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Adoção de protocolo beneficia o País

OESP, Vida, p. A19
07 de Nov de 2004

Adoção de protocolo beneficia o País
Antes mesmo de a Rússia assinar o acordo de Kyoto, o Brasil já recebeu 18 pedidos para avaliação de projetos de créditos de carbono

Herton Escobar

Muito antes de ter algum efeito sobre o aquecimento global, a ratificação do Protocolo de Kyoto pela Rússia vai esquentar o mercado de créditos de carbono para redução de emissões. Só o anúncio do presidente Vladimir Putin de que o governo seria favorável ao acordo, no início de outubro, já foi suficiente para incendiar o setor.
O efeito foi claramente sentido na DNV, uma das poucas empresas certificadas pela Organização das Nações Unidas (ONU) para validar projetos de créditos de carbono. Três dias após a sinalização do presidente Putin - e antes mesmo de o projeto ser aprovado na Câmara Baixa do Parlamento russo -, a representação da empresa no Brasil recebeu 18 pedidos de proposta para avaliação de projetos. Até então, a média do ano era de cinco por mês. "O mercado explodiu", disse o diretor da DNV no País, Samuel Barbosa. "Claramente estava contido, aguardando a assinatura."
O governo russo anunciou anteontem, após anos de polêmica e especulação, a ratificação definitiva do protocolo pelo presidente Putin. Uma vez submetido ao Parlamento, o projeto teve aprovação surpreendentemente rápida, em questão de semanas. A adesão da Rússia era o último passo necessário para a validação do protocolo, que deverá entrar em vigor 90 dias após a apresentação dos documentos russos à ONU.
O acordo exige que os países ricos signatários reduzam as emissões de gases do efeito estufa - como dióxido de carbono (CO2) e metano - em média de 5% até 2012, com base nos volumes emitidos em 1990. Para isso, além de cortar emissões na indústria e no consumo de combustíveis fósseis, poderão financiar projetos e comprar créditos certificados de reduções nos países em desenvolvimento. Essa opção constitui o Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL), que pode produzir créditos tanto pela redução de emissões quanto pela absorção de gás carbônico por meio de projetos de reflorestamento.
Demanda
A maioria das consultas recebidas pela DNV, revelou Barbosa, diz respeito a projetos de MDL em aterros sanitários, pela queima e pelo aproveitamento do metano que emana dos lixões. E a demanda só tende a aumentar com a aplicação do protocolo. O preço fixado oficialmente para a tonelada de carbono, segundo ele, é de US$ 5, valor que poderá crescer muito conforme a demanda.
A União Européia, adiantando-se ao protocolo, já estabeleceu metas para redução de emissões e abrirá em janeiro seu mercado de créditos de carbono. Além disso, créditos já são negociados na Bolsa de Chicago e diretamente entre governos e empresários de vários países, incluindo o Brasil.
Espera-se que o País seja um dos principais beneficiários do MDL, por sua condição tecnológica e amplitude de oportunidades na indústria e na área florestal. "Agora é a hora de mostrar que somos capazes de fazer o dever de casa", disse o pesquisador Paulo Moutinho, do Instituto de Pesquisa Ambiental da Amazônia.
Ontem, o Ministério do Meio Ambiente divulgou nota assinada pela ministra Marina Silva, na qual o governo brasileiro se congratula com a Rússia por, finalmente, ter aderido ao protocolo.

O MDL é de grande interesse para setor florestal
Herton Escobar
Uma das indústrias que esperam participar do Mecanismo de Desenvolvimento Limpo (MDL) do Protocolo de Kyoto no Brasil é o setor florestal. Para isso, porém, o País precisará de um sistema confiável de medições e certificação, segundo o vice-presidente da Associação Brasileira de Celulose e Papel (Bracelpa), Boris Tabacof, desde abril chairman do Comitê Consultivo sobre Papel e Madeira da Fundação das Nações Unidas para Agricultura e Alimentação (FAO).
Como o setor espera participar do mercado de carbono?
Há aspectos interessantes nisso. O Brasil não está obrigado a fazer reduções, mas nada impede que a gente possa vender créditos. Ainda não há consenso sobre qual é o equilíbrio do carbono nas florestas nativas. Agora, na nossa indústria, para cada árvore em crescimento certamente há retenção do carbono. É a fotossíntese, que a gente estuda na escola.
Mas essas árvores estão crescendo para ser derrubadas. Então esse carbono não volta para a atmosfera?
Esse é um cálculo complexo, que ainda não está fechado. No comitê que eu presido foram apresentados já vários estudos curiosos. A questão não é só o crescimento da árvore. Há cálculos muito sofisticados sobre o armazenamento de carbono no próprio papel e até em móveis e placas. Tudo o que leva madeira tem carbono fixado. No Brasil, é preciso que alguém faça essas contas, com os critérios técnico-científicos, como na União Européia.
O setor florestal vê isso como um mercado promissor?
É difícil fazer previsões. Ainda é um mercado experimental, mas a tendência é isso tomar um volume muito grande. O Brasil tem a seu favor mais créditos do que débitos e isso influencia nas previsões estratégicas do setor. Algumas empresas já começaram a estudar a possibilidade de obter créditos de carbono. Mas, veja bem, não vamos plantar árvores com essa finalidade; vamos plantar para tirar madeira. O MDL é uma vantagem adicional. É um atrativo a mais para o investimento.

Para entender o caso
Os principais pontos do protocolo
O protocolo: Os países ricos signatários devem reduzir suas emissões de gases do efeito estufa em média de 5% até 2012.
Anexo 1: Mais de 120 nações já ratificaram o protocolo, mas apenas aquelas mais industrializadas são obrigadas a reduzir suas emissões. Esses países (39) constituem o chamado Anexo 1.
O MDL: O Mecanismo de Desenvolvimento Limpo permite que os países do Anexo 1 financiem e comprem créditos de carbono pela redução de emissões ou captação de gases do efeito estufa nos países em desenvolvimento.
O conceito: O MDL facilitaria o cumprimento das metas, evitando maiores impactos econômicos à indústria dos países ricos e financiando o desenvolvimento sustentável nos países pobres. Os créditos comprados contam como se o país do Anexo 1 tivesse feito a redução em seu próprio território.
O mercado: Os créditos de carbono poderão ser negociados entre países e empresas, ou comercializados em bolsas internacionais. O preço básico para a tonelada de carbono é de US$ 5.

OESP, 07/11/2004, Vida, p. A19

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