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Uma nova estratégia para as finanças sustentáveis

Valor Econômico, Opinião, p. A12
Autor: AMARAL, Luiz Fernando do
29 de Abr de 2016

Uma nova estratégia para as finanças sustentáveis

Luiz Fernando do Amaral

O setor financeiro será central para o desenvolvimento sustentável no mundo. Essa é uma afirmação constante em qualquer fórum que aborde o assunto. Em geral, a discussão se concentra na ideia de financiamentos subsidiados para tecnologias que promovam a sustentabilidade. Em outras palavras, uma linha de crédito especial concedida para um tipo de investimento específico.
Essa é, sem dúvida, uma estratégia importante e programas como o Plano Agricultura de Baixo Carbono têm atuado nessa direção. Porém, novos paradigmas serão necessários para que finanças sustentáveis sejam um dos principais canalizadores para uma economia verde. O uso das linhas de financiamento mais comuns ao dia a dia dos agentes econômicos é uma dessas estratégias. Focar em quem já fez a lição de casa, ao invés de quem ainda precisa fazê-la, é outra.
Há algum tempo escrevi que usar crédito subsidiado como forma de promoção de investimentos socioambientais já não era suficiente. Ao contrário, parte de recursos de fundos de desenvolvimento poderiam ser direcionados para mitigar riscos de crédito em investimentos de bancos privados. Assim, os recursos de desenvolvimento poderiam ser alavancados com capital privado, gerando muito mais impacto. Uma maneira mais inteligente de usar recursos escassos em tempos de crise.
De fato, a discussão sobre essa estratégia avançou bastante nos meios especializados. Bancos internacionais de desenvolvimento e entidades filantrópicas que podiam doar dinheiro para projetos sem qualquer retorno estão considerando seguir esse caminho. Agora, trago novos argumentos para complementar as quebras de paradigma para promoção de finanças para a sustentabilidade.
Os mecanismos de finanças sustentáveis sempre são voltados para investimentos específicos. Por exemplo, uma linha para melhorar a eficiência energética e reduzir emissões de carbono ou outra para recuperar matas ciliares e promover a biodiversidade. Ou seja, não estão necessariamente ligados ao dia a dia dos agentes ou a suas atividades mais comuns.
Assim, uma estratégia alternativa seria a incorporação de diferenciais socioambientais em produtos financeiros mais rotineiros. Por exemplo, o crédito rural é uma das ferramentas mais importantes na promoção e financiamento da agricultura brasileira. O dinheiro, grande parte das vezes, não é direcionado para investimentos diferenciados, mas sim para o simples custeio da safra, como compra de insumos, plantio e colheita. Ora, se algum diferencial fosse incorporado, por menor que fosse, na definição das condições do custeio rural, seu impacto nas decisões e no campo tenderia a ser muito maior do que qualquer programa de financiamento para uma ação específica. Por exemplo, se houvesse algum incentivo para quem recupera florestas, independentemente de se o recurso fosse usado para esse fim, é bem possível que o impacto seria muito maior, já que o assunto estaria na agenda de todo agente rural no país.
Em suma, nesse novo paradigma das finanças sustentáveis, o mais importante seria o fim e não os meios. O objetivo de desenvolvimento - como recuperação de passivos ambientais - poderia ser incluído no produto mais comum possível. Porém, não haveria a necessidade de "carimbar" o recurso para um investimento específico. Desde que a performance fosse atingida, o benefício seria obtido. Caberia exclusivamente aos atores individuais definir como atingi-lo, podendo usar para esse fim, inclusive, as linhas específicas de desenvolvimento já existentes. Assim, poderiam promover sinergias em que o uso de um produto básico, como custeio, seria também usado para promoção de um produto sofisticado, como uma "linha verde".
Por fim, há ainda uma última mudança de paradigma necessária nas finanças sustentáveis: beneficiar quem já fez o investimento em vez de quem precisa fazê-lo. Em outras palavras, reconhecer os líderes e incentivar quem está na frente. Por exemplo, beneficiar uma indústria que já possua grande parte de sua energia vinda de fontes renováveis ao invés de financiar a aquisição de painéis solares.
Sem dúvida, haverá questionamentos sobre o impacto dessa medida. Corretamente é possível argumentar que essa estratégia não traria benefícios adicionais pois não promoveria novos investimentos. É um argumento válido. Porém, é preciso olhar além do curto prazo. À medida que outros agentes notem essas diferenças, passarão a buscar as mesmas condições. Assim, cria-se uma competição saudável, permeando todos agentes de um segmento, que alavancaria investimentos adicionais em um nível ainda maior.
Não há bala de prata. A combinação de todas as estratégias é necessária para tirar a discussão sobre o desenvolvimento sustentável de fóruns específicos e levá-la para o centro das decisões financeiras de todos os tipos de agentes econômicos. Não basta apenas discutir jargões sofisticados - como "greenbonds" ou valoração de capital natural - em grupos altamente especializados no tema. Se conseguirmos fazer que CFOs de grandes a pequenas empresas e que produtores rurais profissionalizados ou familiares passem a considerar, ainda que minimamente, que a sustentabilidade pode fazer parte de sua estratégia financeira tradicional, o impacto sistêmico na economia será transformador.

Luiz Fernando do Amaral é chefe do departamento socioambiental do Rabobank.

Valor Econômico, 29/04/2016, Opinião, p. A12

http://www.valor.com.br/opiniao/4543317/uma-nova-estrategia-para-financ…

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