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As crianças do Pantanal precisam reaprender a plantar

Época - http://epoca.globo.com
Autor: Jussara Utsch
21 de Out de 2014

Plantar o próprio alimento é uma tarefa já esquecida pelos moradores das grandes cidades. Desde a década de 1940, quando a comida industrializada tronou-se uma realidade e as grandes redes de supermercado passaram a ditar a nossa dieta, ganhamos agilidade em nossa rotina, mas perdemos uma importante conexão com a natureza. Deixamos de compreender os ciclos do semear, cultivar e colher.

Hoje, mesmo em regiões distantes e isoladas, como o Pantanal, muitas crianças nunca viram uma horta. A facilidade para comprar alimentos nos supermercados reduziu o antigo hábito de se cultivar ao menos alguns legumes e frutas nos quintais. Os espaços das moradias também são cada vez menores e falta área nos quintais, muitas vezes completamente cimentados. É claro que ainda existem muitas frutas nativas ou super adaptadas, como o caju, a goiaba e a manga, porém no coração do Pantanal o hábito de plantar vai aos poucos se perdendo.

Essa desconexão com o ambiente já pode ser notada nas novas gerações. Um dos alertas sobre os riscos desse processo vem do premiado escritor americano Michael Pollan. Em seu livro "O dilema do Ornívoro", Polan nos relembra dos danos que essa nova forma de alimentação pode gerar tanto para nós, quanto para o planeta, como o aumento das emissões de gases que causam o aquecimento global, por exemplo. Outro alerta do autor é que as pessoas pararam de perceber que o seu alimento está dentro da cadeia natural e que começa na natureza, com as plantas e os animais. A perda desse importante elo faz parecer que nossos alimentos vêm magicamente do supermercado e não há ligação alguma com a qualidade do solo, as chuvas e a biodiversidade para a garantia da nossa nutrição.

Uma das ações do Projeto Bichos do Pantanal, realizado pelo Instituto Sustentar, é ajudar a mudar essa realidade através de uma iniciativa simples: a construção de hortas nas escolas do Pantanal. A ideia é incentivar as crianças e os jovens da região a literalmente colocarem a mão na terra e se sentirem novamente partes integrantes do meio ambiente.

Desde setembro, o grupo de instrutores do Projeto dedica-se a criar um piloto para essas hortas na escola Duque de Caxias, em Cáceres, no Mato Grosso. A cidade está localizada às margens do rio Paraguai, o principal formador desse ecossistema. Mas, mesmo vivendo em uma das regiões de maior diversidade do país, a desconexão entre as crianças de Cáceres e o meio ambiente pode ser notada desde os primeiros dias de atividades na horta.

"Quando elas saem da sala e percebem que a atividade é trabalhar na horta a alegria toma conta. Muitas nunca colocaram a mão na terra para plantar nada", afirma Orilzo de Campos Silva, instrutor de educação ambiental do Projeto Bichos do Pantanal. "A maior alegria delas é tocar a terra e ver as sementes crescerem". As crianças também participaram da escolha das verduras que seriam plantadas. Para reduzir a necessidade de espaço, elas optaram apenas por folhas, que se integram melhor a dieta das escolas da região, como alface, rúcula e o agrião. A ideia é criar um sistema de hortas suspensas, compatível com os alagamentos da região, que possa ser reproduzido com facilidade em outras escolas do Alto Pantanal, onde o projeto atua.

O interesse das famílias foi outra surpresa que surgiu com as primeiras sementes dessa horta-laboratório. "Pedimos doação de alguns materiais reciclados para criarmos a parte suspensa da sementeira. E, todas as crianças trouxeram importantes colaborações de casas. Tem pai que veio até fotografar as mudinhas plantadas pelo filho", diz Campos.

Além de estimular o plantio de alimento, a segunda etapa deste trabalho é criar pequenos jardins botânicos nas escolas. Vamos estimular que as crianças busquem as sementes nativas do Pantanal pela cidade, em suas casas, jardins e praças. Depois elas plantarão essas espécies nativas da região em sementeiras. Parceiros locais, como o Instituto Federal do Mato Grosso já nos apoiam também com a doação de mudas. Uma das propostas é tentar usar futuramente essas mudas para reflorestamento das áreas degradadas nas margens do rio Paraguai.

Uma parceria entre o Projeto Bichos do Pantanal e o Instituto-E está concluindo um dos primeiros Inventários de emissões de gases do efeito estufa do Mato Grosso. O estudo consiste em um amplo levantamento das principais fontes emissoras de gases-estufa, que causam o aquecimento do planeta e são responsáveis pelas mudanças climáticas, no município de Cáceres.

A iniciativa vai nortear as ações futuras do Projeto, que também implantará ações de neutralização de carbono em Cáceres, através do reflorestamento de áreas degradadas, principalmente nas regiões de mata ciliar às margens do rio Paraguai. Além da neutralização das emissões de gases estufa (a partir do crescimento das plantas que capturam os gases nocivos e os convertem em oxigênio), o plantio das mudas nativas também auxilia no combate ao assoreamento do rio Paraguai, um dos principais problemas ambientais do Pantanal.

Outro importante passo serão as aulas na natureza para as crianças compreenderem a importância das espécies de flora para a manutenção da biodiversidade do Pantanal. A reconexão entre as crianças e o jovens ao meio ambiente, através do plantio de hortaliças, é apenas parte do caminho de uma proposta muito maior.

http://epoca.globo.com/colunas-e-blogs/blog-do-planeta/noticia/2014/10/…

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