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Uma solução para a Amazônia

Revista Época - http://revistaepoca.globo.com
Autor: Aline Ribeiro
20 de Mar de 2010

Para romper esse ciclo destruidor, a cidade fez um pacto. A proposta surgiu do prefeito Adnan Demachkic (PSDB-PA). No início de 2008, tão logo recebeu a notícia de Brasília de que Paragominas integrava a lista suja, convocou os moradores para uma conversa franca e dura. Negociador, ele explicou aos presentes que as regras do jogo haviam mudado. A reunião durou três horas e meia. O resultado foi um pacto assinado por 51 entidades de classe, representantes de pecuaristas e madeireiras, além dos vereadores da Câmara. Pelos termos, a intenção era tornar-se um município verde, com desmatamento zero. "Não baixei um decreto goela abaixo da população. Propus que fizéssemos juntos", diz Demachkic. "É por isso que está dando certo." Em seu segundo mandato, o prefeito, nascido e criado na cidade, tem uma popularidade incomum. Foi reeleito com 84% dos votos, o segundo maior índice das últimas eleições.

A mudança exigiu esforço coletivo. Uma das exigências para sair da lista das campeãs do desmatamento era ter ao menos 80% das terras do município com um documento que comprova a localização e os limites das fazendas, suas Áreas de Proteção Permanente (APPs) e a reserva legal exigidas no Código Florestal. (Esse documento é chamado Cadastro Ambiental Rural, ou CAR.) Até novembro do ano passado, menos de um quarto da área total de Paragominas estava no CAR. Desinformados, os produtores rurais tinham medo de ficar expostos e de ser punidos por não estar em dia com as obrigações ambientais. Quem os convenceu foi Mauro Lúcio de Castro Costa, presidente do Sindicato dos Produtores Rurais. Costa tem uma gleba de 4.500 hectares na região e cria suas reses em 20% do espaço total. Está dentro da lei. Diz que já foi chamado de louco pela própria família por não derrubar toda a mata no terreno. Pela lógica local, não fazia sentido ocupar só um pequeno pedaço da fazenda. De acordo com os proprietários rurais da Amazônia, é como comprar uma casa de cinco quartos e usar apenas um. Mas é a lei. Para persuadir outros fazendeiros, Costa trouxe o procurador do Ministério Público de Belém e um representante da Secretaria de Meio Ambiente para jurar, diante dos fazendeiros, que ninguém seria punido imediatamente. Em quatro meses, conseguiu que a adesão fosse de 100 para mais de 400 produtores no município. "Tive de pegar alguns a laço", diz. Na semana passada, Paragominas atingiu a taxa de 83,7% do território registrado no CAR, um índice alto em qualquer região do país.
O desmatamento em Paragominas caiu 43% em 2008 e 86% no ano passado

A iniciativa contou com o apoio de algumas organizações. O Imazon fez em Paragominas algo inédito para a Amazônia. Passou a monitorar via satélite, mês a mês, o desmatamento no município. Até então, isso nunca havia sido feito em curtos períodos de tempo para uma única cidade. Com os dados em mãos, era mais fácil para os órgãos fiscalizadores chegarem aos criminosos e puni-los. "Não basta simplesmente se comprometer a não desmatar", afirma Paulo Amaral, pesquisador do Imazon. "É preciso haver ações para monitorar e atribuir responsabilidades." Para ajudar os fazendeiros pegos pela fiscalização a recuperar a floresta, a ONG The Nature Conservancy (TNC) Brasil fez um mapa detalhado de Paragominas. "Primeiro, identificamos o problema. Agora, vamos começar a solucioná-lo", diz José Benito Guerrero, coordenador do Programa Terras Privadas da TNC Brasil. Restam 54% de mata intacta no município. Pela lei, deveria haver pelo menos 80%. O desafio agora é recompor a floresta.

A cidade terá de reinventar a fórmula tradicional de desenvolvimento da região, baseada na exploração dos recursos até a exaustão. "Paragominas está vivendo uma virada econômica", afirma Tasso Azevedo, consultor do Ministério do Meio Ambiente. "Vai deixar de ser uma região que funciona basicamente com crédito e políticas de incentivo para atrair e conviver com investimentos de risco privado." A intenção dele é criar plano de negócios para a cidade. Um dos caminhos é diversificar o sistema de produção. Integrar pecuária, agricultura e floresta. A experiência com a madeira mostrou que ficar refém de um único produto pode se revelar uma armadilha.
Rogério Cassimiro

Outra opção é intensificar a produtividade das práticas agropecuárias existentes e elevá-la a um patamar mais responsável. O mais promissor, segundo Azevedo, é inchar o setor florestal. A rentabilidade de 1 hectare de paricá plantado, uma árvore nativa, chega a ser o triplo da obtida com cultura de grãos e o quíntuplo da gerada pela criação de gado.

O empreendedor Vander Gomes conseguiu enxergar isso. Há cinco anos, saiu de sua cidade natal, em Santa Catarina, para vender máquinas agrícolas na região de Paragominas. Vislumbrou um futuro mercado de mudas e convenceu a Viveiro Dacko, uma empresa do Rio Grande do Sul, a abrir filial no Pará. O investimento, de R$ 300 mil, deverá se pagar em quatro anos. Ainda em 2010, a produção de Gomes deverá passar de 1,3 milhão de mudas nativas plantadas para 5 milhões. "A gente ainda não tem noção do tamanho desse mercado", diz.

Com 6 milhões de hectares plantados, o Brasil produz hoje 120 milhões de metros cúbicos de madeira - o equivalente a 3% do mercado mundial. Em comparação, a Rússia, maior área florestal do mundo, tem 100 milhões de hectares. Em Paragominas, um setor moveleiro recém-instalado deverá absorver a produção de toras e gerar emprego. A Floraplac vai abrir lá uma fábrica de placas de fibra de madeira, ou MDF, matéria-prima básica para móveis e construção civil. Será a primeira no Norte e Nordeste do país. O município atraiu ainda uma companhia que testa novas formas de enriquecer a mata com o plantio de árvores nativas. No futuro, a ideia é usar o manejo nas áreas para gerar receita. A região poderá virar um laboratório de florestas.
Restam 54% da floresta em Paragominas. O desafio agora é recuperar parte dela

Ainda é cedo para saber se os fazendeiros continuarão cumprindo seus compromissos ambientais. Mas o que o município já conseguiu merece um reconhecimento do mercado, afirma o prefeito Demachkic. Ele estuda, com seus parceiros, criar um selo de origem para certificar os produtos vindos de Paragominas. A origem, que já foi motivo de restrição, poderia virar um incentivo no momento da venda. Na outra ponta, o governo federal pretende criar uma lista positiva dos municípios que despontam rumo à economia sustentável. Eles receberiam incentivos como maior acesso ao crédito e prioridade na regularização fundiária das terras. "É possível ter uma alternativa legal, não criminosa e não predatória", afirma Carlos Minc, ministro do Meio Ambiente. "Com o exemplo de Paragominas, o objetivo é mostrar o caminho."

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