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A água é nossa

JB, Outras Opiniões, p. A11
Autor: BARBOSA, Alfredo Ruy
10 de Set de 2005

A água é nossa

Alfredo Ruy Barbosa
Advogado e cronista

É mundialmente notório o fato de que o presidente Bush inventou mentiras esfarrapadas para invadir o Afeganistão e o Iraque. Sabe-se hoje que, na realidade, Bush estava apenas aplicando a velha tática das ''invasões bárbaras'', inspirada numa política que batizei aqui, certa vez, de ''o petróleo é nosso, onde quer que esteja!''. E agora acrescente-se: ''o mundo também é nosso!''. Esse foi, aliás, o motivo que me levou a recordar, naquela mesma crônica, a seguinte declaração do professor da MIT, Noam Chomsky, numa de suas entrevistas em emissoras de rádio nos Estados Unidos e no Canadá: ''Quando nos atacam, o governo alega um ato de terrorismo; mas, quando invadimos outros países, isso é denominado de guerra justa''. Nesse mesmo rumo, o presidente Bush aplicou a política imperialista que vem sendo adotada, há mais de um século, pelos governos conservadores dos Estados Unidos em todo o mundo, principalmente na América Latina, à qual o ex-secretário de Estado, Henry Stimson, se referiu como ''aquela nossa área que nunca nos perturbou''. Para comprovar essa visão absurda, basta lembrar as invasões da Guatemala, da República Dominicana, de Granada e, mais recentemente, do Haiti. E, além disso, o comprovado apoio do governo americano aos golpes militares no Chile e no Brasil. A verdadeira estratégia por trás disso tudo foi sempre a de dominar os recursos naturais desses países para proteger os interesses americanos.
No mundo atual, não é só a escassez de petróleo que preocupa os governos dos países ricos, mas, também, a comprovada redução dos recursos hídricos do nosso sofrido planeta. Esse é o motivo pelo qual o presidente Bush pretende agora dominar as reservas de água potável da América do Sul (aquela ''terrinha nossa''). Com esse objetivo, ele enviou, recentemente, o seu Secretário de Defesa, Donald Rumsfeld, ao Paraguai para negociar a instalação de uma base militar americana naquele país. O local proposto para esse novo plano de invasão fica ao lado do Aquífero de Guarani, a mais importante reserva subterrânea de água doce da América Latina e uma das maiores do mundo.
Essa valiosa reserva foi assim batizada pelo geólogo uruguaio Danilo Anton em memória do povo indígena que habita aquela região. O sistema Guarani ocupa uma área de 1,2 milhões de km² na Bacia do Rio Paraná e em parte da Bacia Chaco-Paraná, estendendo-se pelos territórios do Brasil, Uruguai, Argentina e Paraguai numa área total equivalente às da França, Inglaterra e Espanha juntas. A maior ocorrência desse aquífero verifica-se em território brasileiro numa extensão de 840.000 km² (2/3 da área), abrangendo os Estados de Goiás, Mato Grosso do Sul, Minas Gerais, São Paulo, Paraná, Santa Catarina e Rio Grande do Sul. A reserva de Guarani é, sem dúvida, uma riqueza natural estratégica para o nosso país e para os nossos vizinhos.
Foi apenas por coincidência que o presidente Bush e os ''falcões'' de Washington resolveram instalar naquela área a sua nova ''Guantánamo''? É óbvio que não! Nos últimos anos, a ONU e outras instituições internacionais vêm tentando alertar todos os países a respeito de uma próxima escassez mundial de água potável. E esse cenário se agrava a cada dia em virtude do aquecimento global e do desperdício incontrolável desse precioso recurso da natureza. Fica, portanto, evidente que o claro objetivo do governo americano é o de dominar, na ''sua terrinha'', uma reserva hoje mais vital do que o petróleo.
Por isso, espero que, durante a visita que o presidente Bush fará ao Brasil no próximo mês de novembro, ele seja recebido, como se fazia antigamente, com muitos cartazes de ''go home!'' e outros que sugiro sejam assim redigidos: ''The water is ours!'' ou ''A água é nossa!''

Alfredo Ruy Barbosa Advogado e cronista

JB, 10/09/2005, Outras Opiniões, p. A11

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