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Eletronorte se divide em duas a partir de agosto

O Liberal-Belém-PA
03 de Jun de 2002

O presidente da Centrais Elétricas do Norte do Brasil (Eletronorte), José Antonio Muniz Lopes, garante que a cisão da empresa vai ocorrer até o final de agosto. Em entrevista exclusiva à reporter Sônia Zaghetto, da Sucursal de Brasília, ele detalha a remodelação da matriz energética nacional, particularmente da Eletronorte; explica a razão do adiamento da cisão das estatais federais; informa sobre os planos de instalar uma termelétrica em Belém; e atribui ao desconhecimento a oposição que se tem feito à usina de Belo Monte, em Altamira.

Há rumores de que o governo teria planos de fundir a Eletronorte com Chesf e Furnas. É verdade?

Quando da definição da remodelagem das empresas - separação da geração e da transmissão - pensou-se na possibilidade das empresas de geração virem a ser fundidas, mas essa questão não está em pauta no momento. Hoje está em pauta a cisão da Eletronorte, a criação de duas empresas de geração e uma de transmissão na Chesf e o reordenamento institucional de Furnas.

Na reestruturação do setor elétrico o governo reviu várias propostas. Por que tanto desencontro?

No primeiro momento tínhamos duas opções: a privatização de ativos e a adequação da estrutura das empresas ao novo modelo do setor elétrico brasileiro. A privatização das empresas federais não será mais tocada, mas a não adequação das empresas ao modelo vai penalizá-las. É isso que estou tentando mostrar aos sindicatos. A geração tem um esquema de gestão voltado para resultados e competição, enquanto que a transmissão é regulada. E se na transmissão há pouca participação do setor privado, 70% da geração estão nas mãos de empresas privadas.

O que vai acontecer lá na frente é que seremos um patinho no meio de gansos, porque seremos estatais no meio de empresas privadas. Então, é fundamental que se faça a separação.

Por que foi adiada a cisão da Eletronorte, de Chesf e Furnas marcada para o dia 22 de maio?

A cisão está condicionada ao fornecimento, pelo Mercado Atacadista de Energia, da contabilização da energia de 2002. Ainda temos dificuldade na contabilização da energia de 2001 e não conseguimos equacionar a liquidação de 2002. A Eletrobrás nos orientou que considerássemos o balanço de 30 de maio de 2002. Isso significa dizer que o BNDES espera receber o balanço ainda neste mês.

Como fica a Eletronorte após a cisão?

A cisão é simplesmente a criação de uma empresa de geração e de uma empresa de transmissão que será composta pelos ativos de transmissão da Eletronorte atual. Vão surgir duas grandes empresas: uma que vai ter patrimônio e ativos de quase R$ 5 bilhões e uma outra que vai ter ativos de quase R$ 13 bilhões. Em vez de uma, serão duas grandes empresas na Amazônia.

Como vão ficar Furnas e Chesf?

De Furnas sairão duas empresas, uma de transmissão, que continuará subordinada à Eletrobrás, e outra de geração, que será independente da Eletrobrás, mas vinculada aos mesmos acionistas. Esta terá suas ações pulverizadas para venda no mercado. Quanto à Chesf, será cisão mesmo, no sentido amplo da palavra. Será dividida em três empresas: a Chesf Transmissão, subordinada à Eletrobrás, estatal de economia mista; a Chesf Energia, que inclui a hidrelétrica de Xingó, também subordinada à Eletrobrás; e uma terceira empresa - essa é uma grande novidade no Brasil - constituída por todas as demais usinas da Chesf. Será uma empresa pública. Com a receita, essa empresa vai trabalhar para abastecer o Nordeste: perenizando rios, recuperando bacias hidrográficas, construindo reservatórios, fazendo transposição de bacias. É uma transformação radical que eu defendo com toda veemência por entender que será excelente para o Brasil.

A geração incluirá não só emprendimentos lucrativos, como Tucuruí, mas também sistemas com resultados negativos...

Sim. Dentro da Eletronorte Geração há parques térmicos antigos, as distribuidoras de Manaus e Boa Vista, máquinas ultrapassadas. Então há todo um programa gerencial para colocá-los dentro dos padrões de uma empresa competitiva. O modelo inclui passar para a Eletrobrás a distribuição de Manaus e de Boa Vista, para que se dê a elas o mesmo tratamento que se está dando às outras empresas de distribuição da Amazônia, e tirando da Eletronorte um papel que não é o dela. Temos de trabalhar alguns empreendimentos que valem pela redução de despesas.

