuperação. Não dá para pensar em grandes perspectivas, porque o agricultor continua endividado. Mas se as coisas continuarem como estão, 2008 será bem melhor", diz o presidente da Associação Brasileira da Indústria de Máquinas e Equipamentos (Abimaq), Newton de Mello.

O diretor-executivo da Associação Nacional para Difusão de Adubos (Anda), Eduardo Daher, também acredita em recuperação e diz que os primeiros sinais vieram no fim do ano passado. "Começamos o ano de 2006 calculando uma queda de 5%, depois de um recuo de 11% em 2005, mas terminamos o ano melhor do que imaginávamos, com crescimento de 1,5%", explica. Ele conta que no início do plantio da safra 2006-2007, em outubro e novembro, a procura por fertilizantes bateu recordes. "Chegamos a ter fila nas fábricas", lembra.

As vendas, que ficaram entre 20,5 milhões e 21 milhões de toneladas, foram superiores às 20,1 milhões de 2005, mas não o suficiente para recuperar o faturamento, que caiu 7,5%, na esteira da valorização do real. Agora, o setor calcula crescer 4% em 2007. "É certamente uma perspectiva mais favorável", reconhece Daher.

Filas também começam a aparecer nas concessionárias de máquinas agrícolas, mas isso se deve mais à redução na produção - com a queda nas vendas, fabricantes suspenderam as atividades durante quatro meses e deram férias coletivas aos funcionários. Jaime Demarchi, proprietário da Copetral Tratores, em Sinop (MT), a 500quilômetrosde Cuiabá, explica que 2007 começou "muito bem" e nem se compara ao que foi 2006. O diagnóstico se comprova nas vendas. "E por incrível que pareça a turma está pagando à vista", comemora.

A Copetral trabalha com as principais marcas do mercado. Vende implementos para a criação de gado e pulverização de lavouras, além de tratores e colheitadeiras. "Tomei muito calote em 2005 e 2006, mas agora estou conseguindo receber", afirma Demarchi. Segundo ele, as fábricas estão pedindo 30 dias de prazo para entregar implementos e 60 para tratores. Em Mato Grosso, as boas previsões para a safra de algodão acabaram impulsionando a venda de maquinário para esse tipo de cultura.

A Associação Nacional de Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), prevê um crescimento de 13% para o segmento no ano. "Esperamos como piso a venda de 29 mil unidades. É mais do que o saldo do ano passado, mas ainda é um número baixo se compararmos com a necessidade do agricultor. Em 2003 e 2004 estávamos vendendo mais de 40 mil máquinas por ano, mas caímos para cerca de 23 mil em 2005", diz o vice-presidente da entidade, Persio Luiz Pastre.

Há, porém, muita cautela. Afinal, todos os analistas avaliam que a situação dos agricultores não permite grandes investimentos. Especialmente no mercado de colheitadeiras, que sofreu com o recuo dos grãos. "Em 2004, foram vendidas 5,3 mil colheitadeiras. Em 2005, 1,5 mil e no ano passado pouco mais de mil. Para retomar leva tempo. Os agricultores precisam recuperar a rentabilidade e equacionar as dívidas para pensarem novamente em investir. Ainda temos um caminho a percorrer", explica o diretor de marketing da Massey Ferguson, Fabio Piltcher. A empresa domina um terço do mercado de máquinas agrícolas no Brasil.

Piltcher acredita em um aumento de 8% a 13% nas vendas em 2007 - em especial por causa do comércio de tratores, que são versáteis e podem ser utilizados em áreas que tiveram melhor desempenho (como cana-de-açúcar, cítricos, café e celulose). A reação das colheitadeiras deve vir só depois. "A safra 2006-2007 vai recuperar o fôlego e permitir a entrada de recursos na cadeia agrícola. Os agricultores estarão mais preparados para 2007-2008 e, se continuar bom, em 2009 estaremos recuperados", acredita Patres, da Anfavea.

Agricultor de MT age com cautela

Os ventos que contagiam a indústria teimam em não chegar ao campo. Pelo menos em Mato Grosso, maior produtor de grãos do país, nem todos os agricultores foram às compras. O principal motivo são as dívidas, que prejudicaram a captação de novos empréstimos. De um total de R$ 20,3 bilhões em pagamentos atrasados com os fornecedores, R$ 4,3 bilhões (17%) estão nas mãos dos 6 mil agroempresários do estado. O montante em aberto barra novos investimentos.

