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Carta do Conselho Indígena de Roraima ao presidente

Cimi
12 de Mar de 2008

Excelentíssimo Sr. LUIS INACIO LULA DA SILVA

Presidente da República

Excelentíssimo Sr. MANGABEIRA UNGER

Ministro Extraordinário de Assuntos Estratégicos

Excelentíssimos Senhores,

A 37ª Assembléia dos Povos Indígenas de Roraima, reunida nos dias 06 a 10 março de 2008, na comunidade indígena Barro, região Surumu, Terra Indígena Raposa Serra do Sol-RR, amparados pelos dispositivos constitucionais do artigo 176, 231 e 232 da Constituição Federal, na Convenção 169 da OIT e na Declaração da ONU sobre Direitos dos Povos Indígenas, vimos expor e requerer:

1. Nossa assembléia é um momento muito importante, realizada anualmente para discutir temas relevantes para o Movimento Indígena e para a consolidação dos direitos humanos aos povos indígenas, como foco o fortalecimento dos povos indígenas quanto os direitos territoriais, sustentabilidade, meio ambiente, educação e saúde indígena.

2. Não se justifica a demora na conclusão da retirada dos ocupantes não índios das terras indígenas. Terras indígenas homologadas há mais de 20 anos ainda sofrem com a presença de ocupantes (TIs: Boqueirão, Pium/Taiano, Ponta da Serra, Tabalascada, Jacamim, Moscow, Muriru, Manoá-Pium/Serra da Lua, Anaro, Aningal, Yanomami, RSS, São Marcos). Muitas destas terras foram demarcadas em ilhas, deixando de fora recursos naturais imprescindíveis para a sobrevivência física e cultural dos povos indígenas. Solicitamos respostas de todos os pedidos de ampliação que até hoje foram ignorados;

3. A presença dos arrozeiros e demais ocupantes não índios na TI Raposa Serra do Sol - RSS ameaça os povos indígenas de Roraima e acarreta na violação de direitos constitucionais, inclusive internacionalmente reconhecidos. Já se passaram três anos desde a homologação e não esperaremos por vinte anos. O Estado Brasileiro deve providenciar a retirada imediata dos ocupantes.

4. A TI RSS foi homologada com uma ferida, que é a sede do Município do Uiramutã. Os limites reclamados não estão apenas sobre o núcleo urbano existente na data da homologação, 15/04/2005, mas amplia limites que vão abranger as comunidades indígenas. Solicitamos que haja providencias imediatas para que os direitos territoriais das comunidades indígenas não sejam violados.

5.Foram queimadas 12 casas na c.i. Mutum, região das serras, sendo 08 destas nesta madrugada. Segundo as informações da comunidade, empregados do garimpeiro Pedro Gaúcho são suspeitos de envolvimento. Já foram denunciados inúmeros ataques que sofremos em razão da disputa sobre a terra e da permanência dos ocupantes não índios. Essas denúncias não foram resolvidas: inquéritos policiais não concluídos, arquivamentos por falta de devida investigação, prescrição de casos e nenhuma punição de fato. Exigimos que sejam tomadas as devidas providências para que este não seja mais um caso de impunidade. Solicitamos auditoria sobre os inquéritos que tratam da matéria indígena, apurando os motivos dos arquivamentos e a demora nas providencias, além de um relatório sobre o andamento dos casos. Solicitamos com urgências medidas para prevenir outras violências e garantir a segurança das comunidades indígenas;

6. Outro ponto crítico é a proposta de construção de uma usina hidrelétrica no rio Cotingo, no interior da Terra Indígena Raposa Serra do Sol. Tal projeto é inconstitucional, tem teor político de desmobilizar a demarcação da terra, acarretará em novas invasões e impactos ambientais indesejados e, portanto, não é de nosso interesse. Além disso, a autorização que se discute no PDC 2540/06 é uma proposta cega e inconseqüente. Por que os povos indígenas têm que ser sacrificados? É inaceitável a maneira com que se vem conduzindo essa discussão. Os povos indígenas têm o direito à consulta, que deve ser respeitado por todas as esferas do governo. Assim, o Governo Federal não deve medir esforços para que o PDC 2540/06 seja rejeitado e arquivado.

7. Exigimos também respostas aos crimes ambientais e a efetiva fiscalização por órgãos responsáveis (Ibama, Funai, Policia Federal). A Assembléia está descontente de ouvir que a falta de coordenação entre esses órgãos (inclusive o desentendimento sobre seus papeis) é a desculpa para falta de ação e providencias. Solicitamos a apuração da não atuação sobre as denuncias de crimes ambientais ocorridos dentro da terra indígena, e as devidas providências (ex. embargo das plantações de arroz, fiscalização sobre a exploração ilegal dos recursos naturais existentes nas TIs e da plantação de acácias nos entorno das terras indígenas, além da cobranças de multas, da contenção do desmatamento e resoluções de problemas como a existências de estradas e impactos da sede municípios em terra indígena, entre outros). Solicitamos também que a fiscalização ambiental indígena seja uma realidade, e que os serviços ambientais prestados pelas comunidades indígenas sejam reconhecidos e compensados;

8. Kanne e Auná (Não!) para a Mineração, não aceitamos imposição do projeto de mineração, não aceitaremos novas invasões e exploração em nossas terras, nossa prioridade é a vida, a consolidação e a implementação dos direitos indígenas;

9. Na área da saúde solicitamos providências urgentes para a grave crise que atravessa a atenção à saúde indígena em nosso estado: os parentes Yanomami estão sem uma assistência permanente, atendidos por trabalhadores temporários devido às irregularidades cometidas pela antiga coordenação regional da FUNASA; no Distrito Sanitário do Leste convivemos com o sucateamento dos veículos, radiofonias e outros equipamentos indispensáveis ao atendimento da saúde, há falta de medicamentos e materiais básicos para os postos de saúde, e a diminuição drástica das horas de vôo destinadas à assistência às comunidades; solicitamos a renovação do convênio CIR-FUNASA que encerra no mês de maio, a liberação das parcelas atrasadas do convênio, e o atendimento pela FUNASA das condições mínimas para a execução adequada dos serviços de saúde nas comunidades;

10. Na área da educação, defendemos a educação escolar indígena diferenciada, com a administração indígena. Queremos o reconhecimento do Centro Indígena de Formação e Cultura RSS e Centro Indígena Wapichana como escolas indígenas federais, em respeito à organização social das comunidades indígenas. A educação escolar indígena está sofrendo com os descasos do Governo Federal e Estadual que deixou sem recursos do FNDE (2008 a 2011) para os cursos de formação de professores, reestruturação física e publicação de materiais didáticos. O MEC não realizou a Conferencia Nacional de Educação Escolar Indígena onde seria feito uma avaliação da implementação das políticas para Educação Escolar Indígena;

11. O Plano de Desenvolvimento da Amazônia em relação às terras indígenas deve ser elaborado a partir da demanda dos povos indígenas, com respeito a seus direitos e interesses. Contamos com a tomada de medidas a partir de hoje para que assim o Estado Brasileiro cumpra com a Convenção 169 da OIT e implemente da Declaração da ONU sobre os direitos indígenas.

12. Nossa assembléia está organizada e unida. Não toleramos mais tanto sofrimento e espera. Estamos cansados de documentos sem respostas, queremos ação!

C.I. Barro, Surumu, TI Raposa Serra do Sol-RR, 08 de março de 2008.

Abaixo assinado ASSEMBLEIA GERAL.

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