Exemplificando: a energia que vem da Venezuela é muito cara para a Eletronorte, que a vende para a Boa Vista por um valor menor do que gasta para trazer a energia. Mas essa energia é muito mais barata que a produzida antes pela Eletronorte, com máquinas velhas e usando diesel importado. Esses empreendimentos se viabilizam pelo custo evitado. Mas vamos buscar caso a caso a forma de viabilizar os empreendimentos sob todos os aspectos e não só sob a ótica do custo evitado.

O que fica na Eletronorte Geração?

Depois de limparmos as atividades que são contraditórias ao nosso papel, como as distribuidoras, ficaremos com (as usinas de) Tucuruí, Samuel, Balbina e com os parques térmicos remanescentes de Rondônia e Rio Branco. No Amapá ficará o parque térmico e a transmissão. Como o Amapá é um sistema isolado, não tem sentido colocar a transmissão dentro da Eletronorte Transmissão. No futuro, quando se fizer a interligação do Amapá com o Pará, através de Belo Monte, se separará a geração da transmissão.

Quanto tempo o senhor estima que será necessário para sanear esses sistemas?

Espero que em cinco anos tenhamos praticamente aposentado os parques térmicos remanescentes do Acre e de Rondônia e equacionado o contrato Brasil-Venezuela. Em cinco anos a Eletronorte Geração será uma empresa altamente competitiva, com ações tão valorizadas quanto hoje as de Furnas.

Em 2004 terminam os contratos que dão subsídios aos eletrointensivos, o que tornará Tucuruí uma mina de ouro. Somando-se a isso, os sistemas saneados a que o senhor se refere certamente deixarão a Eletronorte Geração em situação privilegiada. Os planos futuros do governo incluem a pulverização das ações da Eletronorte, em um processo semelhante ao de hoje em Furnas?

Não podemos saber qual a linha ideológica do próximo governo. Mantida a ótica atual, é evidente que a Eletronorte Geração estará em uma situação excepcional. Tucuruí estará inteiramente renovada (a parte nova está obrigando a que renovemos a parte velha). Então, daqui a cinco anos a usina terá máquinas novas, problema ambiental equacionado e o sistema de transmissão concluído. Sem falar que acabamos de elevar a cota para 74, a máxima de operação, que resulta no maior volume de água de reservatório do País.

Com um custo de energia que deverá estar em torno de US$ 20/MWh, mesmo incorporando Samuel e Balbina, a empresa terá alta atratividade para qualquer tipo de investidor.

Por que o custo de Belo Monte caiu?

Essa é uma questão secundária. Alguns setores da sociedade continuam mal informados. Em Tucuruí, a Eletronorte foi a empreendedora. Em Belo Monte, ela é apenas a consultora que está concluindo um estudo de viabilidade. Então não adianta ver planilha, cálculo, porque a obra será executada por uma empresa diferente, que vai rever o projeto básico. Não existe obra em Belo Monte. As pessoas confundem e acham que a Eletronorte está executando obras. O papel da Eletronorte se encerra em Belo Monte com a conclusão do EIA-Rima. O nosso pessoal ia sair de lá para Itaituba. Por um clamor da população de Altamira, estamos fazendo o estudo de engenharia de Itaituba com a base em Altamira. Então, se alguém quer saber quanto é o orçamento, aguarde o edital para a licitação da concessão. Quem vai dizer qual o orçamento básico é a Aneel. Nós estamos trabalhando hoje para fazer simulações de comercialização, com um orçamento da usina em R$ 7.2 bilhões, a preço de junho de 2001. Mas esse valor é meramente de referência, porque vamos licitar a concessão. Não interessa quanto custará, pois é um problema do empreendedor. O que nos interessa é quanto ele vai ter de investir no desenvolvimento regional. Esse, como cidadão brasileiro, eu tenho interesse em conhecer.

A Eletronorte tem sido criticada por conta do projeto de uma termelétrica em Belém. Por que uma térmica na capital?

