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De arma em punho

CB, Cidades, p.15
15 de Nov de 2004

De arma em punho
Com espingardas e armadilhas, caçadores e pescadores invadem os limites das reservas ambientais e capturam aves, mamíferos e peixes. Nos dez primeiros meses deste ano, 103 pessoas foram presas
Renato Alves
Da equipe do Correio
Caçadores e pescadores não respeitam nem as cercas das reservas ambientais do Distrito Federal. Eles tentam driblar a fiscalização com armadilhas, redes e outros instrumentos para captura de aves, mamíferos e peixes. Alguns fabricam as próprias armas de fogo.
Os integrantes da Companhia de Polícia Ambiental, da Polícia Militar do DF, prenderam 103 pescadores e caçadores nos dez primeiros meses deste ano. Doze a mais do que o mesmo período de 2003. Também aumentou a quantidade de material e armas apreendidos (leia quadro).
0 acréscimo das prisões e apreensões acompanha o aumento nas operações da Polícia Ambiental. Para coibir os crimes contra o meio ambiente, os PMs da unidade especializada intensificaram o policiamento nos parques e unidades de conservação.
A investida se tornou possível graças às verbas do Fundo Nacional de Segurança Pública (Funasp), usadas no reequipamento das polícias de todo o país. No DF, a Polícia Ambiental é -,a primeira unidade a receber dinheiro do Funasp.
A companhia tem R$ 1,8 milhões garantidos para o investimento em armamentos, carros e equipamentos de informática. As armas foram compradas há dois meses. São cinco pistolas calibre 0.40 e cinco carabinas 0.40 com mira a laser e lanterna de alta luminosidade.
São as únicas armas desse tipo em todo o DF. De uso exclusivo das polícias e das Forças Armadas, elas tornam possível o policiamento noturno nas matas. "São armas de alta precisão que nos dão mais segurança para o trabalho nas reservas", ressalta o tenente Leonardo Borges Ferreira.
0 tenente faz parte do Grupamento de Operações do Cerrado, responsável pelo policiamento ostensivo nos parques e unidades de conservação do DE Os policiais só entram nesses lugares com as armas em punho. E uma precaução contra os caçadores e traficantes de animais silvestres.
Zoológico
Além de entrar nas reservas com armas de grosso calibre, os caçadores deixam armadilhas nas matas para capturar principalmente animais de médio e grande porte, como capivaras, antas e cutias. "0 perigo maior está numa arma artesanal que chamamos de canhão. Feita de ferro, ela é deixada carregada e dispara quando o animal ou alguém passa por um arame, que puxa o gatilho", explica o comandante da Polícia Ambiental, major Reinaldo José Siqueira.
Quando não mata na hora, o canhão deixa graves ferimentos que levam à morte ou aleijam o animal ou ser humano que aciona a arma. "Uma capivara ferida pelo tiro de um canhão como esse, veio morrer aqui, na sede do nosso quartel. Foi uma das cenas mais tristes que vi na minha vida", conta o major Reinaldo.
Quartel
A sede da Companhia Ambiental fica ao lado do Santuário da Vida Silvestre, uma Área de Relevante Interesse Ecológico (Arie), que ocupa terreno do tamanho de 480 campos de futebol. Mas nem a proximidade do quartel inibe os caçadores e pescadores. Eles agem com freqüência e rapidamente. "É comum recolhermos armadilhas e redes na Arie", lamenta o comandante.
A reserva abriga fauna e flora nativas do cerrado, nas terras entre a Candangolândia e o Lago Sul. Inúmeras aves fazem seus ninhos no lugar. Nos dois lagos da Arie, vivem as únicas espécies de pira - Brasília, peixe natural da capital do país.
A área também serve para soltura de animais entregues ao Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Hídricos (Ibama). Por lá também circulam os bichos do Zoológico que vivem soltos. "Vez ou outra encontramos um bicho da Arie ferido por caçadores. As capivaras são as maiores vítimas", diz o diretor do zôo, Raul Gonzales.
A Arie não é toda cercada. E além de estar em meio a área urbana, tem parte do terreno invadido por famílias de catadores de papel e carroceiros. São pelo menos 20 chácaras. As famílias jogam lixo e esgoto na mata, além de tomar banho e lavar roupas nas lagoas.

Barreiras
0 secretário de Administração de Parques e de Unidades de Conservação do DF, Ênio Dutra, conta que apenas outros três parques - Paranoá, Saburo Onoyama e Sarah Kubitschek (Parque da Cidade) - são protegidos por homens de empresas privadas; contratadas pelo Governo do DF.
Além de fiscais, faltam barreiras para proteger as reservas ambientais. Apenas duas unidades de conservação e sete parques estão totalmente cercados. Outros 19 parques estarão cercados até o fim do ano, garante Dutra. "Mas de nada adianta o cercamento se não houver fiscalização permanente", ressalta o secretário.
Ênio Dutra adianta que o GDF disponibilizou R$ 12 milhões para o cercamento dos 19 parques. "E vamos fazer um termo aditivo no contrato entre as empresas de segurança e a Secretaria de Gestão Administrativa para colocarmos vigilantes em outras reservas", explica o secretário. No entanto, ele não falou quantos parques e unidades de conservação terão vigilância permanente por meio do contrato, nem em que período.

Fiscalização é fundamental
Para justificar as verbas do Funasp, a Companhia de Polícia Ambiental tem que cumprir metas. Além de diminuir o número de crimes ambientais, precisa diminuir para meia hora o temp ode atendimento de uma chamada. Para isso, a unidade espera a chegada de novos carros, ainda esta semana.
Atualmente, a Polícia Ambiental 'tem apenas uma caminhonete Toyota e um Corsa para cobrir todo o DE Com o dinheiro do Funasp, a companhia comprou oito S-10, três vans, quatro carros e 10 motos. "Eles só não chegaram ao quartel porque dependem de emplacamento e seguro contra acidentes", explica o comandante da companhia, major Reinaldo José Siqueira.
Os 250 homens e mulheres da Polícia Florestal também não são suficientes para o policiamento ostensivo permanente nas 16 unidades de conservação e 64 parques públicos do DF. Apenas os parques de Águas Claras e Olhos D'Água (Asa Norte) têm destacamentos exclusivos da PM. A Arie da Candangolândia é uma das mais protegidas justamente por causa da vizinhança do quartel.

CB, 15/11/2004, p. 15

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