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Verde mais palido

O Globo, Panorama Político, p. 4
Autor: CRUVINEL, Tereza
21 de Mai de 2005

Verde mais pálido

Tereza Cruvinel

Numa semana de muitas notícias ruins, coube ainda ao governo fazer um desses anúncios de impacto negativo lá fora, o do aumento do desflorestamento. O PV, que já andava querendo cair fora, aproveitou o pretexto e deixou a base governista. "Faltou dizer claramente quem são os grandes vilões da história", diz o governador do Acre, Jorge Viana, do PT, apontando para seu colega de Mato Grosso, Blairo Maggi, do PPS.
Como era previsível, a notícia repicou nos jornais estrangeiros. O britânico "The Independent" publicou, ao lado de foto do governador de Mato Grosso: "O estupro da floresta tropical... E este é o homem por trás disso".
Os 26.130 quilômetros quadrados desmatados em 2004 representam um aumento de 6,23% em relação ao acumulado. Mas dos oito estados monitorados, todos apresentaram redução de área desmatada, ficando o crescimento por conta apenas de Rondônia e Mato Grosso, este responsável por 47% do total. Houve redução de 39% no Amazonas e de 18% no Acre, por exemplo.
- O que está ocorrendo em Mato Grosso é uma insanidade. Lá, há uma política institucional de expansão da fronteira agrícola para as áreas de floresta. O governador deve uma satisfação ao Brasil - diz Jorge Viana, que sai em defesa da ministra Marina Silva e critica a área econômica do governo pelo contingenciamento de recursos do Ministério do Meio Ambiente.
- Apesar desta selvageria localizada, nosso governo destinou 7 milhões de hectares a unidades de conservação, 20% de toda a área tornada intocável até hoje no país. Mas o ministério precisa ter mais instrumentos de fiscalização e infelizmente foi jogado na vala comum, ao ter recursos cortados. Isso também é um equívoco: ajuste fiscal às custas do meio ambiente é prejuízo.
Ao longo de sua História, diz o governador do Acre, o Brasil plantou 5 milhões de hectares de florestas. Neste ritmo, a cada dois anos destruímos a mesma área em florestas nativas. A China, diz ele, está chegando aos 50 milhões de hectares de florestas plantadas.
Por fim, Viana critica o PV pelo rompimento com o governo, comparando os números do atual governo com os do governo passado, em que o ministro era o Sarney Filho, do PV.
- Em 2002, o desmatamento cresceu 26%, e com crescimento econômico pífio. Em 2003, caiu para 6% e agora este índice se repete, mas a economia cresceu mais de 5% em 2004. A meu ver, eles cometem um erro. Marina gosta de dizer que verdes não têm causa, a causa é que os tem. Permanecer na causa seria continuar somando forças com ela para melhorar o quadro - diz Viana.
O deputado eco-petista Carlos Minc também lamenta a saída :
- Isso vai enfraquecer o campo ecológico dentro do PT e do governo. Logo, quem perde é a luta ecológica no pais.
Ele está propondo ao governo um "choque verde", que incluiria condicionalidades ambientais para o repasse de recursos aos municípios, incentivos do BNDES às empresas que usem tecnologia limpa e o programa Recicla Brasil contra a cultura do desperdício.
O monstro no espelho
O "conjunto da obra" dá a impressão de que corre um mar de lama no país. Além do flagrante de corrupção nos Correios, os Garotinho foram declarados inelegíveis, prefeitos de Alagoas foram presos e o governador de Rondônia apresentou uma fita em que deputados estaduais tentam achacá-lo. Além de estar sendo investigado por Polícia Federal e CGU, o primeiro caso pode vir a ser objeto de uma CPI. Os outros, são fruto do combate à corrupção, não sinais de impunidade.
Nos últimos dois anos a Polícia Federal fez dezenas de operações exitosas de combate à corrupção, desbaratou quadrilhas, prendeu gente graúda; o DRCI, do Ministério da Justiça, começa a recuperar os recursos obtidos ilicitamente depositados lá fora. Nem por isso, segundo o ministro Márcio Thomaz Bastos, a percepção popular é a de que a corrupção vem sendo combatida. A cada anúncio de uma operação vitoriosa, cresce a sensação de que a a corrupção aumenta, embora seja o contrário. É difícil lidar com o monstro.
Mas o caso dos Correios é especial porque, atingindo um membro do Congresso, acionou o alarme da Casa sobre a necessidade de preservar a imagem do Legislativa, neste ano que antecede as eleições para renovação dos mandatos. E, atingindo o governo de um presidente que disputará a reeleição, encontrou-o em seu pior momento em matéria de sustentação parlamentar, e a oposição ávida por um tanque de guerra.
O governo ainda batalha para evitar a CPI. Mas ao fazê-lo, pode reforçar o efeito colateral apontado pelo ministro da Justiça: a de que deve e teme. Há quem ache que o governo ganharia mais enfrentando-a.
O que a imprensa argentina mais destacou na condecoração do chanceler Rafael Bielsa com a Ordem do Cruzeiro do Sul, a mais alta comenda brasileira, foi o fato de já ter sido concedida a outro argentino, Ernesto Che Guevara. Se a lembrança foi para o bem ou para o mal, não ficou claro.
Em Agosto de 2002, o cientista político José Luiz Fiori recomendava: "Os analistas devem refazer seus conceitos e começar a se habituar com a nova realidade política do país, pois a era Lula será inevitavelmente um tempo de fortes trepidações, e seu governo um espaço permanente de divergências, conflitos e negociações. Uma verdadeira guerra de posições, e também um complexo jogo de xadrez". Acertou em cheio, embora não tenha apontado este gosto do PT pela trepidação.

O Globo, 21/05/2005, Panorama Político, p. 4

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