VOLTAR

Vale investe US$ 3 bi para ser gigante do cobre

O Globo, Economia, p.46
30 de Nov de 2003

Vale investe US$ 3 bi para ser gigante do cobre
Empresa inicia em 2004 produção de sua 1ª. mina, com meta de extrair 700 mil toneladas do mineral em 4 anos
Gilberto Scofield Jr.
Parauapebas (PA). Em abril de 2004, no município paraense de Canaã dos Carajás, dentro da chamada Província Mineral de Carajás - onde fica a maior mina de minério de ferro a céu aberto do mundo, no meio da floresta tropical da Amazônia Vale do Rio Doce começa a extrair cobre da mina de Sossego. Para essa primeira etapa, os números parecem modestos. Foram investidos US$ 400 milhões para que a mina produza, ano que vem, cerca de 80 mil toneladas de cobre. Mas estes números aparentemente tímidos escondem planos ambiciosos: com previsão de investimentos de US$ 3 bilhões até 2008, a Vale quer estar entre as cinco maiores produtoras de cobre do mundo, com uma extração anual de 700 milhões de toneladas do mineral.
As maiores produtoras de cobre do mundo são a chilena Codelco (1,7 milhão de toneladas/ano), a australiana BHP (992 mil), a americana Phelps Dodge (991 mil), a anglo australiana Rio Tinto (802 mil) e a inglesa Anglo American (664 mil). Em 2008, quando os cinco projetos de cobre da Vale - Sossego, Mina 118, Alemão, Salobo e Cristalino - estiverem produzindo a plena capacidade, serão extraídos do solo cerca de 700 mil toneladas do mineral. Juntos, os projetos somam 1,524 bilhão de toneladas de reservas que podem ser exploradas por cem anos.
- E um novo Carajás do cobre - resume Marcelo Bastos, diretor do Departamento de Operações Não-Ferrosos de Carajás. Ele se refere à magnitude da mina de minério de ferro de Carajás, gigante de 17,2 bilhões de toneladas de reservas capazes de ser exploradas por 400 anos.
País consome 200 mil toneladas de cobre por ano
As 80 mil toneladas que a mina de Sossego produzirá ano que vem ganham novo colorido se comparadas ao consumo e produção de cobre no Brasil hoje. 0 país consome 200 mil toneladas de cobre por ano, 37% dos quais pela indústria de construção e 26% pelo setor de eletrônicos. O único produtor atual de cobre no Brasil é a Caraíba Mineração, controlada por empresas baianas, que faz 30 mil toneladas por ano e cujas reservas, segundo Bastos, devem durar até 2006.
As outras 170 mil toneladas/ano de que o país precisa são importadas pela Caraíba Metais (pertencente a um grupo de fundos de pensão), do Peru e do Chile, principalmente. Quando a mina de Sossego estiver operando em capacidade total, em dois anos, a produção anual vai atingir 150 mil toneladas.
- Com a entrada em operação das outras minas, o país deixará de ser importador de cobre para ser exportador. E ainda diversificamos os negócios da Vale, melhorando o perfil da empresa - diz Bastos.
Para se ter uma idéia da importância dos projetos de cobre para a Vale, basta notar que os US$ 3 bilhões a serem investidos até 2008 representam 50% do total dos investimentos da Vale no período.
Ao contrário do projeto de minério de ferro, iniciado em 1985, o projeto de cobre não pretende importar mão-deobra especializada dos grandes centros ou construir uma vila especial para empregados. Cerca de cem casas serão construídas no município de Canaã dos Carajás, que tem hoje 20 mil habitantes. Serão criados 11 mil empregos. Os profissionais virão de cursos especialmente montados pela Vale em parceria com a Universidade Federal do Pará.
O repórter viajou a convite da Vale do Rio Doce

Solidão na cidade de sonho de Carajás
Adolescentes vivem o dilema de ter que abandonar as famílias para estudar nos grandes centros
Parauapebas (PA) Os cerca de 5.500 moradores do chamado Núcleo Urbano de Carajás - a cidade montada pela Vale do Rio Doce em 1985 para abrigar seus funcionários no coração da floresta, na Serra de Carajás - vivem hoje talvez o seu primeiro grande dilema. Dezoito anos depois de fundada, as famílias de Carajás encaram uma nova geração de adolescentes numa idade em que o curso superior está mais longe do que os 20 quilômetros que separam o núcleo do município do qual faz parte: Parauapebas.
Lá, há uma unidade da Universidade Federal do Pará, mas os jovens querem mesmo é ampliar os horizontes dos 308 hectares do núcleo urbano, seu único cineteatro, seu clube desportivo e a pracinha, conhecida como "Feirinha", com sua meia dúzia de restaurantes.
Observe-se, por exemplo, o caso do supervisor técnico da área de moagem da Vale, Massilon Borges, 42 anos, e seus filhos Michele, 15 anos, e Lucas, 16 anos. Michéle já decidiu que pretende cursar comunicação, de preferência numa universidade em uma grande cidade do Sul. Lucas, por sua vez, pretende fazer engenharia no Instituto Tecnológico da Aeronáutica (ITA), em São José dos Campos. Em ambos os casos, longe dos olhos protetores de Massilon.
- É claro que a gente tem muito medo do que vai acontecer com eles. Afinal, foram criados aqui, um lugar quase perfeito, em harmonia com a natureza, em meio a pessoas educadas e bondosas. E o mundo lá fora é bem diferente disso , né? - pergunta-se Massilon.
Quando o analista operacional Fernando Gonçalves e sua mulher, a técnica da área de não-ferrosos Rosana de Lima, decidiram casar em Carajás e ter o filho Fernando Lima Gonçalves, foram duas as razões: a possibilidade de crescimento profissional na mineradora e o ambiente ideal para educar Fernando Júnior, como é chamado.
- Acho que até os 13, 14 anos, o ambiente do núcleo (como a cidade é chamada) é o melhor que existe para se criar um filho. Depois, não sei. Depende dele - diz Gonçalves.
Por ambiente ideal entenda-se uma cidade com padrão de vida de Primeiro Mundo. Cercada pela floresta amazônica, mas protegida por uma cerca de arame de sete metros (um metro abaixo do solo) desde que uma sussuarana atacou uma criança, há anos, o núcleo urbano é um oásis de silêncio, segurança e tranqüilidade. Possui 1.320 casas de dois, três e quatro quartos pelas quais os funcionários pagam de R$ 16 mensais (por uma casa de 68 metros quadrados com dois quartos) a R$ 100 (por unidades entre 180 e 200 metros quadrados e três quartos).
Mas tanta segurança e isolamento pode trazer desconforto para muita gente. Sócrates Gadelha, funcionário da farmácia Norte Carajás Medicamentos, diz que 20% dos produtos vendidos por dia são de antidepressivos, seguido de preservativos.
- No fim do ano, com a distância dos parentes, o consumo de antidepressivos cresce - diz ele.
Entre os jovens, o sentimento tende a certo incomodo. Na quarta-feira à noite, um grupo de jovens entre 10 e 16 anos se reunia no meio de uma das ruas do núcleo. Eles reclamavam que, no sábado, foram perseguidos por agentes de segurança porque, segundo eles, "estavam fazendo muito barulho nas ruas".
- Aqui não tem muita opção, né? - dizia um deles. No núcleo, não se pode ter cães, gatos ou pássaros, pelo temor que os bichos domésticos levem doenças aos animais da selva que vivem ao redor, como cotias e macacos.

O Globo, 30/11/2003, p. 46

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.