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Economista propõe "organizar" destruição

FSP, Ciência, p. A16
20 de Dez de 2005

Economista propõe "organizar" destruição
Especialista do Ipea diz que leilão de direitos de propriedade de áreas boas para a agricultura pode frear grilagem

DA REDAÇÃO

O desmatamento na Amazônia poderia ser contido de forma eficiente caso o governo estabelecesse um sistema de concessões das terras com potencial agrícola da região à iniciativa privada. A proposta foi feita em São Paulo pelo economista Ronaldo Serôa da Motta, do Ipea (Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada).
Serôa participou, na última quarta-feira, do debate "Quanto custaria acabar com o desmatamento na Amazônia?", na sede da Folha. O evento marcou o lançamento de dois volumes da revista "Ciência e Ambiente" (www.ufsm.br/cienciaeambiente), editada pela Universidade Federal de Santa Maria, dedicados à questão amazônica. Também participaram do debate o secretário de Biodiversidade e Florestas do Ministério do Meio Ambiente, João Paulo Capobianco, o coordenador da campanha "Y Icatu Xingu do Instituto Socioambiental, Márcio Santilli, e o jornalista Marcelo Leite, colunista da Folha.
Serôa defendeu que o desmatamento seja "organizado", com a regulamentação dos direitos de propriedade. "Regularizar é acabar com a grilagem", afirmou Serôa, apontando na ocupação irregular de terras, principalmente as terras públicas -que, na Amazônia, representam mais de 70% do território-, o vetor primário do desmatamento. Ele afirmou que o governo federal poderia estabelecer um sistema de concessões como o que está sendo proposto para as florestas públicas, também para as áreas públicas da Amazônia com clara aptidão agrícola.
"Se eu puder localizar essas regiões e colocá-las longe de áreas de maior interesse para conservação da biodiversidade, se eu separar 20% da Amazônia para áreas de agropecuária, e através de leilões eu transferir direitos de propriedade, eu não preciso mais ter aquele processo do pequenininho que vai lá financiado pela grilagem, vai lá, pega malária, mata, morre e a fronteira avança."
Transformar as terras agrícolas numa commodity negociável em mercados, raciocina, também evitaria que a taxa de desmatamento -que, no biênio 2004/ 2005, foi de 18,9 mil quilômetros quadrados- fique à mercê dos preços das commodities agrícolas.
"Se o produtor de soja acha que a soja vai explodir em cinco anos ele vai num leilão de terras e compra no mercado futuro."
O próprio Serôa apontou que a proposta traz um problema de eqüidade, porque prejudicaria populações pobres que têm na ocupação de terras um meio de vida. "Mas temos políticas sociais no Brasil. E não devemos fazer do desmatamento um instrumento de política social."
Santilli, do ISA, afirmou que o Brasil está arcando sozinho com o custo da preservação da floresta, e que uma maneira de reduzir esse custo seria que o país pudesse ser compensado, no âmbito da Convenção do Clima da ONU e do Protocolo de Kyoto, pelo carbono que a floresta deixasse de emitir com a redução do desmatamento abaixo de um certo limite. Esse mecanismo daria ao país, calcula, até US$ 500 milhões por ano, quase o dobro da verba aplicada pelo G7 num programa para proteger as florestas tropicais brasileiras com dez anos de duração.

Para Capobianco, preservar 40% da Amazônia em unidades de conservação e terras indígenas tem um custo baixo: R$ 400 milhões por ano. "Mas isso não resolve o problema, porque sobra 60% da região. É um desafio monumental, que não pode ser respondido com cálculos baseados em modelos de captação de recursos para proteger. O grande desafio da Amazônia é torná-la um ativo econômico", disse, apontando como uma das soluções possíveis o projeto de gestão de florestas públicas, em tramitação no Senado -e que técnicos do próprio ministério avaliam que só deve ser votado no ano que vem.

FSP, 20/12/2005, Ciência, p. A16

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