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Usamos GPS para trabalhar, estudar e conservar a floresta

O Globo, Especial, p. 9
Autor: SURUÍ, Almir
18 de Jun de 2012

'Usamos GPS para trabalhar, estudar e conservar a floresta'
Um dos parceiros do projeto é o governo de Rondônia, a quem os índios convenceram sobre o retorno econômico e ambiental que poderia trazer à região

Entrevista: Almir Suruí

Flávia Milhorance
flavia.milhorance@oglobo.com.br

RIO. Almir Suruí é o líder maior do povo indígena Paiter Suruí, que tem um trabalho inovador: um plano de gestão de 50 anos (2000-2050) com vistas ao desenvolvimento sustentável. Ela também foi uma das primeiras a criar um projeto de créditos de carbono: o Carbono Florestal Suruí, com validação internacional, à espera de investidores para ser aplicado. Além deste, há projetos de valorização da cultura, turismo, governança, fora os de preservação ambiental, como zoneamento agrícola.

O GLOBO: Como é o trabalho da aldeia suruí rumo à sustentabilidade em Rondônia?

ALMIR SURUÍ: O povo suruí tem um plano de 50 anos que visualiza o médio e longo prazos de sustentabilidade do seu território. Na área do meio ambiente, temos projeto de reflorestamento, do carbono suruí. Trabalhamos com uma visão de futuro e de como isso pode gerar o fortalecimento da economia, verde e mais sustentável.

Como é a relação da aldeia com o estado?

SURUÍ: O governador de Rondônia (Confúcio Moura/PMDB), hoje, é um dos nossos parceiros. Foi uma luta, mas acho que construção é isso. É uma conquista para o nosso povo. Conseguimos que o governo do estado entendesse o processo e qual o retorno econômico e ambiental que ele pode trazer para o próprio estado a fim de garantir uma visão de médio e longo prazos de sustentabilidade. Buscamos parcerias para fazer isso acontecer.

Que exemplos de ações são desenvolvidos na aldeia?

SURUÍ: Temos o plano de turismo, de negócios de café e banana, de artesanato e castanha. Trabalhamos com o estudo de viabilidade econômica. Não queremos desenvolver nosso território de qualquer jeito. Queremos desenvolvê-lo a partir do potencial que pode gerar, e como isso pode ser oferecido à população.

O que foi preciso para chegar nesse estágio? Como foi possível estruturar o projeto?

SURUÍ: Primeiro, é respeitar as políticas públicas. Segundo, tivemos que fazer o diagnóstico do território: verificar, estudar problemas como o desmatamento e as doenças, e de que maneira podemos buscar solução para isso a partir da implementação das políticas públicas, baseado também na questão jurídica, que é uma ferramenta importante para nós. E hoje temos uma grande aliança com o conhecimento tecnológico.

De que forma?

SURUÍ: Nós utilizamos muito o computador, o GPS para trabalhar, estudar a viabilidade de potenciais e de conservação de floresta.

O projeto tem apoio financeiro de instituições, do setor privado ou público? Como isso é viabilizado?

SURUÍ: Hoje temos apoio de fundações, da Agência dos Estados Unidos para o Desenvolvimento Internacional (USAID, na sigla em inglês) e estamos começando a dialogar com o setor privado. Aproveito e já chamo aqueles que querem trabalhar com o povo suruí na visão de economia mais verde. Que venham procurar a gente para que possamos criar um modelo de sustentabilidade do território.

Trata-se de um modelo inovador, certo?

SURUÍ: Para o Brasil sim, até porque a opinião da maioria das pessoas é que território indígena não tem desenvolvimento, não tem resultado econômico. Mas, hoje, estamos mostrando que isso é possível sim. Temos um planejamento, por exemplo, que pode captar, talvez, até US$ 4 milhões por ano, quase R$ 10 milhões. E nosso povo, inclusive, já decidiu que 10% desse recurso terá que ser gasto fora do território não indígena.

Por quê?

SURUÍ: Porque a gente tem que conscientizar as pessoas e também queremos gerar emprego e renda para a região. Queremos contribuir para nosso estado, para o nosso país, e, em especial, para a nossa região. Vimos a necessidade do povo que vive ao redor do nosso território. Então, isso é o mínimo que a gente pode fazer por respeito a essas pessoas.

Descreva-me um pouco da cultura e da relação da aldeia com a sociedade fora dela.

SURUÍ: Só temos 42 anos de contato, por isso ainda falo muito mal português, mas não tenho vergonha disso. Tenho minha própria língua, a do meu povo. A gente ainda utiliza muito a nossa cultura, nossos rituais. Por exemplo, vou sempre com meu cocar fazer palestra. Aonde vou uso o meu cocar. Também o utilizo nos rituais. Vejo que cultura também tem de ser valorizada, porque isso é a raiz do nosso povo. Também queremos contribuir para a valorização da nossa cultura por meio das políticas públicas e com nossos governos.

O povo pater suruí

Os índios da tribo de Almir Suruí, do povo pater suruí, vivem na Terra Indígena Sete de Setembro, localizada entre os municípios de Cacoal e Espigão D'Oeste, em Rondônia, que avança até o município de Rondolândia, no vizinho Mato Grosso. A terra tem área aproximada de 248 mil hectares e população de cerca de 1.350 habitantes. A população, que era de cinco mil pessoas, chegou a ter 250. A língua é o tupi monde.

O Globo, 18/06/2012, Especial, p. 9

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