VOLTAR

Câmara aprova MP que divide Ibama

OESP, Nacional, p. A4
Autor: CORRÊA, Jonas; SMERALDI, Roberto
13 de Jun de 2007

Câmara aprova MP que divide Ibama
Emenda cria exigência de colegiado para concessão de licença ambiental

João Domingos

A Câmara aprovou ontem por 250 votos a favor, 161 contrários e 7 abstenções a medida provisória que dividiu o Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama) em dois, criando o Instituto Chico Mendes de Conservação da Biodiversidade. A MP seguiu para votação no Senado. Por decisão dos líderes - a partir de sugestão do deputado Antonio Palocci (PT-SP) -, a concessão das licenças ambientais não será feita por um técnico apenas, mas por um colegiado.

A intenção é criar um mecanismo de proteção aos servidores, que, por causa das licenças, muitas vezes eram processados pelo Ministério Público por improbidade administrativa. Isso atrasa as licenças. Foi justamente o impasse na autorização para duas usinas hidrelétricas do Rio Madeira, em Rondônia, que levantou o debate sobre a divisão do Ibama. A obra faz parte do Programa de Aceleração do Crescimento (PAC) e é prioridade para o governo.

Ficou decidido, ainda, que os organismos responsáveis pelos pareceres técnicos para a emissão da licença deverão fazê-lo dentro de um prazo a ser definido em cada uma das esferas de governo - União, Estados e municípios. O PTB pretendia que fosse fixado em 90 dias, mas o relator do projeto, deputado Ricardo Barros (PP-PR), não acatou a sugestão, por considerá-la inconstitucional.

Contrários à divisão do Ibama - e em greve que hoje completa um mês -, servidores do instituto ocuparam as galerias. Quando Barros começou a ler o parecer, três deles ficaram de costas. Foram alertados pelo presidente da Casa, Arlindo Chinaglia (PT-SP), de que o gesto não é permitido. A partir daí, limitaram-se a apoiar os parlamentares contrários à MP, todos eles da oposição.

"Vamos manter a greve e aumentar a pressão para que o Senado rejeite a medida provisória", disse a presidente da Associação dos Servidores do Distrito Federal, Linalva Cavalcanti. Se a pressão não der certo, avisou Linalva, os servidores vão entrar na Justiça para tentar barrar a divisão do Ibama.

Quando o projeto foi aprovado, os servidores resolveram se manifestar e atacaram a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva. Levantaram-se, vaiaram e gritaram: "Ibama, unido, jamais será vencido", "fora, Marina" e "fora PT". Chinaglia determinou aos seguranças que esvaziassem as galerias.

CONTRATAÇÕES

Pela proposta aprovada pelos deputados, o Ibama cuidará dos pareceres técnicos e das licenças ambientais; o Instituto Chico Mendes ficará com as demais funções do órgão. Para isso, foram criados cinco cargos de direção - presidente e quatro diretores - e 153 funções gratificadas.

O Instituto Chico Mendes receberá parte do patrimônio, dos recursos orçamentários, extra-orçamentários e financeiros, do pessoal e dos cargos e funções vinculados ao Ibama. O órgão foi autorizado a contratar funcionários temporários, em caso de emergência, e poderá explorar comercialmente os parques nacionais da União e outras unidades de conservação, para reforçar o caixa.

'Vai gerar ineficiência e aumentar a burocracia'

Entrevistas

Jonas Corrêa: presidente da Associação Nacional dos Servidores do Ibama

Roldão Arruda

Os funcionários do Ibama são os mais fortes opositores à proposta de divisão do instituto. Assim que o governo apresentou a medida provisória, quase todos os seus 6.400 servidores entraram em greve. Na entrevista abaixo, o presidente da Associação Nacional dos Servidores do Ibama, Jonas Corrêa, explica os motivos que levaram ao protesto.

Como o senhor viu a aprovação da medida provisória na Câmara?

