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Escravidão e reação

CB, Opinião, p. 20
13 de Fev de 2004

Escravidão e reação

Mereceu reação adequada do Legislativo o clamor nacional que se seguiu à execução de três auditores fiscais e um motorista do Ministério do Trabalho há quatorze dias em Unaí, Minas Gerais. Os servidores foram fuzilados por pistoleiros quando fiscalizavam a existência de trabalho escravo em propriedades rurais da região. Há indícios veementes de que os braços assassinos foram armados por fazendeiros. Agora, a Comissão de Constituição e Justiça da Câmara dos Deputados aprov ou proposta de emenda constitucional apta a extinguir os bolsões de escravismo nos campos.

A atribuição de poderes ao Estado para o confisco de glebas exploradas em regime de opressão a trabalhadores é contrapartida punitiva proporcional à barbaridade praticada. Também se filia a princípio adequado de justiça conceder prioridade ao assentamento das vítimas da brutalidade nas terras identificadas como abrigos de senzalas. Não pode merecer outro tratamento do governo quem ousa insistir em práticas escravagistas no país, abolidas há quase 116 anos.

Outra virtude da inserção no texto constitucional da medida confiscatória reside em destinar ao programa de reforma agrária as terras transferidas ao patrimônio do poder público. Segundo estatísticas disponíveis na Organização Internacional do Trabalho (OIT), vai além de quarenta mil o número de brasileiros afrontados em seus direitos fundamentais pela infâmia da servidão. Daí, pode-se extrapolar que são significativas as extensões de solos agricultáveis sujeitos a confisco.

Vai a matéria ao plenário das duas casas do Congresso em regime de urgência urgentíssima. A aprovação é pacífica. Não há voz discordante na maioria parlamentar que apóia o governo, principal interessado em dispor de um instrumento legal para agir com rapidez.

Não se deve ignorar, também, aspecto colateral de grande importância para o país. A eliminação de resquícios medievais em certas práticas das relações trabalhi stas, ainda que figurem como exceções mínimas em relação ao conjunto do sistema empregatício, provocará efeitos econômicos positivos no plano externo. Quebra-se um dos eixos que movimentam barreiras alfandegárias artificiais, como embargos às exportações procedentes de países acusados de praticar ou tolerar trabalho escravo.

Daqui por diante, cabe às bancadas da Câmara e do Senado identificar os prazos regimentais mais curtos possíveis para a deliberação final. Urge encurtar o tempo para entregar ao governo a ferramenta jurídica de combate imediato aos escravocratas dos campos.

CB, 13/02/2004, Opinião, p.20

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