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Um trabalho que não acaba

Museu Emílio Goeldi - www.museu-goeldi.br
Autor: Vanessa Brasil.
22 de Out de 2010

Para alguns, é anti-ética; para outros, é contra a natureza, mas para a pesquisa, a coleta de animais é necessária para o desenvolvimento do conhecimento científico, para a compreensão da vida natural. Assim pensa o ornitólogo - especialista em aves - do Museu Paraense Emílio Goeldi, Alexandre Aleixo. Segundo ele, algumas
vezes, para "reconstruir a origem e a evolução de uma determinada espécie não há outra maneira se não coletando-a como amostra para estudos".

A coleta deve ser um trabalho constante, segundo Aleixo, pois as técnicas de análise e estudo do material coletado vão se modificando e sendo aperfeiçoadas ao longo do tempo. "A Coleção Ornitológica do Museu Goeldi, por exemplo, em 1980 já era significativa, mas os dados ainda não eram completos e ainda não havia a coleta de tecidos", conta, se referindo à nova forma de coleta, armazenamento e pesquisa que se utiliza dos tecidos dos animais.

Hoje, a Coleção de Tecidos da instituição é a maior do Brasil. Mesmo assim, as coletas continuam, tanto para qualificar a Coleção, quanto para deixá-la mais completa. Por isso, "esse é um trabalho que nunca acaba", enfatiza o pesquisador, mas que ainda encontra muitosobstáculos principalmente no que diz respeito ao transporte de uma das suas ferramentas de trabalho: as armas de fogo.

Benefícios para a Ciência - O ganho de informação em decorrência dos estudos é enorme se comparado ao impacto causado pela coleta. De acordo com Alexandre Aleixo, do Museu Goeldi, o instrumento de coleta permite à pesquisa "gerar informação que contribuirá para a preservação da espécie e ajudar no trabalho de coibir
a degradação ambiental". No caso das espécies em extinção, por exemplo, Aleixo explica que as autorizações para a coleta são mais difíceis de se conseguir. Mas o grau de di f i culdade guarda uma coerência: "E quando isso acontece, é porque o benefício resultante da pesquisa com a espécie coletada será maior que o prejuízo geradopela retirada do indivíduo da natureza", explica.

Armas - As armas de fogo são utilizadas por ornitólogos como Aleixo para fazer a captura de aves que se encontram acima de 15 metros de altura. As armas são do tipo cano longo como as espingardas. É para o transporte dessas armas, no caso deles, ferramentas de trabalho, que os estudiosos encontram dificuldades. Para o pesquisador, uma delas é a falta de consistência no estatuto do desarmamento, que não concede porte para armas de cano longo, nem prevê que biólogos tenham o direito de utilizá-las profissionalmente, como os guardas e vigilantes, por exemplo.

"Quando o biólogo não consegue autorização para o transporte das armas em expedições de coleta, ou ele fica na ilegalidade para fazer o seu trabalho de pesquisa ou para de coletar", explica Aleixo. Segundo ele, a inconsistência oficial gera uma grande perda para as coleções e para a pesquisa ornitológica. Não há alternativa, já que a outra forma de se fazer coleta é com a utilização das chamadas "redes de neblina", que capturam apenas as aves encontradas abaixo de 15m de altura e que compõe apenas 40% do total de espécies da avifauna numa área típica da floresta amazônica.

Dessa forma, com uma ênfase maior nesse tipo de captura sem arma de fogo, haveria poucos dados e consequentemente poucos estudos com aves do estrato médio e dossel da florestal, ou seja, aquelas que estão acima da altura de 15 metros, empobrecendo as coleções em termos qualitativos. "Nós do Museu Goeldi temos sorte, porque a Polícia Federal local entende a importância da coleta e dentro do estatuto do desarmamento nos concedem autorização temporária para o transporte de armas de fogo para fins científicos, mas em vários pontos do Brasil esse tipo de solicitação causa estranheza aos órgãos oficiais, sendo indeferidas, e desestimulando muitos biólogos.

Uma visão negativa - Além desse, ainda existem outros obstáculos encontrados pelos biólogos que fazem as coletas de animais, como a reação negativa das pessoas em relação às armas de fogo e até de alguns pesquisadores da área. "As pessoas das cidades pequenas já estão mais acostumadas com o ritmo de caça e, por isso, não estranham muito as espingardas. Mas a pessoas das grandes cidades tem mais receio, e alguns biólogos acham que coletar animais é antiético, já que mata o indivíduo", explica o pesquisador do Museu Goeldi.

Aleixo, no entanto, faz a ressalva de que o impacto do homem sobre a natureza é inevitável e indiscutível, seja pelo modo de vida ou pelo modelo de produção capitalista. "Pode não ser de forma tão flagrante quanto é a coleta de um passarinho, mas tudo que nós fazemos gera um impacto no meio ambiente como um todo", ressalta Aleixo, lembrando das pesquisas farmacêuticas que se utilizam de animais para realizar os seus testes.

Então, pergunta o pesquisador, "já que vamos causar danos de qualquer forma, por que não fazemos algo para reverter esse dano?" Para o cientista, o que extingue uma espécie "não é a coleta para a pesquisa, mas, a destruição do ambiente natural em que as espécies vivem."

http://www.museu-goeldi.br/sobre/NOTICIAS/2010/outubro/26_10_2010.html

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