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A um passo do fim

Veja, Ambiente, p. 112
17 de Dez de 2003

A um passo do fim
Com apenas 500 espécimes vivos, o peixe-boi-marinho pode desaparecer da costa brasileira

Ronaldo França

Na lista de espécies em risco de extinção, editada pelo Instituto Brasileiro do Meio Ambiente e dos Recursos Naturais Renováveis (Ibama), o peixe-boi-marinho é considerado "criticamente ameaçado". Esse é o termo técnico que indica risco de desaparição completa em pouco tempo. O que chama atenção, nesse caso, é que ele é o único animal nessa situação entre as cinqüenta espécies de mamíferos marinhos que habitam o litoral do Brasil. Há, por aqui, baleias e golfinhos considerados vulneráveis, mas sua população vem crescendo gradativamente ou se mantém estável. O peixe-boi é, mais do que qualquer outro, dependente das ações de conservação. A espécie já foi abundante em quase todo o litoral, mas hoje se resume a menos de 500 espécimes, segundo as estimativas. Sobrevive apenas no trecho situado entre os Estados de Alagoas e Amapá. E, mesmo assim, ocorre somente em pontos específicos, onde as condições ambientais são extremamente favoráveis, com águas quentes e pequena profundidade. Qualquer projeto de preservação de espécies ameaçadas é uma luta difícil. No caso do peixe-boi-marinho, a batalha corre grande risco de ser inglória.
O processo de dizimação do peixe-boi na costa brasileira coincide com o povoamento do país. No Brasil Colônia, os navios partiam rumo à Europa levando toneladas de carne, pele e gordura, produtos então muito valorizados no mercado europeu. O mamífero passou a ser caçado em ritmo acelerado também por uma questão de conveniência. Descobriu-se que sua carne, quando cozida na própria gordura, é capaz de durar meses. Há outra característica que torna a caça atraente. Dependendo da parte do animal que se come, o sabor pode se assemelhar ao de carne de vaca, porco ou peixe. A situação da espécie ficou ainda mais complicada em virtude de uma característica de seu ciclo de reprodução. Cada fêmea tem apenas um filhote, e em intervalos mínimos de três anos. Isso porque a gestação dura treze meses, que se somam a dois anos de amamentação. O peixe-boi é, digamos, uma mãe exemplar.
Como é o único mamífero marinho exclusivamente herbívoro, ele sobrevive apenas onde há grandes bancos de algas, plantas e, especificamente, o capim agulha, sua iguaria preferida. Passa o dia pastando, num comportamento semelhante ao do gado. Daí seu nome. A caça foi proibida no Brasil em 1967, o que reduziu o ritmo do processo de extinção, mas o trabalho de preservação é relativamente recente. O Projeto Peixe-Boi só foi criado em 1980, pelo Ibama. Inclui ações diretas de salvamento, como socorrer, cuidar e devolver ao mar animais que encalham na areia, e monitoramento da espécie. Como a população é pequena, a pesquisa avança em ritmo mais lento. Por isso a preservação é uma corrida contra o tempo. "Uma espécie com apenas 500 animais pode se extinguir facilmente", avisa a bióloga Denise Castro, diretora da Fundação Mamíferos Aquáticos, responsável pelo projeto junto com o Ibama.

Veja, 17/12/2003, Ambiente, p. 112

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