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A causa dos índios nos afeta muito mais do que você imagina, cara pálida

Projeto Colabora - http://projetocolabora.com.br
Autor: MELO, Liana
16 de Ago de 2017

A causa dos índios nos afeta muito mais do que você imagina, cara pálida
STF vota nesta quarta-feira ações que podem comprometer não só as demarcações de terras indígenas em todo o Brasil como o futuro do país

Liana Melo Atualizada em 16 de agosto de 2017, 08:24

Os índios vão ocupar Brasília. Eles começaram a sair de suas aldeias no começo da semana. São mais de 150 lideranças indígenas que chegam, nesta quarta-feira (16 de agosto), para protestar dentro e fora do Supremo Tribunal Federal (STF) - alguns líderes já têm assento marcado no plenário da casa. Se a palavra índio nem sempre atrai empatia, imagine somar a ela o complemento protesto. Para muitos, índio é um assunto chato. E é com esse desinteresse e indiferença que contam os ruralistas, bancada que ajudou o presidente Temer chegar ao poder e, posteriormente, ajudou a arquivar a denúncia de corrupção passiva contra o presidente. As decisões que vierem a ser tomadas pelos ministros em relação ao Parque Indígena do Xingu (MT), a Terra Indígena Ventarra (RS) e terras indígenas dos povos Nambikwara e Pareci poderão gerar consequências para as demarcações de terras indígenas em todo o país. E daí?, deve estar se perguntando quem chegou até aqui. Afinal, o que a vida deles tem a ver com a nossa, moradores dos grandes centros urbanos? A resposta é curta e grossa: tudo.
Imagine o Brasil sem índios. São eles os principais guardiões da floresta, ou da biodiversidade. As terras indígenas evitam o desmatamento e, consequentemente, ajudam a conter as emissões de Gases de Efeito Estufa (GEE), responsáveis pelo aquecimento global. Dados da Coalizão do Clima, Florestas e Agricultura apontam que, em todo o mundo, 24% do carbono estocado no solo estão em terras sob gestão de comunidades tradicionais. No Brasil, as terras indígenas têm o potencial de evitar a emissão de 31,8 milhões de toneladas anuais de CO2, o equivalente a retirar de circulação cerca de 6,7 milhões de carros pelo período de um ano, segundo estudos do World Resources Institute (WRI).
Esperamos que aqueles onze ministros pensem para assinar esse papel contra a raiz deles. Se precisasse, eu me ajoelharia na frente da ministra Cármen Lúcia, pedindo, por favor, para não aprovar esse marco temporal
Ainda segundo diagnóstico da Coalizão, é cada vez mais claro que, sem as terras indígenas, haverá um risco grande de secas prolongadas e altas temperaturas, em especial, na região Amazônica. O setor mais afetado, neste caso, seria o próprio agronegócio - segmento econômico especialmente interessado na aprovação das ações no STF. E essa mudança no clima em função de perda de massa florestal preservada já é uma realidade. Segundo estudos científicos do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia (IPAM), o desmatamento acumulado em uma das três regiões afetadas pela decisão do STF, o Parque Indígena do Xingu, nos últimos anos, fez com que a temperatura na região subisse assustadoramente. Nas áreas abertas ao redor do Parque a temperatura é, em média, 4oC a 6oC maior do que no interior do território indígena. A situação não é pior devido à existência do parque. Temperaturas elevadas afetam o regime de chuvas, trazendo potenciais danos à produção agrícola da região.
Enquanto os povos indígenas estão preocupados com o risco de o STF adotar a tese do marco temporal no julgamento de hoje, segundo a qual os indígenas só teriam direito às terras que estavam sob sua posse em 1988, na data da promulgação da Constituição Federal, os ruralistas - eufemismo para o agronegócio - contam com essa vitória. "Esperamos que aqueles onze ministros pensem para assinar esse papel contra a raiz deles. Se precisasse, eu me ajoelharia na frente da ministra Cármen Lúcia, pedindo, por favor, para não aprovar esse marco temporal", afirma Leila Rocha Guarani Nhandeva, liderança do tekoha Yvy Katu/Porto Lindo. Os Guarani e Kaiowá estão entre os povos especialmente atingidos pela decisão da Corte.
O marco temporal e a PEC 215 são as principais armas nessa guerra em curso. Uma complementa a outra. Enquanto a primeira fala em definir uma data; a outra prega transferir do Executivo para o Legislativo, ou seja, para o Congresso Nacional, a palavra final sobre a demarcação das terras indígenas, territórios quilombolas e unidades de conversação. "O argumento (do marco temporal) é absolutamente insustentável e falho em sua própria base. É inconstitucional", defende Luiz Henrique Eloy, advogado da Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (Apib). A indiferença generalizada em relação à luta dos povos indígenas associada à desinformação são aliadas fundamentais para enfraquecer o movimento e jogá-los na invisibilidade.
Estudo do Instituto Socioambiental (ISA) - que lançou uma campanha alertando sobre o racismo contra os povos indígenas - calcula que essas medidas podem impactar diretamente os processos de demarcação de 228 Terras Indígenas (TIs) que ainda não foram homologados, os quais devem ser paralisados. Essas terras representam uma área de 7.807.539 hectares, com uma população de 107.203 indígenas.
O assunto já foi denunciado à ONU e à Comissão Interamericana de Direitos Humanos (CIDH). Em abaixo assinado, entidades encaminharem à Relatora Especial das Nações Unidas sobre os Direitos dos Povos Indígenas, Victoria Tauli-Corpuz, e ao Embaixador Presidente do Conselho de Direitos Humanos da ONU, Joaquín Alexander Maza Martelli, denúncia contra o governo brasileiro, acusando-o de violar direitos dos povos indígenas. Lutar contra a PEC 215 e o marco temporal não é só defender a causa dos índios e, muito menos, ser altruísta. É defender nossa própria sobrevivência, evitando assim crises hídricas, secas prolongadas e epidemias provocadas por desequilíbrio ambiental.

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