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Desmatamento na Amazônia custa R$ 9,2 bilhões ao País

A Crítica, Cidades, p.C4
18 de Mai de 2004

Desmatamento na Amazônia custa R$ 9,2 bilhões ao País
Estudo realizado pelo Banco Mundial mostra que o custo ambiental do desmatamento na região causa prejuízo de US$ 100 por hectare ao ano. Esse rombo tem que ser coberto pelas políticas públicas

0 desmatamento na Amazônia registrado pelo Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe tem um custo ambiental de R$ 9.: bilhões para o Brasil. A conta feita com base no estudo "Causa do Desmatamento na Amazônia Brasileira", do Banco Mundial, que estimou os gasto necessários para reparar os prejuízos causados à população pelo desflorestamento em US; 100/ha/ano. 0 estudo ainda aponta que médios e grande pecuaristas são responsáveis por 75% do desmatamento da região, hoje em 28,5 milhões de hectare.
0 estudo mostra também que ao contrário do que aconteceu no anos 70 e 80, quando o Governo brasileiro estimulou a migração e a ocupação da Amazônia por meio de incentivos fiscais e subsídios, o desmatamento atua ocorre pelo avanço da pecuária de corte, atividade econômica altamente rentável e com grande taxas de retorno no Sul e Sudeste da região. Essa situação é explicada por causa da disponibilidade de terra barata, geralmente grila da, e condições geoecológicas favoráveis, como alta pluviosidade e a umidade do ar, que garantem a produtividade das pastagens acima da média. Conforme o estudo, a taxa de retorno da, pecuária (sem contar com o lucro madeireiro) é na chamada fronteira consolidada (PA, MT e RO) acima de 10%.
No Amazonas, esse padrão vantajoso, contudo, só é encontrado nas regiões localizadas ao Sul, na fronteira com Rondônia Acre, especialmente nos Municípios de Lábrea, Boca do Acre e Apuí. Tomando por base o estudo do Inpe sobre o desmatamento realizado de agosto de 2002 a agosto de 2003, divulgado no mês passado, o Amazonas teve desmatado 797 hectares, o que dá um custo social direto de quase R$ 300 mil em apenas um ano.
De acordo com o estudo do Banco Mundial, os pequenos proprietários são responsáveis por parcela insignificante do desmatamento, mas exercem a função estratégica de grileiros, "esquentando" a posse da terra para depois revendê-la aos grandes.
Uma prova de que a pecuária profissional e que emprega grandes recursos tecnológicos só traz lucro para os proprietários, deixando um abismo social imenso para ser coberto pelas políticas públicas, está na comparação com a melhoria dos índices socioeconômicos em todos os Estados da região. A renda per capita e a expectativa de vida aumentaram ao passo que o analfabetismo e a mortalidade infantil reduziram-se. Dados oficiais, contudo, mostram que esse quadro originou-se nos setores urbanos e não rural. "Sugerindo que as melhorias nas condições sociais provavelmente tiveram pouco a ver com os desmatamentos", diz o estudo, "é legítimo argumentar que mesmo que os ganhos privados da pecuária de média e grande escalas fossem significativos, eles foram de qualquer modo largamente excludentes, pouco tendo contribuído para aliviar desigualdades sociais e econômicas ao nível local", completa. Neste sentido, os estudiosos do banco estimaram que esse ganho privado com a pecuária é de US$ 75/ha/ano, portanto, menor que o custo ambiental, de US$ 100/ha/ano.
0 custo ambiental foi estimado pelos economistas do Banco Mundial a partir da comparação dos recursos ambientais perdidos na forma de benefícios futuros que poderiam trazer para a população emprego ou renda a partir da exploração madeireira, não madeireira, o ecoturismo, a bioprospecção e a estocagem de carbono.
Esse valor, tirado da população local por quem desmata, aliado ao valor social, acaba tendo de ser coberto por políticas públicas, o que representa uma nova sangria aos recursos do Tesouro nacional.
METODOLOGIA
0 Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe) faz o levantamento estatístico oficial do desmatamento na Amazônia desde 1988. São usadas imagens de satélites e estudos de sensoriamento remoto para estabelecera área desmatada. No último levantamento, o índice alcançou a marca de 23.7 mil km2. Para fins do levantamento oficial do desmatamento na Região Amazônica, os técnicos do Inpe consideram desmatamento "a conversão de áreas de floresta primária por atividades antropogênicas (realizadas pelo homem) para o desenvolvimento de atividades detectadas por plataformas orbitais (satélites)". Assim, diz o estudo feito pelo Banco Mundial, as matas secundárias são excluídas dos desmatamentos totais brutos anuais, pois dessa forma seriam consideradas sempre, mesmo que reflorestadas, consideradas áreas permanentemente desmatadas. Aí entra uma outra esperteza dos pecuaristas, que tentam mascarar o estudo com o uso de vegetação secundária.

