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Vinte e seis horas na árvore

O Globo, Rio, p. 22
18 de Dez de 2013

Vinte e seis horas na árvore
Formado em pedagogia e professor, índio que fez protesto contra desocupação de antigo museu é levado para delegacia e autuado por desobediência após ser retirado de planta

RAFAEL GALDO
rafael.galdo@oglobo.com.br

O índio que permaneceu 26 horas nos galhos de uma árvore no interior da Aldeia Maracanã foi autuado por desobediência e liberado da 18ª DP (Praça da Bandeira) na tarde desta terça-feira. José Urutau foi retirado esta manhã por homens do Corpo de Bombeiros. Segundo o indígena, os bombeiros agiram com truculência.
Exibindo hematomas no pescoço, Urutau afirmou que por pouco não acabou enforcado quando os bombeiros tentaram erguê-lo com o auxílio de uma escada magirus:
- Foi uma ação desastrosa. Saí por livre e espontânea pressão. Primeiro, os bombeiros tinham me entregue uma corda, com cinto de segurança, que amarrei na árvore para não cair. Logo um seguida um bombeiro veio por cima, prendeu um gancho no cabo por trás de meus pescoço. Quando a escada começou a me erguer, a corda ainda estava presa à árvore. Por pouco não fui enforcado. Vou fazer exame de corpo de delito - disse.
Apesar do relato feito à imprensa na saída da delegacia, em depoimento formal o indígena não disse ter sofrido maus-tratos dos bombeiros. Assim que deixou a delegacia, Urutau foi abraçado pela mulher e outros índios, além de ter sido saudado por ativistas.
Pós-graduação em educação indígena
Com 54 anos, Urutau é uma das principais lideranças do grupo que estava no antigo Museu do Índio. Presidente do Centro de Etnoconhecimento Socioambiental Cauieré (Cesac), ele foi um dos primeiros a ocupar o prédio, em 2006. Ele tinha chegado ao Rio anos antes para estudar, vindo da aldeia Lagoa Comprida, próximo à Barra do Corda, no Maranhão. Formado em pedagogia numa instituição privada, pós-graduado em educação indígena pela UFF, em línguas indígenas pela UFRJ e mestre em linguística (línguas indígenas) pela UFRJ, ele se tornou professor no Instituto Superior de Educação do Rio (Iserj). Já na ocupação do Maracanã, foi um dos mentores do projeto de uma universidade indígena no local. Na segunda-feira, quando o Batalhão de Choque da PM iniciou a desocupação do prédio, não hesitou em se refugiar na árvore.
- Só pensava na defesa daquele patrimônio. Via (o protesto) como uma ação direta para manter os indígenas na Aldeia. A saída, digamos, foi por livre e espontânea pressão - disse Urutau, casado com a indígena Potira Cricati e pai de três filhos, que também moravam com ele no prédio do Maracanã.
Durante a retirada, o momento de maior tensão aconteceu quando o primeiro bombeiro se aproximou. Com um gancho, o agente prendeu, pelas costas de Urutau, uma corda no cinto de segurança que o índio usava (entregue pelos bombeiros) para evitar quedas. A corda começou a ser puxada, mas o cinto continuava preso à árvore. Outra parte do equipamento quase o enforcou, deixando hematomas no pescoço de Urutau. Outros bombeiros o agarraram por baixo e o retiraram.
Em apoio à ocupação, manifestantes se reuniram com o reitor da Uerj, Ricardo Vieiralves de Castro, para discutir temas como a criação da universidade indígena. O grupo reivindicava ainda a participação de representantes da Aldeia Maracanã no evento Movimento Indígena, que aconteceria hoje na universidade. Mas, à noite, o reitor antecipou o início do recesso de final de ano da instituição e o evento foi transferido para o Teatro Gláucio Gil, em Copacabana.

O Globo, 18/12/2013, Rio, p. 22

http://oglobo.globo.com/rio/indio-que-ficou-26-horas-em-arvore-autuado-…

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