VOLTAR

Acre vira referência de design italiano

Valor Econômico, Especial, p. F3
31 de Ago de 2016

Acre vira referência de design italiano

Andrea Vialli

A história do Acre relaciona-se intimamente com a madeira: foi o látex das seringueiras que deu impulso à ocupação do Estado e, no passado contemporâneo, a luta do extrativista Chico Mendes mostrou ao mundo a importância da preservação da floresta e do homem que a habita. Agora, o Acre buscou o design para escrever um novo capítulo: o de ser um polo produtor de móveis de alto padrão, feitos com madeira certificada de comunidades extrativistas. Para isso, o governo do Estado firmou, em 2012, uma parceria com o Poli.Design, consórcio do Instituto Politécnico de Milão, para desenvolver as peças e treinar marcenarias do polo moveleiro da capital Rio Branco.
O resultado do trabalho, que durou quatro anos, foi apresentado durante a Design Week, feira de design realizada em agosto em São Paulo, quando foi lançada a marca Acre, Made in Amazonia, que coroa o projeto. A marca é composta por cinco linhas de móveis com design contemporâneo, produzidos com variedade de madeiras nativas da Amazônia, como cedro, cumaru-ferro, itaúba, jatobá, cerejeira e tauari, todas extraídas em sistema de manejo comunitário e certificadas com o selo FSC, principal certificação internacional que atesta que a madeira é extraída de acordo com padrões ambientais e sociais. As peças têm assinatura do designer francês Emmanuel Gallina e do brasileiro Bernardo Senna.
De acordo com Marlúcia Cândida, arquiteta e idealizadora do projeto, o Acre já vem se consolidando como um produtor de madeira certificada, mas boa parte da madeira que sai da floresta é comercializada em toras ou serrada. "Vender em toras não agrega tanto valor, então fomos buscar ajuda na Itália para criar e fomentar uma cultura de design no Estado", explica Marlúcia, que também é a primeira-dama do Acre. Ela explica que uma primeira coleção de móveis com colaboração do Poli.Design foi lançada em 2014, após um treinamento realizado com 35 marceneiros, arquitetos, artesãos e filhos de marceneiros com apoio do Sebrae local e da Federação das Indústrias do Acre.
Agora, foram feitos ajustes na proposta comercial das linhas de movelaria, que são inspiradas no modo de vida tradicional e saberes amazônicos - um das linhas, batizada de Palafita, remete às habitações sustentadas por estacas; outra linha, a Yuxin, é inspirada nas práticas ancestrais do povo indígena Kaxinawá. "Em cada peça está inserida a cultura, a espiritualidade, a forma e as cores que representam o Acre", diz Marlúcia. As madeiras são fornecidas pela cooperativa Cooperfloresta, que já atua com o polo moveleiro de Rio Branco e garante que 100% da madeira tem origem no manejo sustentável.
Outra ação do governo do Acre para incentivar o design no Estado é a criação da Escola de Design, um projeto em parceria com o Banco Mundial que deverá oferecer formação técnica em design para a mão de- obra do polo de Rio Branco, que já conta com um instituto de tecnologia do Senai. A expectativa é que a escola esteja em operação no segundo semestre de 2017. Além disso, explica Marlúcia, a marca Acre, Made in Amazonia vai figurar em todos os produtos que forem manufaturados no Acre, desde a carne de pirarucu de manejo, o artesanato e a madeira.
Convidado a integrar o projeto Acre, Made in Amazonia, o designer carioca Bernardo Senna até então não tinha aproximação com a Amazônia. Senna, que assina várias peças da coleção, fez uma imersão no modo de trabalho das pequenas marcenarias do polo moveleiro de Rio Branco junto com a equipe do Poli.Design. "Os marceneiros locais usam diferentes tipos de madeira para fazer um móvel, este é um forte traço que está presente nas nossas peças", diz Senna. Um exemplo é o bufê Jatobá, uma peça com linhas orgânicas e que pode ser confeccionada em até quatro madeiras diferentes.
As peças encantaram o empresário Flavio Gazani, dono da Lofty Concept, loja de móveis de alto padrão localizada no Morumbi, em São Paulo. "O design é arrojado, mas com apelo regional. Acredito na receptividade do consumidor para peças com apelo sustentável" diz o empresário. As peças custarão entre R$ 2 mil e R$ 20 mil.

Cooperativa conquista selo de manejo

Andrea Vialli

Nas últimas duas décadas, as comunidades extrativistas do Acre viram muitas mudanças acontecerem em seu modo de vida. Regiões aonde só era possível chegar por barco passaram a ser atendidas por estradas, o que facilitou o escoamento dos produtos florestais, como o látex das seringueiras, as castanhas e a madeira.
Uma combinação de políticas públicas estaduais voltadas à conservação ambiental, com valorização do extrativismo, tem permitido ao Acre manter 87% de seu território ocupado com a floresta amazônica.
Comunidades conquistaram a certificação FSC de manejo comunitário, o que está abrindo novas possibilidades de mercado para os produtos da região.
Agora, com o projeto dos móveis da marca Acre, Made in Amazonia, a expectativa é que a demanda por madeira certificada ganhe novo impulso. "Nossa luta é para que esse diferencial seja reconhecido pelo mercado", diz Evandro Araújo, superintendente da Cooperfloresta, cooperativa que fornece a madeira certificada para o polo moveleiro de Rio Branco, responsável pela manufatura do mobiliário. "Não almejamos uma produção industrial em grandes volumes, mas a agregação de valor para o produto da floresta", diz.
A Cooperfloresta é um modelo de arranjo extrativista que ilustra como as comunidades locais se organizam para explorar a floresta de modo sustentável. Constituída em 2005, a cooperativa uniu comunidades que já vinham trabalhando com o manejo certificado. Diferente da extração convencional, no manejo só é permitido tirar cinco árvores de cada hectare amazônico, que concentra de 250 a 300 espécies. A mesma área só pode voltar a ser explorada em trinta anos, o que dá fôlego para a floresta se recuperar naturalmente.
Hoje dez comunidades são associadas à Cooperfloresta, e os produtos florestais, principalmente a madeira, garantem sustento para 177 famílias cooperadas. Em 2014, a cooperativa produziu 18 mil metros cúbicos de madeira certificada, o que levou R$ 1,1 milhão em renda líquida para as comunidades.
Borracha e castanhas complementam a renda das famílias.
"Antes do manejo comunitário, a renda familiar com madeira era de R$ 1.700 ao ano. Depois, foi para R$ 22 mil. O uso inteligente da floresta traz qualidade de vida", diz Tião Vianna, governador do Acre.
Apesar do bom funcionamento do modelo, os extrativistas ligados à Cooperfloresta queixam-se das dificuldades de obter o licenciamento ambiental para explorar a madeira este ano. Entraves burocráticos junto ao Incra e ICMBio não permitiram, até o momento, que os extrativistas conseguissem licença para realizar o manejo na safra 2016, cujo período vai de junho a novembro. "Não vamos conseguir tirar madeira nova este ano, então estamos trabalhando com o manejo do ano anterior. Mas é preciso que essas questões estejam resolvidas para a safra de 2017", diz Araújo, da Cooperfloresta.

Valor Econômico, 31/08/2016, Especial/Pequenas e médias empresas, p. F3

http://www.valor.com.br/empresas/4693389/acre-vira-referencia-de-design…

http://www.valor.com.br/empresas/4693391/cooperativa-conquista-selo-de-…

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.