Alguns jornalistas procuram confudir a opinião pública dizendo que a usina de Belo Monte vai produzir pouca energia durante pouco tempo. Hidrelétrica é assim mesmo, não tem número: os rios da Amazônia estão abaixo da média nacional, mas assim mesmo suas usinas são espetaculares. As usinas que ficam no ponto de ligação da Transamazônica com os rios Tocantins, Tapajós e Xingu são belas usinas. Quero mais uma vez dizer que só há perspectiva de utilização das usinas que ficam naquele ponto. Iriri e Krokaimoro não existem e não serão construídas na minha geração.

As únicas usinas boas são Marabá/Tucuruí, Belo Monte/Altamira e São Luís do Tapajós. Sendo que Altamira não é Babaquara, mas uma usina menor, mais bem estudada. E pára aí.

E a térmica em Belém? Quais as vantagens?

A térmica será flexível: só opera quando se precisa dela. Tem dois papéis. O fundamental - e razão por que eu e o governador Almir Gabriel defendemos essa tese - é pôr uma térmica de 1.500 MW para garantir o abastecimento de energia da capital no caso de uma falha do sistema de transmissão. O segundo papel é firmar a energia das usinas amazônicas, quer Tucuruí quer Belo Monte. Nos meses em que elas produzem menos energia, usa-se a térmica. Ou seja, há ganho para a população e para o empreendedor, ao firmar a tal energia que preocupa essa turma. Aliás, é muito interessante a preocupação exagerada com o dinheiro do investidor.

Vamos admitir que a preocupação fosse com o dinheiro da Eletrobrás ou do BNDES no projeto. Ora, esse projeto, dentro do modelo atual, terá na iniciativa privada o acionista majoritário. Se a Eletrobrás ou a Eletronorte participarem, será como acionistas minoritários. Entrarão em um projeto que terá um retorno definido pelo acionista majoritário. E este não vai pôr dinheiro em um projeto que não tenha retorno positivo. Se as empresas estatais de economia mista participarem do projeto serão investidoras e terão retorno como empresas. Não é dinheiro público. Então por que essa preocupação com o retorno ou com quanto a usina vai gerar de energia?

Esse é um problema de quem comprar a concessão. Se vai produzir pouca energia, quem vai pagar pela pouca energia produzida é o investidor.

Outra preocupação é que a termelétrica vai onerar o projeto Belo Monte. A termelétrica está incluída no projeto?

Não. A termelétrica não está. Eu, José Antonio Muniz Lopes, é que estou defendendo uma térmica para o Pará. E uma forma de viabilizar essa térmica é colocar no projeto Belo Monte, mas estou entendendo que não vai dar tempo. E ela não onera o projeto Belo Monte.

Por que não?

Porque ela aumenta a energia firme e a receita da usina é calculada pela energia firme. Então quando se diz que a receita de Belo Monte ao ano seria de R$ 3,2 bilhões, usa-se valor normativo. E usa-se para calcular isso 4.700 MW médios. Se puser a térmica, multiplicará isso para 6 mil MW. A receita aumentará demais pois garante que vai fornecer sempre média de 6 mil MW, já que a térmica completa. Isso não oneraria o projeto, embora fizesse uma revisão do projeto. Quem ganhar a licitação de Belo Monte poderá propor a instalação de uma térmica para firmar a energia.

Vou continuar trabalhando por isso e procurar quem ganhar a licitação para mostrar que é bom para ele e para o Pará.

Qual o investimento?

Deve ser de US$ 750 milhões. Porque, no caso de ser gás, teríamos de colocar um terminal de gaseificação pois o gás poderia ser usado para outros fins. No caso de ser carvão mineral, seria trazido pelos navios que vêm buscar alumínio, configurando um projeto mais integrado.

Na semana passada, o procurador geral da República deu parecer favorável a Belo Monte e há notícias de que o Ministério Público Federal no Pará está tentando ser ouvido pelo ministro Marco Aurélio Mello, do STF, sobre o caso. O senhor considera excessiva a preocupação do MPF do Pará?

Não. Eu tenho um respeito muito grande por duas instituições no Brasil de hoje: a imprensa e o Ministério Público. Então, se o Ministério Público quer esgotar todas as dúvidas, a nossa obrigação é esclarecer essas dúvidas. Hoje somos considerados empresa de categoria internacional e estamos aumentando nossa interação com todos os segmentos, incluindo antigos contendores e atingidos por barragens. Não polemizo posições com Justiça, Ministério Público ou jornalistas. Sempre penso: o jornalista não entendeu, como eu não entendo tantas outras coisas. Mas eu não polemizo. Ao contrário, procuro aprender cada vez mais com eles

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