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Violência contra indígenas leva deputados a oito Estados

Carta Maior-São Paulo-SP
Autor: Verena Glass
15 de Out de 2003

O assassinato de 21 índios de 11 etnias diferentes entre janeiro e setembro deste ano - a maioria resultante de conflitos de terra, como aponta levantamento preliminar do Conselho Indigenista Missionário (Cimi) - é um dos aspectos da violência contra comunidades indígenas que motivaram a caravana da Comissão dos Direitos Humanos da Câmara dos Deputados (CDH) aos Estados de Mato Grosso do Sul, Mato Grosso, Rondônia, Roraima, Bahia, Pernambuco, Santa Catarina e Rio Grande do Sul.
Na raiz do problema, afirma o presidente da CDH, deputado Orlando Fantazzini (PT/SP), estão o preconceito e o desrespeito de fazendeiros, madeireiros, mineradores, membros do Judiciário e governos locais e federal por direitos básicos dos índios. "Nunca tivemos no país uma política indigenista de fato. A Funai (Fundação Nacional do Índio) está sucateada - o último concurso público do órgão aconteceu em 86, e o seu orçamento para o ano que vem sofrerá um corte considerável. As polícias perseguem os índios e protegem seus agressores. O dinheiro destinado à saúde nas comunidades indígenas é desviado. Vimos muita miséria, ódio e desesperança", afirmou Fantazzini após a primeira semana de visitas. Procurada pela Agência Carta Maior, a direção da Funai não se manifestou sobre o assunto até o fechamento desta reportagem.

No relatório do Cimi sobre Violência contra os Povos Indígenas em 2003, impressionam os requintes de crueldade com que foram cometidos vários dos assassinatos (como morte a pauladas, por espancamento, apedrejamento e degolamento), o que reflete o ódio de fazendeiros e da comunidade branca pelos indígenas, afirma Fantazzini. Segundo ele, as invasões de áreas indígenas foram e continuam sendo legitimadas pelo poder local, um processo que remete à distribuição de terras a colonizadores pelo presidente Getúlio Vargas na década de 50.

Hoje, grandes áreas indígenas são ocupadas por fazendas antigas, e há uma ação sistemática de coerção e intimidação dos índios por parte de proprietários, polícias e governo. "No Mato Grosso, os índios xavantes acabaram fazendo um acordo com o governador Blairo Maggi: abririam mão da demarcação de parte de sua área em troca da mecanização de suas lavouras. Segundo o cacique, a decisão foi tomada em função da ameaça dos fazendeiros. Ele disse que os xavantes são um povo guerreiro, e se o conflito se acirrasse, a morte de sua comunidade seria certa", diz Fantazzini. Ele alerta, porém, que este acordo é inconstitucional, já que as terras indígenas pertencem à União e não podem ser barganhadas pelos índios.

No Mato Grosso do Sul a situação é parecida. Segundo Jorge Vieira, membro do Cimi-MS, o ex-secretário das Finanças do Estado Ricardo Bacha chegou a declarar, na audiência pública convocada pela CDH em Cuiabá, que os fazendeiros defenderiam seus interesses até as últimas conseqüências. "Ele é um dos que estão em terras indígenas, e disse que vai haver morte", afirma Vieira.

Já em Rondônia, os índios cintas-largas conseguiram expulsar, na semana passada, todos os garimpeiros que trabalhavam ilegalmente na Reserva Roosevelt (segunda maior mina de diamantes do país). "Isto alivia a situação imediata das comunidades, mas os jovens continuam com medo de freqüentar as escolas da cidade em função de perseguição e maus tratos", diz Fantazzini. Segundo ele, um dos grandes problemas é o tratamento discriminatório da Justiça em relação aos índios. "Diferentemente dos brancos, eles são presos por porte ilegal de arma. Uma fiança que, para um branco, seria de R$ 1.000, para os índios é de R$ 15 mil. Os policiais designados para proteger a área dos cintas-largas apenas cobravam pedágio dos garimpeiros. A Polícia Florestal foi acionada e logo desacionada pelo governo do Estado, quando sua empresa foi proibida de explorar os diamantes da área. Acho que o Judiciário, em geral, está fazendo questão de mostrar claramente de que lado está".

Após o termino da caravana, no dia 18 deste mês, a CDH fará um relatório a ser entregue à Câmara Federal, ao governo e a entidades internacionais de defesa dos direitos humanos.

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