Blog
Vinod Thomas
Diretor para o Brasil e vice-presidente do Banco Mundial
"Ao interligar políticas ambientais e sociais, o Brasil poderia proteger uma parte considerável da floresta amazônica remanescente, melhorar as condições de vida e responder aos anseios da população local. De maneira geral, existe o reconhecimento da necessidade de melhores políticas e instituições mais fortes para fazer a gestão dos recursos naturais
Pontos
Números reveladores
O desmatamento na Amazônia já atingiu uma área de 28,5 milhões de hectares.
Os Estados do Pará, Mato Grosso e Rondônia concentram 85% do desmatamento total da região.
O Amazonas é o Estado com o menor índice de devastação, com apenas 3% do território desmatado.
0 Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE) estimou, em 2000, o rebanho de gado brasileiro em 170 milhões.
O Amazonas possui um rebanho de 1 milhão de cabeças, concentrado, principalmente, nos campos naturais do Médio Amazonas.
TRÊS PERGUNTAS PARA
Henrique Pereira Gerente Executivo do Ibama no Amazonas
1 - Como o senhor vê a sugestão do Banco Mundial de trazer os pecuaristas para o debate ambiental?
Acho isso desejável, mas tem componentes complicadores, como o fato de que grande parte do desmatamento é ilegal e feito em áreas públicas. Agora, há espaço para negociação e acredito que a pecuária na Amazônia pode se darem bases mais sustentáveis.
2 - Existe espaço para o desmatamento legal no Sul do Amazonas?
Duas características daquela região dificultam isso. Primeiro é que as terras são públicas e as ocupações não estão consolidadas. Para o lbama autorizar um desmatamento, a pessoa precisa ser a dona da área, mas o que temos lá são grileiros e posseiros, vivendo sob o signo da ilegalidade total.
3 - Existe o risco de o Sul do Amazonas se tornar uma área de conflitos como acontece no Pará?
Olhando o cenário atual, não. Mas não podemos perder de vista que os conflitos no Pará têm a ver com a expansão das estradas e no Sul do Estado já começamos a ver a abertura de ramais por pecuaristas e madeireiros, numa iniciativa bastante perigosa.

Pecuária deve ser levada em conta
0 estudo "Causas do Desmatamento na Amazônia Brasileira", do Banco Mundial, concluiu que no curto prazo não parece existir qualquer tendência de reversão do avanço sobre regiões de floresta nativas, pois a lucratividade é um fator de propulsão.
Neste sentido, o trabalho recomenda aos agentes governamentais e às agências de fomento que busquem trabalhar "com os pecuaristas" e não contra eles", utilizando principalmente os que estão abertos para debater e respeitar a legislação ambientalo. "Isso não quer dizer que não se deva fiscalizar e penalizar e tentar barrar as condições ilegais sob as quais operam os agentes na chamada fronteira avançada". Por fronteira avançada entende-se a região que engloba o Sul do Amazonas.
A perspectiva de diálogo com os responsáveis pelo desmatamento é proposta também em virtude do fato de que o estudo viu na atividade pontos positivos para a região e também para o Brasil, uma vez que o preço da carne tem diminuído e o excedente de produção é exportado, reforçando a balança comercial do País.
No aspecto fiscalizatório, os órgãos de proteção ambiental - recomenda o trabalho - devem reduzir o foco sobre os madeireiros como agentes do desmatamento e voltar a atenção para os médios e grandes pecuaristas. Não deve descuidar, contudo, dos pequenos, que exercem um papel importante no fornecimento da mão-de-obra e na legalização das terras griladas.
No campo das alternativas, o Banco Mundial sugere a realização dos zoneamentos econômico, incluindo na negociação a possibilidade de convivência da pecuária.
Com o zoneamento poderiam ser desenvolvidos o que os técnicos chamam de mecanismos de troca, em que pudessem ser observados ganhos ecológicos e econômicos. "Não há porque não permitir que determinadas áreas - tipicamente as mais férteis e produtivas - se beneficiem de maiores porcentuais de desmatamento, desde que compensem com áreas de reservas legais em áreas ecologicamente mais ricas", afirma o estudo.
Mecanismos de política tributária também são recomendados visando controlar o desmatamento. Dentre esses destaca-se no estudo a sugestão de se criar um Imposto Sobre Circulação de Mercadoria (ICMS) ecológico, bem como a revisão e eliminação de fornecimento de créditos subsidiados ainda existentes para a pecuária tradicional.

A Crítica, 18/05/2004, p. C4

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