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Uma estrada vai parar no banco dos réus

O Globo, Rio, p. 18
02 de Jul de 2008

Uma estrada vai parar no banco dos réus
Justiça Federal processa por crime ambiental diretores, funcionária e a concessionária que administra a BR-040

Antonio Werneck

Dois diretores, uma funcionária e a Companhia de Concessão Rodoviária Juiz de Fora-Rio (Concer), que administra a BR-040 (Rio-Juiz de Fora), estão sendo processados criminalmente pela Justiça Federal, acusados de crimes ambientais. As investigações começaram há dois anos, período em que a Polícia Federal constatou e fotografou a morte por atropelamento de vários animais, inclusive uma jaguatirica, principalmente no trecho da estrada ligando a Reserva Biológica do Tinguá e a APA (Área de Proteção Ambiental) de Petrópolis.
Atropelamentos no trecho Caxias-Petrópolis
A empresa é acusada de não construir passagens para os animais cruzarem a pista com segurança e de também não ter apresentado o relatório de impacto ambiental, como está previsto no contrato de concessão entre o governo federal e a empresa. As mortes de animais são mais freqüentes no trecho entre os municípios de Petrópolis e Duque de Caxias.
- É primeira vez na história do país que a Justiça Federal aceita processar uma concessionária de uma estrada federal e seus diretores por danos ambientais. O processo e seus desdobramentos são de extrema importância para a fauna da Reserva Biológica e da APA de Petrópolis -- disse o delegado Alexandre Saraiva, da Delegacia de Repressão a Crimes contra o Meio Ambiente e o Patrimônio Histórico da PF do Rio.
Estão sendo processados os engenheiros Pedro Antônio Jonsson e Ricardo Salles de Oliveira, que são diretores da Concer; e Márcia Fragoso Soares, coordenadora ambiental da concessionária. Os três e a Concer são acusados de crimes ambientais previstos nos artigos 21, 40 e 68 da Lei 9.605/98: causar dano direto ou indireto às unidades de conservação e deixar, aquele que tiver o dever legal ou contratual de fazê-lo, de cumprir obrigação de relevante interesse ambiental. As penas somadas podem chegar a oito anos de prisão.
Em nota enviada ao GLOBO, a Concer informou que "é direito e dever do Ministério Público apurar todo e qualquer ato que entenda ser ilícito e a empresa está sempre disposta a colaborar com a Justiça". O texto afirma ainda que "o processo judicial referente ao atropelamento de animais silvestres ainda está em andamento e os representantes legais da empresa entendem não ser a denúncia procedente". A Concer observou ainda que "as fotos dos animais juntadas ao processo não comprovam inclusive que tais aves e mamíferos foram mortos na BR-040" e também afirma não poder "concordar que sejam determinadas as realizações de túneis, cercas etc. sem um embasamento técnico, pois às vezes a construção de um túnel e ou cercas podem ser meios fáceis para surtirem efeitos contrários ao almejado, como por exemplo transformarem os animais em presas fáceis".
Na mesma nota, assinada por Fabiene Lacerda, assessora de marketing e comunicação da empresa, a concessionária alega que está "em dia com seus relatórios ambientais junto à ANTT, possui parceria com o Ibama e a APA de Petrópolis e executa um projeto denominado Caminhos da Fauna, que visa, com sucesso, a favorecer a conservação das espécies da Mata Atlântica".
Segundo o relatório da PF encaminhado à Justiça Federal, assinado pelo delegado Alexandre Saraiva, "fica evidente a conduta omissa que deu ensejo ao descumprimento contratual. Mesmo reconhecendo a necessidade de preservação da fauna silvestre, seja durante a construção, conservação ou exploração da rodovia, a concessionária manteve-se inerte frente à morte de animais silvestres, vítimas de atropelamento".
A cada ano, 17 mil animais atropelados no país
Na denúncia enviada pelo MP Federal à Justiça, o procurador Carlos Bruno Ferreira da Silva observou que um estudo do Instituto Terra Nova registra que 17 mil animais morrem por ano no Brasil ao serem atropelados por carros, ônibus e caminhões, e que "o atropelamento da fauna silvestre é um fator de supressão negativa sobre a população de animais silvestres". Ainda segundo a denúncia do procurador, o projeto apresentado pela Concer "possui objetivos extremamente falhos no tocante a proteção à fauna que habita na Reserva Biológica do Tinguá e na APA de Petrópolis".
A Reserva Biológica do Tinguá é um santuário natural encravado na Baixada Fluminense, ao pé da serra. Em suas terras, pesquisadores identificaram cerca de 60 espécies de mamíferos, 300 de aves e 52 anfíbios, além de centenas de milhares de insetos. Nativas da reserva, a onça pintada, a anta e a jacutinga (ave preta de grande porte) são consideradas extintas por ação de caçadores.

O Globo, 02/07/2008, Rio, p. 18

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