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CPI para apurar doações

CB, Cidades, p. 26
15 de Abr de 2005

CPI para apurar doações
Presidente em exercício da Câmara Legislativa quer investigar a cessão de animais para criadouro em Quirinópolis (GO). Delegado da Polícia Federal pediu ontem ao Ibama toda a documentação do caso

Da Redação

O presidente em exercício da Câmara Legislativa, deputado Chico Floresta (PT), pediu ontem a instalação de uma Comissão Parlamentar de Inquérito para apurar as doações de animais do Jardim Zoológico de Brasília para o empresário Noel Gonçalves Lemes, um dos maiores comerciantes brasileiros de espécies da fauna silvestre e exótica. Floresta já elaborou as 12 páginas do requerimento e agora busca a assinatura de seus colegas.
A empresa de Noel tem registro no Ibama para comercializar animais silvestres e exóticos. A sede fica na cidade de Quirinópolis, no quilômetro 28 da BR-160, em uma fazenda de nome Serra Azul. Boa parte do negócio é acertada pela internet. O site www.fazendaserraazulnet.com oferece 82 tipos diferentes de bichos, alguns deles raríssimos e sob forte ameaça de extinção, como o tigre siberiano.
A Polícia Federal e o Ministério Público investigam o caso desde o ano passado e suspeitam de tráfico internacional de animais. Policiais e promotores se desdobram para listar todos os fornecedores de Noel e já descobriram que o empresário recebeu 153 animais dos acervos dos zôos de Brasília e de Goiânia nos últimos 26 meses, conforme revelou reportagem publicada ontem pelo Correio.
O Zôo de Brasília doou sete mamíferos em 26 de setembro de 2002. Todos foram doados vivos. No entanto, o Ministério Público descobriu três certidões de óbito desses animais com data posterior à doação e assinadas pela responsável técnica do zoológico. O Correio mostrou ontem a cópia dos atestados. "Isso é gravíssimo. Se a suspeita de tráfico de animais for confirmada deve implicar na responsabilização civil, administrativa e penal dos envolvidos", diz Chico Floresta.
Procurado pelo Correio, o diretor do Jardim Zoológico, Raul Gonzalez, disse que desconhece o pedido de abertura de CPI. Mas, defendeu a investigação. "Quero que se esclareça toda a situação, que a verdade venha à tona e se faça Justiça", disse ontem à noite.
O delegado federal Francisco Serra Azul pediu ainda ontem ao Ibama toda a documentação do caso. Serra Azul abriu inquérito no final de março a pedido do Promotoria do Meio Ambiente. Em Goiânia, o inquérito tem mais tempo. Foi instaurado no começo de fevereiro e o delegado responsável, Roberto Alves já coleciona preciosidades, como 146 documentos de permuta entre o zôo goiano e criadouro de Noel. Só em abril de 2004, Noel recebeu 50 animais de 15 espécies diferentes. Em troca, deu ao Zoológico material de construção. "Acho que o esquema é pesado. Suspeitamos de que esse negócio é uma mina de dinheiro", resume o delegado Roberto Alves.
O tráfico internacional de animais e plantas movimenta anualmente cerca de US$ 1 bilhão no país, só ficando atrás do tráfico de armas e de drogas, segundo o relatório final da CPI da Câmara Federal que, investigou em 2003 o comércio ilegal da biodiversidade brasileira. Os parlamentares ouviram 122 pessoas e concluíram que a legislação brasileira estimula o crime. A punição é de seis meses a um ano.

As contradições de Palhares

Cecília Brandim
Da equipe do Correio

Em depoimento prestado na segunda-feira ao Ministério Público do DF (MPDF), o gerente-executivo do Instituto do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) no DF, Francisco Palhares, declarou que "não teve a intenção de afirmar" que o relatório técnico que apontava irregularidades no Jardim Zoológico de Brasília foi elaborado "de forma equivocada". Em duas entrevistas concedidas ao Correio, gravadas nos dias 5 e 6 de abril, Palhares disse, entretanto, que o documento assinado pela comissão multidisciplinar, que esteve no Zôo em julho de 2004, continha falhas. "Existem conclusões, manifestações, absolutamente equivocadas, desprovidas de qualquer sustentação legal", disse no último dia 5, ao ser questionado se o relatório teria sido manipulado (leia ao lado).
As explicações foram prestadas à promotora Kátia Christina Lemos, da Promotoria de Defesa do Meio Ambiente, e à procuradora da República Ana Paula Mantovani, pedidas após a publicação de reportagem sobre o Zoológico no dia 7 de abril. Na matéria, que motivou o depoimento no Ministério Público, Palhares voltou a fazer críticas ao documento. "O relatório técnico foi elaborado de forma equivocada, isso é assumido por nós. Mas era um relatório interno, faz parte de um instrumento de monitoramento e correção. O que causou problema é que alguém apresentou denúncia ao Ministério Público, e o Ministério Público na verdade interveio no meio do processo". Segundo ele, o documento foi remetido ao MP em atenção a uma exigência. "O MP exigiu que o relatório da vistoria do Ibama fosse imediatamente apresentado. E não nos permitiu fazer uma avaliação do relatório e nem suas condicionantes", acrescentou.
Com base nas conclusões dos técnicos, o MPDF moveu ação civil pública pedindo a interdição da instituição. O Zôo ficou fechado por três dias. As declarações do gerente-executivo do Ibama sobre os equívocos do primeiro relatório foram, inclusive, utilizadas pela Procuradoria Geral do DF no recurso que permitiu a reabertura do Zoológico. Ao Ministério Público, ele disse que não leu o relatório da visita realizada em julho de 2004, avaliado pelo setor de Fauna do Ibama/DF e encaminhado ao MPDF. Palhores entregou à promotora Kátia Lemos, o laudo da vistoria feita no Zoológico durante os dias em que esteve fechado. As conclusões, conforme disse na segunda entrevista, apontavam que o Zôo é um local seguro, ao contrário do que dizia o documento anterior.
Questionado pelo Ministério Público sobre a doação indevida de animais, Palhares afirmou que esse procedimento não existe. O que há, afirmou, é a autorização para transferência de animais, embora não soubesse informar se antes da liberação dos bichos, a procedência seria verificada. Palhares declarou, na entrevista do dia 5, que o método adotado pelo Zoológico de Brasília é tido como legal. Após o depoimento de Palhares no MP, a assessoria dele disse que ele não iria falar mais sobre o assunto.

Entrevistas
Concedida em 5 de abril

Correio Braziliense- O senhor acha que as conclusões do relatório foram manipuladas?

Francisco Palhares - Eu não posso dizer que foram manipuladas. Mas existem conclusões, manifestações, absolutamente equivocadas, desprovidas de qualquer sustentação legal.

Concedida em 6 de abril

Correio - O Ibama errou?

Palhares - O Ibama não errou porque, na verdade, não tomou nenhuma medida contra o Zoológico. O relatório técnico foi elaborado de forma equivocada, isso é assumido por nós. Mas era um relatório interno, faz parte de um instrumento de monitoramento e correção. O que causou problema é que alguém apresentou denúncia ao Ministério Público, que interveio no meio do processo, com base no que foi obtido no primeiro relatório de vistoria o Ministério Público tomou algumas atitudes.

CB, 15/04/2005, Cidades, p. 26

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