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Aquecimento global ameaça dividir Amazônia

O Globo, Ciência e Vida, p. 28
28 de Fev de 2007

Aquecimento global ameaça dividir Amazônia
Clima mais quente e seco pode fazer parte da floresta virar cerrado. Elevação do mar destruiria orla do Rio

Carolina Brígido

A Amazônia corre o risco de ser literalmente rachada ao meio em razão do aquecimento do planeta. Se forem mantidas as taxas globais de emissões de gases do efeito estufa, a temperatura da região pode aumentar em até 8 graus Celsius e, a partir de 2050, o centro da floresta será transformado em 600 mil quilômetros quadrados de Cerrado, que dividirá a Amazônia em dois blocos de remanescentes. O prognóstico é parte do cenário traçado pelo estudo Mudanças Climáticas Globais e seus Efeitos sobre a Biodiversidade, divulgado ontem pelo Ministério do Meio Ambiente.

O relatório brasileiro é alarmante em relação ao nível do mar, que tende a aumentar 40 centímetros por século. Cerca de 42 milhões de pessoas que vivem na zona costeira poderão ser afetadas pelo avanço do Oceano Atlântico. O relatório mostra o Rio de Janeiro como "uma das cidades mais vulneráveis". Na costa, calçadões, casas e bares poderão ser destruídos pelas ondas ou pelo aumento de até quase meio metro do nível médio do mar. A Ilha de Marajó, no Pará, poderá perder até 36% de seu território.

E, segundo o estudo, o processo de encurtamento das praias já começou. Em Recife, a linha costeira retrocedeu 80 metros entre 1915 e 1950 e mais de 25 metros entre 1985 e 1995. O relatório mostra que uma elevação de 50 centímetros no nível do Atlântico poderia consumir 100 metros de praias no Norte e no Nordeste. Outra conseqüência seria a destruição de portos e a falência de redes de esgoto.

O estudo, coordenado pelo cientista José Marengo, do Instituto Nacional de Pesquisas Espaciais (Inpe), traz um enfoque nacional do alerta global dado no início do mês por cientistas do Painel Internacional de Mudanças Climáticas (IPCC) da ONU. Segundo o documento, se nada for feito para reverter a situação de desmatamento e emissão de gases tóxicos no Brasil e no mundo, a temperatura média do país poderá aumentar em 4 graus Celsius até 2100. Na Amazônia, esse aumento pode ser de 8 graus Celsius.

Assim como foi mostrado no documento do IPCC, as mudanças climáticas no Brasil também são causadas pela ação humana. Os principais fatores são o desmatamento, o aumento das queimadas e a queima de combustíveis fósseis.

- O estudo vai ajudar na formação de políticas públicas para o setor. Ou entramos em um novo processo civilizatório, ou o cenário vai ser muito difícil - disse a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva.

O estudo também conclui que haverá a diminuição na vazão nos rios devido à evaporação, causada pelo aquecimento do ar, e à redução das chuvas.
Em algumas regiões, a geração de energia hidroelétrica poderá ficar comprometida.

De 1961 a 1990, o país registrou uma temperatura média de 25 graus Celsius. Até o fim do século, essa média pode chegar a 29,9 graus Celsius. No Nordeste, o aumento pode variar de 2,2 graus Celsius a 4 graus Celsius.

O ministério divulgou o resultado de outras sete pesquisas.
Uma delas, coordenada pelos cientistas Adalto Bianchini e Pablo Martinez, da Universidade Federal do Rio Grande do Sul, revela que o aumento de temperatura pode comprometer a biodiversidade.

Os efeitos do calor

A temperatura média do Brasil pode subir em até 4 graus Celsius no fim do século, passando dos atuais 25 graus Celsius para 29,9 graus Celsius .

Agricultura: Culturas perenes, como a laranja, tendem a buscar regiões com temperaturas mais baixas. Por isso, a produção poderá ser deslocada para o Sul.
i RIOS: A redução de chuvas e a diminuição da vazão nos rios vão limitar os esgotos e o transporte fluvial e podem ainda comprometer a geração de energia hidroelétrica.

Grandes cidades: Regiões metropolitanas ficarão ainda mais quentes.
Aumentarão os riscos de inundações, enchentes e desmoronamentos principalmente nas encostas de morro.

Saúde: Os casos de doenças infecciosas cujos vetores sejam insetos típicos de regiões mais quentes podem se expandir para mais áreas. Caso da dengue.

Vida Animal: O aumento da temperatura pode alterar o equilíbrio celular de espécies. Nem todas sobreviveriam a um clima muito mais quente que o atual.

O mapa das mudanças no Brasil

Ilha de Marajó

Simulações feitas a partir de imagens de satélites atestaram que a Ilha de Marajó
ficaria com 28% de seu território submerso. Caso o aumento chegue a seis metros, seriam perdidos 36%
do território

Amazônia

Se o ritmo de destruição da floresta continuar o mesmo, a Amazônia será reduzida dos atuais 5,3 milhões de quilômetros quadrados (85% da área original) para 3,2 milhões de quilômetros quadrados até 2050 (53% da cobertura original) o O aquecimento global poderá tornar o clima amazônico mais seco. Com isso, parte da floresta pode virar cerrado. A previsão é que, a partir de 2050, uma área de 600 mil quilômetros quadrados no centro da Amazônia se torne um cerrado, dividindo a floresta em duas partes o O aumento da temperatura média na região pode ser de até 8 graus Celsius. No cenário mais otimista, o aumento será de 3 graus até 2100

Região Sul

A produção de grãos poderá ficar inviabilizada no Sul com o aumento da temperatura, secas mais freqüentes e chuvas restritas a eventos extremos de curta duração. As chuvas cada vez mais intensas poderiam castigar as cidades, com grande impacto social

Região Sudeste

O aumento da temperatura ameaça comprometer a oferta de água para a
agricultura, o consumo e a geração de energia

Semi-Árido
A temperatura pode aumentar de 2 a 5 graus Celsius no Nordeste até o fim do século. A Caatinga será substituída por uma vegetação mais árida. O desmatamento da Amazônia pode deixar o semi-árido mais seco e gerar ondas de refugiados ambientais

Litoral

O nível do mar tende a aumentar 40 centímetros por século. Cerca de 42 milhões de pessoas que vivem na zona costeira poderão ser afetadas pela elevação do Atlântico: construções à beira-mar poderão desaparecer, portos poderão ser destruídos e populações teriam que ser remanejadas. Sistemas precários de esgoto poderão entrar em colapso. Novos furacões poderão atingir a costa do Brasil. Um estudo específico para Santos e São Vicente, em São Paulo, apontou a destruição de praias e a diminuição da fauna local

O Globo, 28/02/2007, Ciência e Vida, p. 28

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