OESP, Economia, p. B8
Autor: KRUGMAN, Paul
02 de Mai de 2009
Uma salvação acessível
Paul Krugman*
The New York Times
A eleição de 2008 pôs um fim ao reinado da ciência espúria na capital do nosso país, e as chances de uma ação significativa no campo das mudanças climáticas, provavelmente com a implantação de um sistema de limite e comércio de emissões (cap and trade) aumentaram enormemente.
Mas os que se opõem a uma ação desse tipo alegam que limitar as emissões pode ter efeitos devastadores para a economia americana.
Portanto, é importante compreender que, do mesmo modo que as negações de ocorrência de mudanças no clima são uma ciência espúria, as previsões de desastres econômicos, se tentarmos fazer alguma coisa, também podem ser chamadas de teses econômicas espúrias.
É verdade que esses limites de emissões implicam um custo. Como economista de carteirinha, me envergonho quando entusiastas da "economia verde" insistem em que proteger o meio ambiente só vai produzir benefícios e nenhum sofrimento.
As melhores estimativas disponíveis sugerem que os custos de um programa para limitar as emissões de gases tóxicos seriam modestos, se implementados gradativamente. E que, se nos comprometermos hoje com o programa, estaremos, na verdade, ajudando a economia se recuperar desta crise. Vamos tratar, primeiro, dos custos. Um sistema "cap and trade" de créditos de carbono deve elevar os preços de qualquer coisa que, direta ou indiretamente, conduza à queima de combustíveis fósseis. A energia elétrica, em particular, ficará mais cara, porque as usinas movidas a carvão consomem muita energia.
As concessionárias elétricas conseguiriam diminuir suas necessidades de compra de permissões limitando suas emissões de dióxido de carbono - e a grande questão do sistema "cap and trade", naturalmente, é oferecer a elas um incentivo para isso.
Mas as medidas que adotariam para limitar as emissões, como recorrerem a outras fontes de energia, ou capturar e sequestrar a grande parte do dióxido de carbono que emitem, sem dúvida, elevarão os seus gastos.
Se essas permissões de emissões forem leiloadas - como deverão ser -, a receita obtida poderá ser usada para oferecer descontos para consumidores ou reduzir outros impostos, compensando em parte a elevação dos preços da energia. Mas essa compensação não estaria completa. Os consumidores acabariam ficando mais pobres do que se inexistisse uma política para, o problema da mudança climática.
Mas o quanto mais pobres ficarão? Não muito, segundo pesquisadores prudentes, como os da Agência de Proteção Ambiental ou o Grupo de Análises Políticas e Previsão de Emissões do MIT, o Instituto de Tecnologia de Massachusetts.
Mesmo se forem impostos limites rígidos, diz o grupo do MIT, os americanos consumirão apenas 2% menos de energia em 2050 no caso de tais limites não existirem.
E ainda haveria espaço para uma grande melhora no padrão de vida, pois reduziria somente um vigésimo de ponto porcentual da taxa de crescimento anual. Claro que há muita gente insistindo em que os custos serão muito maiores.
O que é estranho, porém, é que tais alegações quase sempre partem daqueles que dizem acreditar que as economias de livre mercado são maravilhosamente flexíveis e inovadoras e podem facilmente superar quaisquer restrições impostas por uma limitação de recursos no mundo , seja do óleo cru, de terra cultivável ou de água potável.
Então, por que elas não acham que a economia consegue administrar esses limites sobre as emissões de gases com efeito estufa? Com base no sistema de "cap and trade", os direitos de emissão seriam apenas mais um recurso escasso, nada diferente, em termos econômicos, da oferta de terra cultivável.
Desnecessário dizer que pessoas como Newt Gingrich, que afirmam que um sistema limitando as emissões "vai punir o povo americano" não estão pensando bem assim. O que elas pensam, na verdade, é que "o capitalismo é bom e o governo é ruim". Mas, se você acredita de fato na mágica do mercado, deve também acreditar que a economia conseguirá lidar muito bem com esses limites de emissões.
Portanto, podemos permitir ter uma vigorosa política no campo das mudanças climáticas. E, se nos comprometermos com ela, isso, na verdade, pode nos ajudar nas nossas atuais dificuldades econômicas.
No momento, o maior problema enfrentado pela nossa economia é a queda expressiva nos investimentos por parte das empresas. Elas não estão vendo nenhuma razão para investir, diante do excesso de capacidade, resultado da retração do mercado imobiliário e uma escassa demanda do consumidor.
Mas suponhamos que o Congresso determinasse um maior endurecimento dos limites das emissões dentro de dois ou três anos. A medida não influiria imediatamente nos preços. No entanto, criaria fortes incentivos para novos investimentos - em usinas elétricas de baixas emissões, em fábricas eficientes em matéria de economia de energia e outros.
Ou seja, a redução dos gases causadores do efeito estufa produziria, a curto prazo, os mesmos efeitos econômicos de uma importante inovação tecnológica: daria às empresas um motivo para investir em novos equipamentos e instalações, apesar da capacidade excedente. E, considerando a atual situação da economia, é exatamente isso que o médico recomendou.
Este impulso econômico a curto prazo não é a principal razão para que sejam dados novos passos numa política relativa às mudanças climáticas. O importante é que o planeta está em perigo, e quanto mais esperarmos, mais o perigo se agravará. E este é mais um motivo para agirmos com rapidez.
Podemos então salvar o planeta? Sim, nós podemos. E este é o momento perfeito para começar.
*O autor é Prêmio Nobel de Economia
OESP, 02/05/2009, Economia, p. B8
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