VOLTAR

Congresso peruano suspende lei florestal

FSP, Mundo, p. A12
11 de Jun de 2009

Congresso peruano suspende lei florestal
Decreto sobre exploração de recursos amazônicos levara a conflito entre indígenas e policiais que deixou cifra oficial de 34 mortos
Mesmo com recuo de Lima, manifestantes mantêm intenção de realizar hoje jornada de protestos contra o governo de Alan García

Da Redação

O Congresso peruano suspendeu ontem a vigência de um decreto sobre uso do solo na floresta amazônica, o estopim dos confrontos entre a polícia e manifestantes indígenas que deixaram ao menos 34 mortos na semana passada.
A suspensão, porém, não deve impedir a realização de uma jornada de protestos contra o governo do conservador Alan García, organizada pelos indígenas e pela Central Geral de Trabalhadores do Peru.
A Aidesep (Associação Indígena de Desenvolvimento da Selva Peruana) exige a revogação definitiva do decreto, parte de um pacote legal baixado pelo governo em 2008, que facilita a exploração de 60% da Amazônia peruana que também quer ver anulado. Só então aceita retomar o diálogo com o governo.
A proposta inicial do Executivo previa suspender a lei por 90 dias. O texto aprovado pelo Congresso não impõe prazo "para podermos negociar sem pressões", segundo o parlamentar do bloco governista Aurelio Pastor.
O governo diz que a demonstração de boa vontade com a suspensão deveria abortar os protestos convocados para hoje, mas García mantinha também discurso duro ontem.

Limites
"Se se diz "me dê o que eu quero, porque senão bloqueio as estradas, mato pessoas", e o governo se põe a negociar, ele está transigindo nos princípios básicos de desenvolvimento civilizado", disse o presidente.
Para analistas e ativistas indígenas, o governo errou ao baixar o conjunto de decretos pró-investimento na Amazônia peruana sem consultar os indígenas, em cumprimento a convênios internacionais adotados pelo Peru. Para eles, com a suspensão, o governo envia um sinal de que não está disposto, ainda, a ceder.
García assinou as normas no ano passado quando detinha poderes especiais dados pelo Congresso para ajustar leis do país ao TLC (Tratado de Livre Comércio) com os EUA.
O decreto 1.090, chamado de lei florestal e da fauna, permitia ao governo mudar o zoneamento de áreas da floresta quando isso for considerado de "interesse nacional".
O Executivo diz que respeitará as terras indígenas e áreas protegidas, mas as comunidades dizem que não confiam na promessa.
Com agências internacionais

Crise afeta atividades de Petrobras e Odebrecht

Flávia Marreiro
Da reportagem local

O conflito entre indígenas e governo no Peru afeta atividades da Petrobras e da Odebrecht, as maiores empresas brasileiras que atuam no país, inclusive na região de selva. Prestes a iniciar a perfuração de um poço no lote 58 -na área rica em gás de Camisea, um dos seis lotes nos quais detém direitos de exploração no país-, a Petrobras no Peru ficou ao menos 18 dias sem poder transportar provisões, incluindo diesel e gasolina para a aviação, pelo rio Urubamba, bloqueado pelos manifestantes.
A empresa diz ter negociado com os indígenas para liberar a passagem, em 1o de maio, e informou à Folha que "continua negociando com as comunidades locais a movimentação de suas provisões". Já a construtora Odebrecht, que participa da construção de ao menos duas megarrodovias no país, informou que suas obras na rodovia norte só estão paradas entre Bagua -justamente onde houve o confronto entre indígenas e polícia que deixou dezenas de mortos- e a cidade peruana de Buenos Aires. A região está sob toque de recolher desde sexta.

Atuação controversa
A presença de petrolíferas na Amazônia é parte do conflito no Peru. A Petrobras diz que age sempre de acordo com altos padrões ambientais e com as normas peruanas, mas para analistas e indígenas o problema é exatamente que as regras do país já eram frouxas e foram ainda mais flexibilizadas pelo governo Alan García.
Segundo estudo da Universidade Duke (EUA), a Amazônia peruana tem a maior porcentagem -72%- destinada à exploração de gás e petróleo, quer em áreas concedidas ou em negociação (veja quadro). Segundo a lei peruana, o Estado é dono do subsolo, o que na interpretação do governo abre caminho às licitações. Mas analistas e lideranças indígenas apontam que a regulamentação ocorreu à revelia do convênio 169 da OIT (Organização Internacional do Trabalho), adotado pelo Peru, que prevê a consulta prévia aos indígenas.
Segundo a antropóloga Margarita Benavides, da ONG peruana Instituto Bem Comum, grande parte dos blocos de exploração se sobrepôs a terras reivindicadas por indígenas e de preservação. "Fazer as concessões sem titular as terras indígenas primeiro é receita para um conflito permanente." O Brasil não deve por enquanto pronunciar-se sobre a crise no Peru, mas a situação está sendo acompanhada pela assessoria internacional do Planalto. Uma das preocupações é que seja afetado o diálogo entre Bolívia e Chile sobre a antiga reivindicação de La Paz de uma saída para o mar -Lima tem poder de veto no tema.
Sobre empresas brasileiras na Amazônia peruana, fonte do Planalto disse esperar que elas, beneficiárias da política de integração regional, contribuam para diminuir as tensões.
Colaborou Agnaldo Brito, da Reportagem Local

FSP, 11/06/2009, Mundo, p. A12

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.