Temos advertido toda a sociedade brasileira de que essa medida provocará o caos na política ambiental do País. Se isso acontecer, a responsabilidade será do governo e dos deputados que hoje votaram a favor. Nós vamos continuar lutando para revertê-la no Senado. Não queremos o caos.

Quais os motivos pelos quais os funcionários se opõem à divisão?

O principal motivo é a quebra da unicidade da gestão ambiental, que vai ocorrer com essa medida.

Tem sido dito que o propósito é reduzir uma estrutura gigantesca, que gera burocracia e ineficiência.

Não é verdade. Nós estamos certos de que a divisão do órgão é que vai gerar ineficiência e aumentar a burocracia.

Por quê?

Veja o exemplo do licenciamento ambiental. Hoje quem precisa dele tem de se submeter a um conjunto de até 8 procedimentos. Com a divisão, serão necessários até 36 procedimentos, de acordo com avaliação feita por técnicos que trabalham exatamente nessa área. Como é que se pode dizer que haverá menos burocracia? Ela vai aumentar.

Também tem sido dito que o gigantismo do órgão favorece a corrupção.

Isso não faz sentido. Um mesmo funcionário não executa todas as tarefas. Temos gente especializada na área de conservação, de licenciamento, fiscalização. Pela nossa avaliação, as coisas vão piorar se houver a divisão, porque o órgão ficará mais fragilizado. Até agora só falaram em dividir, mas não disseram nada sobre contratação de mais funcionários, de mais recursos. Falam que a instituição funciona mal, mas só pensam em dividi-la e enfraquecê-la, por motivos que eu não consigo ainda entender direito.

'Haverá mais foco e mais responsabilidade'

Roberto Smeraldi: diretor da ONG Amigos da Terra

Para o ambientalista Roberto Smeraldi, diretor da organização não-governamental Amigos da Terra, a divisão do Ibama é um passo necessário para aumentar a eficiência do órgão. Na opinião dele, o gigantismo do órgão acaba muitas vezes se superpondo ao próprio Ministério do Meio Ambiente, ao qual deveria estar subordinado. Não se deve acreditar, porém, ressalva o especialista, que a divisão seja suficiente para resolver os problemas.

O senhor apóia a divisão do Ibama? Por quê?

Apóio. Acho um passo necessário diante do gigantismo do órgão. Esse gigantismo fortaleceu ao longo dos anos o corporativismo no interior da instituição, que acabou se sobrepondo ao próprio ministério.

Como isso ocorreu?

A maior parte dos funcionários do ministério é de consultores temporários, contratados por meio de agências de cooperação internacional. Os concursados são pouquíssimos, especialmente se comparados aos do Ibama. Isso favoreceu a superposição da autarquia ao ministério, quando deveria ser o contrário. Trata-se de um fato que quase todos os ministros que passaram pela pasta enfrentaram. A resposta que se dava na maior partes das vezes era a troca do presidente do Ibama, mas isso não resolvia nada, porque o problema estava na estrutura.

Uma estrutura menor e mais enxuta pode criar mais eficiência?

Sim. Haverá mais foco e mais responsabilidade nas atividades. Creio que isso também vai melhorar o combate à corrupção. Quando, lá na ponta do Brasil, distante da capital federal, um mesmo funcionário tem poderes muito amplos, com atribuições tanto para autorizar uma queimada quanto para fiscalizar, você contribui para o surgimento da corrupção. A ministra sabe disso e em vários momentos tentou quebrar essa estrutura recorrendo a sujeitos externos, notadamente a Polícia Federal. Ao mesmo tempo em que realizava operações para investigar bandidos, tinha de investigar o próprio Ibama.

O governo está no rumo certo?

Sim. Mas a divisão não basta. É importante criar agora um grupo especializado em fiscalização, uma polícia ambiental, em parceria com o Ministério da Justiça. Também é preciso pensar rapidamente na questão da manutenção das unidades de conservação.

OESP, 13/06/2007, Nacional, p. A4

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.