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Usina poe mata em risco

JB, Pais, p.A7
27 de Fev de 2005

Usina põe mata em risco
Obra para construir barragem no Sul do país pode acabar com uma das últimas florestas nativas de araucária do planeta

Hugo Marques

A Polícia Federal começou a investigar a construção da hidrelétrica de Barra Grande, na divisa de Santa Cataria com o Rio Grande do Sul. Serão chamados para depor funcionários do Ibama e donos de empresas de obras públicas. O local da barragem, que já começou a ser desmatado para a inundação do lago, abriga uma das últimas florestas nativas de araucária no planeta.
A usina de Barra Grande é a maior em construção no país. Trata-se de um paredão de concreto de 180 metros de altura, no Rio Pelotas. O lago que será formado na área, de 93 quilômetros quadrados, vai inundar áreas de Mata Atlântica nos municípios de Anita Garibaldi, Cerro Negro, Campo Belo do Sul, Capão Alto e Lages, em Santa Catarina, e Pinhal da Serra, Esmeralda, Vacaria e Bom Jesus, no Rio Grande do Sul.
Histórico levantado pelas organizações ambientais mostra que a concessão de uso da região foi outorgada em abril de 2001 ao Consórcio Grupo de Empresas Associadas Barra Grande (Geab). Em novembro de 2002, a Agência Nacional de Energia Elétrica (Aneel) autorizou a transferência da participação para a Baesa Energética Barra Grande, cujos acionistas são as empresas Alcoa Alumínio, Barra Grande Energia, Companhia Brasileira de Alumínio, Camargo Correa Cimentos e DME Energética.
A construção da usina prejudicou o patrimônio ambiental brasileiro. Um estudo de impacto ambiental da obra dizia que a área diretamente afetada era em sua maior parte constituída de ''pequenas culturas'', ''capoeiras ciliares baixas'' e ''campos com arvoredos esparsos''. Segundo o Ibama, a empresa responsável pelo relatório de impacto ambiental é a Engevix.
A Rede de Organizações Não-Governamentais da Mata Atlântica e a Federação das Entidades Ecologistas de Santa Catarina impetraram recurso na Justiça contra o desmatamento da área da usina. No recurso, as organizações mostram estudos comprovando que mais de 70% da área a ser inundada é composta por florestas de ''alta significância ambiental''.
O coordenador de Licenciamento Ambiental do Ibama, Luiz Felippe Kunz, afirma que houve ''grande omissão'' do órgão no governo passado. Segundo ele, a nova administração do Ibama descobriu a fraude em 2003, quando recebeu inventário sobre corte de árvores na área da usina.
O Ibama já instaurou sindicância para apurar responsabilidades e deverá punir 5 servidores envolvidos na aprovação do processo envolvendo a construção da Hidrelétrica de Barra Grande, durante o governo de Fernando Henrique Cardoso.
Kunz afirma que a nova administração se vê diante de um fato consumado. O desmatamento da floresta de araucária é necessário para limpar a área do lago. Mais de 2 mil hectares de Mata Atlântica, composta principalmente de florestas de araucárias, serão cortados. Outros 2 mil hectares de vegetação secundária em estágio avançado de regeneração, de riquíssima biodiversidade, também serão arrancados. O paredão da hidrelétrica, de 180 metros de altura por 670 metros de extensão, está pronto no meio da floresta, aguardando a queda das árvores.
- A demolição ia causar um dano ambiental - afirma Kunz.
A região a ser alagada abriga, além de árvores de 500 anos, 261 espécies de mamíferos, sendo 73 delas endêmicas, ou seja, não existem em nenhum outro ecossistema do planeta. Tem ainda 620 espécies de pássaros (160 endêmicas) e aproximadamente 20 mil espécies de plantas, segundo levantamentos das organizações ambientais.
Dentro do próprio governo, autoridades acreditam que a ministra do Meio Ambiente, Marina Silva, perdeu mais uma batalha contra o capital. Marina teve de aceitar os transgênicos e a soja da Monsanto e está perdendo a batalha na Lei de Biossegurança. O presidente do Ibama já na atual gestão, Marcus Barros, assinou dia 15 de setembro uma ''Autorização de Supressão de Vegetação'' para a Baesa cortar a floresta de araucária.
Luiz Felippe Kunz afirma que não existe batalha política envolvendo a derrubada da floresta. Ele explica que houve um grande acordo entre governo e Ministério Público, que concordaram e assinar o chamado ''termo de compromisso'', para tentar apaziguar o irreversível estrago ambiental.
A PF, no entanto, pretende responsabilizar todos os empresários e os servidores públicos envolvidos na fraude da construção da hidrelétrica. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva prometeu que este será o ano de combate aos crimes ambientais. A construção da Hidrelétrica de Barra Grande é sem dúvida o maior crime ambiental que se tem notícia contra a Mata Atlântica.

JB, 27/02/2005, p.A7

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