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Amapá pode ter "observatório" pré-histórico

FSP, Ciência, p. A19
13 de Mai de 2006

Amapá pode ter "observatório" pré-histórico
Comparado a Stonehenge, sítio mostraria conhecimentos indígenas sobre o céu

DA REPORTAGEM LOCAL

Arqueólogos do Iepa (Instituto de Pesquisas Científicas e Tecnológicas do Estado do Amapá) dizem ter identificado um observatório astronômico pré-histórico no município de Calçoene, a 390 quilômetros da capital do Estado amazônico. Trata-se de um conjunto de pedras dispostas em círculo, cuja estrutura estaria ligada a eventos celestes, como o solstício de inverno (momento do ano em que um dos hemisférios da Terra está na sua posição mais distante do Sol).
A presença de círculos de pedras maciças no Amapá é conhecida há tempos. "Há relatos do começo do século passado falando disso", conta o arqueólogo Eduardo Góes Neves, da USP. Os próprios moradores de Calçoene já sabiam da existência das pedras. Mas é a primeira vez que alguém tenta atribuir formalmente um significado astronômico a elas, diz a arqueóloga Mariana Petry Cabral, coordenadora do estudo do Iepa ao lado de seu colega e marido João Saldanha.
"Trata-se de uma estrutura muito bonita, no alto de uma colina", conta ela. "Quando passamos a examiná-la, percebemos uma inclinação que poderia estar associada ao solstício de inverno e decidimos verificar isso".
Eles tiraram a prova (no hemisfério Norte, onde está o Amapá, a data costuma corresponder ao dia 22 de dezembro) e dizem ter verificado que uma das pedras realmente parece estar exatamente alinhada com o Sol no solstício de inverno. Nesse dia, quando o astro alcança sua posição mais alta no céu (o chamado zênite), ele apareceria logo acima da pedra, de forma que ela não lança sombra nenhuma no chão.
A hipótese de Cabral é que o círculo tenha sido um misto de observatório e centro ritualístico. Chegam a compará-lo com Stonehenge, famoso monumento pré-histórico do Reino Unido. "Claro que Stonehenge é muito maior. É mais uma comparação para situar o público leigo", diz.
Para Germano Afonso, especialista em arqueoastronomia (a astronomia dos povos antigos) da Universidade Federal do Paraná, tanto a localização quanto a disposição das pedras são coerentes com a interpretação astronômica. "Não é de surpreender, porque na verdade há outros exemplos parecidos em outros Estados do Brasil", afirma ele. No entanto, ele diz não concordar com a hipótese, levantada por Cabral, de que apenas uma sociedade complexa poderia ter montado a estrutura.
"Não é preciso uma organização social mais elaborada do que a da maioria dos índios da época do Descobrimento para isso", afirma. Góes Neves concorda: "Conhecimento astronômico vem da observação da natureza, e qualquer grupo caçador-coletor tem isso." O astrônomo Ronaldo Rogério de Freitas Mourão, por sua vez, diz que é "uma pretensão" associar o sítio a Stonehenge.
Cabral e colegas querem, agora, escavar o local em busca de indícios da época de sua construção. Também querem determinar a origem das pedras: elas claramente foram transportadas para lá, mas não se sabe de que distância podem ter vindo. (RJL)

FSP, 13/05/2006, Ciência, p. A19

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