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Criação do primeiro município indígena do Brasil

O Progresso - http://www.progresso.com.br/
Autor: Wilson Matos da Silva
23 de Jan de 2012

Cogita-se a idéia proposta pela atual administração municipal de Dourados de transformação da Terra Indígena Dourados, onde estão localizadas as aldeias Jaguapirú e Bororó e vivem centenas de famílias Terena, Guarani e Kaiowá, em um novo município autônomo. Para tanto argumentam-se: o número da população existente que é superior a 14.000 habitantes e o quantitativo de recursos públicos para lá "destinados/investidos" nas áreas de educação e saúde. Inicialmente é bom lembrar que a proposta do então candidato Murilo à época - cuja proposta ajudei elaborar - era de instalar uma subprefeitura na Reserva indígena de Dourados a fim de criar condições estruturantes às nossas comunidade radicadas naquelas Aldeias.

Historicamente falamos de um povo massacrado e subjugado pelos interesses mercantilistas de acúmulo de capital ao longo dos anos; que no caso das Aldeias de Dourados com o maior contato dos índios com a cultura trazida pelo colonizador europeu, maiores os desastres, os genocídios e a destruição dos território objetivo presente em todas as épocas foi o de expandir ou consolidar as fronteiras e fixar os índios em núcleos de colonização, utilizando como recurso econômico a nossa mão-de-obra.

Durante séculos, a nós os índios foi negado o reconhecimento como povo diferenciado, principalmente no que diz respeito à vida civil brasileira, pois as leis civilistas não continham nenhum instituto que pudesse comungar com as necessidades indígenas. A urbanização atinge-nos com grandes e graves problemas estruturais, e, apesar disto, ainda vivemos - às duras penas - de forma tradicional, em coletividade e com poucos bens de consumo. Sem perspectivas imediatas de que a legislação brasileira traga soluções como forma de administração e organização destas verdadeiras cidades que são nossas aldeias à margem da sociedade Estatal.

Temos exemplo na América Latina de reconhecimento dos direitos indígenas mais como direito de povos, como a Bolívia, que trouxe em sua Constituição de 1995, a garantia de que as autoridades étnicas de suas comunidades possam gerir e aplicar suas próprias normas junto ao seu povo. No Brasil, falta uma legislação que possa suprir estas lacunas do Estado perante os nossos povos, daí a necessidade de iniciar uma ampla discussão a respeito do assunto, e assim trabalharmos analiticamente as propostas de criação de Município, ou ente político diferenciado, ou políticas públicas diferenciadas, que possam respeitar os valores étnicos das nossas comunidades.

A criação de Municípios temos, portanto, no art. 18, § 4o, os requisitos para a criação de deste ente federativo. Porém, neste ponto há mais uma questão em debate, a lacuna perante a regulamentação legal para o dispositivo previsto no parágrafo 4o do referido artigo, visto que, após 20 anos da promulgação da Carta Magna, não há ainda a Lei Complementar Federal estipulando o período para elaboração de Lei Estadual que traga em seu escopo a criação de um novo município e ainda os Estudos de Viabilidade Municipal não possuem os parâmetros definidos.

Quanto à entes políticos diferenciados, temos uma barreira maior que se trata do Princípio Federativo previsto no artigo 1o da Carta Magna, e portanto devendo ter maiores estudos acerda deste ente a fim de não ferir tal princípio tido como Cláusula Pétrea do Estado Brasileiro. É bom o município se preocupar em instalar a Subprefeitura (promessa de campanha) e ou uma Secretária Municipal para englobar os recursos destinados às nossas comunidades, precisamos de creches, habitação, coleta de lixo dentre outros serviços

É Índio Residente na Aldeia Jaguapirú, Advogado, Presidente da CEDI/OAB-Dourados, Coordenador Regional do ODIN - Centro Oeste; E-mail wilsonmatosdasilva@hotmail.com

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