Rui Ottoni Prado, presidente da Associação dos Produtores de Soja de Mato Grosso (Aprosoja), admite que há um clima de esperança nas lavouras, mas descarta qualquer onda de otimismo. "Nenhum amigo meu está comprando máquina. Ninguém está gastando por conta", afirma. Segundo ele, a safra 2006/2007, que começará a ser colhida em abril e maio, tende a ser melhor do que as duas últimas. Tal performance, porém, não vai recuperar o fluxo de caixa de quem planta ou cria.

Nas principais regiões produtoras de Mato Grosso os reflexos da crise são visíveis. A inadimplência no comércio é alta, o Banco do Brasil ainda negocia a recuperação de créditos e a contratação de mão-de-obra caminha a passos lentos. Rogério Salles, médio agricultor em Rondonópolis (MT), 210 km de Cuiabá, afirma que não está trabalhando com a perspectiva de prejuízo, mas os lucros serão limitados. "Dá para sentar e começar a negociar com os credores", brinca. Apesar de ter encolhido a área de soja plantada em 30%, o custo de produção baixou e o clima está bom. Na matemática do campo isso indica que haverá ganhos. Mas nada que o estimule a investir no negócio. "É um período de cautela, não de apostas", completa.

Antônio Galvan, presidente do Sindicato Rural de Sinop (MT), a 500 km de Cuiabá, explica que algumas das maiores concessionária do estado não venderam sequer uma colheitadeira nas safras passadas. "Tem gente pagando máquina comprada em 2004. Como é que pode adquirir trator novo?", questiona. Galvan, que planta soja e arroz, reduziu a área em 10%, o que, segundo ele, é uma tendência na região. Alegando dificuldades em negociar um passivo financeiro junto ao Banco do Brasil, o produtor reivindica um novo refinanciamento das dívidas. "O que o governo tem de fazer é diluir em 15 anos os pagamentos em aberto de 2005 e 2006. Só assim é possível resolver o problema", reforça.

José Otaviano Nardes, grande produtor de soja em Primavera (MT), a 230 quilômetros de Cuiabá, concorda e vai além. Para ele, as fontes públicas de financiamento da produção precisam ser ampliadas e seus modelos revistos. "Cerca de 60% da produção já está comprometida com as tradings (multinacionais que financiam parte da safra). A gente precisa de alternativas para fugir dos juros altos", explica. (LOG e LP)

Recorde em veículos

Enquanto o setor de máquinas agrícolas luta para se recuperar, a produção brasileira de veículos voltou a bater recorde em 2006. No ano passado foram fabricados 2,61 milhões de veículos, 3,1% acima do pico anterior, registrado em 2005. Mesmo com novo recorde, a produção ficou um pouco abaixo das expectativas da Associação Nacional dos Fabricantes de Veículos Automotores (Anfavea), que acreditava numa expansão de 4% sobre os 2,5 milhões de unidades fabricadas em 2005.

Segundo a Anfavea, a diferença sofreu o impacto da forte redução no nível de atividade em dezembro. Considerando apenas o mês passado, a produção somou 185,3 mil unidades - uma queda de 10% sobre dezembro de 2005 e de 16,5% na comparação com novembro.

As vendas no mercado interno chegaram a 1,92 milhão de unidades, resultado muito próximo do recorde histórico alcançado em 1997, de 1,93 milhão de veículos. Sobre 2005, o crescimento foi de 12,4%. A expectativa para 2007 é de novo crescimento, de 7,7% nas vendas e de 3,8% na produção.

Já as exportações de veículos somaram US$ 12,1 bilhões, valor 8,4% superior ao de 2005, mas dentro das expectativas da associação de fabricantes. O resultado, que inclui também máquinas agrícolas, motores e componentes, é o maior já registrado pelo setor.

A ajuda foi dos preços, uma vez que as 844,7 mil unidades significaram vendas 5,8% menores que no ano anterior. Nesse terreno, a Anfavea reclama da valorização do real sobre o dólar. A indústria espera repetir o desempenho exportador este ano.

Indústria geral
Também ontem foram divulgados os desempenhos regionais da produção industrial em novembro do ano passado, Segundo o Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), naquele mês houve crescimento em nove dos 14 locais pesquisados. Em relação a novembro de 2005, 13 dos 14 locais pesquisados registraram aumento na produção.

Para o economista André Macedo, da coordenação de indústria do IBGE, os resultados da produção regional confirmam o padrão de crescimento observado para o total da indústria brasileira ao longo de 2006, com os locais que apresentam resultados acima da média nacional voltados especialmente para a exportação, principalmente de commodities como minério de ferro, petróleo, produtos siderúrgicos, açúcar e celulose, ou produtores de bens de consumo duráveis - automóveis e eletrodomésticos. (LOG)

CB, 11/01/2007, Economia, p. 15

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