OESP, Nacional, p. A12
25 de Mai de 2007
Cercados, invasores decidem sair de Tucuruí
Governo prometeu fazer reunião hoje, após desocupação da usina
Carlos Mendes
Pressionados pelo Exército e após uma tensa negociação, de mais de duas horas, os invasores da Usina Hidrelétrica de Tucuruí, no sudeste do Pará, anunciaram ontem à noite a desocupação das instalações. Em troca, receberam o compromisso de uma reunião hoje, na própria cidade, com representantes do Ministério de Minas e Energia, da Secretaria-Geral da Presidência e das Centrais Elétricas do Norte (Eletronorte).
A ocupação da usina por cerca de 600 manifestantes do Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB), com apoio da Via Campesina e do Movimento dos Sem-Terra (MST), deixou o governo em alerta total - chegou a abandonar as negociações, deixando o Exército à frente do caso. O protesto durou cerca de 40 horas. Sem água nem comida, cercado pelos militares, o grupo saiu pacificamente, às 19h30, segundo o MAB.
O objetivo da invasão era denunciar as condições em que viviam as famílias desalojadas para a formação do lago da usina. "O acordo não foi bom, mas pode ser melhor na reunião com os representantes do governo", comentou o líder nacional do MAB Roquevan Alves Silva.
"Precisamos saber o que motivou a ocupação, entender as razões para isso ter acontecido, uma vez que havia um processo de discussão e solução de problemas em andamento, ainda que pudesse existir algum atraso", reagiu o secretário de Articulação Social da Secretaria-Geral da Presidência, Wagner Caetano. "Não há compromisso que não estivesse em execução."
AMEAÇA
No momento mais tenso, ao saber que o Exército cercara a usina, o grupo advertiu que poderia "radicalizar". No final da tarde, alguns carros da Eletronorte com o tanque cheio de gasolina foram posicionados na entrada do prédio. Os invasores ameaçaram provocar uma explosão e formaram uma barreira humana - alguns exibiam bombas de fabricação caseira.
Alarmado, o governo advertiu que a situação não poderia se estender por muito tempo, sob pena de prejudicar o sistema e a população. Como a usina é considerada uma instalação de importância estratégica para o País, o governo não queria os invasores no local por mais tempo. Ao mesmo tempo, tentava agir com cautela.
Temendo um conflito, o Conselho Tutelar de Tucuruí enviou assistentes sociais para retirar crianças e adolescentes de dentro da usina. Na hora da negociação final, havia apenas os adultos. Dois batalhões do Exército e um esquadrão, com um total de 400 homens, haviam sido mobilizados pelo governo federal. Outros dois batalhões vieram de Marabá.
Ao longo do dia, a direção da Eletronorte evitou manifestações sobre a ação dos movimentos sociais. Informou, apenas, que a invasão não impediu o funcionamento das máquinas. Ontem, segundo a sua assessoria, as turbinas estavam gerando 5.679 megawatts de energia para as regiões Norte, Nordeste e Centro-Sul do País.
Movimento foi criado nos anos 80
Clarissa Oliveira
Presente em 14 Estados, o Movimento dos Atingidos por Barragens (MAB) chamou a atenção pela invasão da Usina de Tucuruí, mas sua atuação remonta ao fim dos anos 80. Nascido da ação da Igreja e próximo ao MST, o grupo age em defesa de famílias afetadas pela construção de hidrelétricas e prega a conservação ambiental. Mas a meta central é pressionar o governo a rever o modelo energético do País.
"O problema não está nas barragens em si, mas no modelo energético", diz André Sartori, um dos coordenadores do MAB.
Ele reconhece que a energia hidrelétrica é adequada ao País, mas insiste em que as prioridades do governo não condizem com interesses da população. "Somos contra a venda de energia subsidiada para grandes empresas, enquanto a população paga a quinta maior tarifa do planeta", diz. "Nesse modelo, podem construir quantas usinas quiserem que, em algum momento, vai faltar energia."
OESP, 25/05/2007, Nacional, p. A12
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