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Demarcação de terras indígenas enfrenta reações racistas

Brasil de Fato
11 de Mai de 2008

Parlamentares e representantes do governo do Mato Grosso do Sul já se organizam de forma contrária ao reconhecimento dos direitos Constitucionais dos Povos Indígenas

Depois de uma espera angustiante de mais de cinco anos, o Estado Brasileiro ouviu as lideranças Guarani Kaiowá e firmou um acordo para reiniciar os estudos antropológicos para demarcação física dos seus territórios.

Por meio de um Termo de Ajustamento de Conduta (TAC) assinado em 12 de novembro do ano passado, entre o Ministério da Justiça, Ministério Público Federal e Fundação Nacional do Índio (FUNAI) e 23 lideranças indígenas, ficou acordado para primeira semana de maio, o início dos trabalhos de seis Grupos Técnicos que irão identificar e limitar 36 terras indígenas do povo Guarani Kaiowá, no Mato Grosso do Sul, por meio de estudos antropológicos. O prazo final para entrega dos trabalhos está previsto para abril de 2010.

Este TAC atende parte de uma das maiores demandas indígena por terra no Brasil -- ao todo são mais de 100 terras tradicionais Guarani Kaiowá por demarcar no Mato Grosso do Sul. Devido ao confinamento em que se encontra, em média menos de um hectare por pessoa, a população de 40 mil Guarani Kaiowá vive os dramas dos mais altos índices de assassinatos, suicídios e de fome entre os povos indígenas no Brasil.

No entanto, apesar de toda a urgência em reconhecer as terras Guarani Kaiowá, parlamentares e representantes do governo do Estado do Mato Grosso do Sul já se organizam de forma contrária ao reconhecimento dos direitos Constitucionais dos Povos Indígenas.

Em um manifesto divulgado dia oito de abril, 15 representantes da Assembléia Legislativa do estado ignoraram a Constituição Federal e declararam sua posição contraria ao reconhecimento a terra. No entendimento dos parlamentares os Guarani Kaiowá não têm direito de retornar às terras de onde foram expulsos pelos fazendeiros. "A demarcação de terras particulares em lugar de terras indígenas constitui ofensa ao direito de propriedade, ao devido processo legal ao controle do poder jurisdicional, enfim, ofensa à segurança jurídica e ao Estado democrático de direito", esbravejam os deputados no manifesto.

Em pronunciamento na assembléia legislativa o deputado estadual, Zé Teixeira (DEM), foi além, contestando a identidade do povo Guarani Kaiowá. 'Qual é o hábito e o costume que o índio tem numa propriedade que ele não vive há mais de 40 anos', afirmou o deputado, que complementou, 'como vendeu terra de índio, se (o índio) nunca foi dono de nada?'.

Porém, ao contrário do que argumenta Zé Teixeira, se sabe que as terras têm comprovações históricas recentes e antropológicas incontestáveis. Em algumas destas terras, inclusive, inúmeras famílias permanecem vivendo aldeados à beira das estradas e nos fundos das fazendas em restos de mata.

Em apoio à iniciativa dos parlamentares, na última segunda-feira, o governador em exercício, Jerson Domingos, declarou estar mobilizando os prefeitos dos municípios das regiões de Dourados e Aquidauana (no oeste do estado) para entrarem na justiça com pedidos de liminar com objetivo de inviabilizar o começo dos trabalhos dos Grupos Técnicos. Domingos tem afirmado que o cumprimento do TAC para demarcação das terras Guarani Kaiowá pode acarretar em conflitos entre a polícia, fazendeiro e índios. Seria "uma carnificina", aterroriza o vice-governador.

Manifestações mais explícitas de preconceito

Na região de Dourados as manifestações públicas de preconceito têm endereço político certo: a defesa dos interesses dos latifundiários. Com a iminência da vinda dos Grupos Técnicos para demarcação das terras indígenas, um dos alvos mais mirados pelos antiindígenas atualmente tem sido a administração da FUNAI.

Nas últimas semanas a administradora da FUNAI, Margarida Fátima Nicolleti, tem sido duramente criticada por políticos ligados aos fazendeiros e pelos meios de comunicação.

Margarida impediu novas construções de templos evangélicos em terras indígenas sem o consentimento das comunidades, o arrendamento das terras para produção de soja e as adoções de crianças indígenas sem o devido acompanhamento. Apesar de apenas estar cumprindo com suas funções, as críticas tem sido constante. "Com todas as críticas, sabemos que o alvo da campanha contra a FUNAI não sou eu ou seus funcionários, mas sim os estudos de demarcação que já estão em curso", esclarece Margarida.

No último dia 26 de março, administradora da FUNAI recebeu em seu escritório uma recomendação aprovado em sessão ordinária pela Câmara Municipal de Iguatemi -- Município que tem pelo menos 30 % de sua população indígena - pedindo para que a FUNAI tomasse providências urgentes contra os indígenas que fazem moradias na cidade e perambulam "embriagados se mantendo da coleta e sobra de lixos".

O documento com o pedido de providências da Câmara Municipal de Iguatemi, que foi encaminhado também a senadores, deputados federais e estaduais, baseia-se em preocupações econômicas para pedir as providências urgentes do órgão indigenista. "Atualmente com a reabertura do frigorífico, Iguatemi estará progredindo em todos os sentidos, e, é uma vergonha para nossa cidade deixar tal situação exposta aos olhos de futuros investidores e empresários", afirmam os vereadores.

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