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Um mundo pior na Rio+20

O Globo, Ciência, p. 30
02 de Nov de 2011

Um mundo pior na Rio+20
Consumo de recursos naturais aumenta 40% desde a conferência de 1992

Cláudio Motta

A pouco mais de 200 dias para a Rio+20, a Conferência das Nações Unidas sobre Desenvolvimento Sustentável começa a ganhar conteúdo. Terminou ontem o prazo para os países enviarem suas propostas à ONU, que vai determinar a pauta de debates marcados para entre os dias 4 e 6 de junho no Rio. Também ontem, o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente (Pnuma) publicou em Nairóbi o relatório "Keeping Track of our Changing Environment: From Rio to Rio+20" (De olho no meio ambiente em mutação: do Rio à Rio+20). Os dados mostram que, nos últimos 20 anos, a população cresceu 26% (são 1,45 bilhão de pessoas a mais) enquanto o consumo de recursos naturais aumentou 40%.
O estudo de 111 páginas mostra que as emissões de gás carbônico, principal responsável pelo aquecimento global, aumentaram 36% no mesmo período, sendo que 80% deste acréscimo vêm de 19 países. O Pnuma revela que a temperatura global aumentou 0,4 graus Celsius, ao mesmo tempo em que o número de catástrofes reportadas anualmente dobrou, passando de 200 para aproximadamente 400. E o nível do mar tem aumentado cerca de 2,5mm por ano desde 1992.
O uso acelerado de recursos naturais é um alerta para Humanidade, que pode ter que enfrentar a exaustão de recursos estratégicos, afirma o coordenador dos cursos de pós-graduação em gestão ambiental da Escola Politécnica da UFRJ, Haroldo Mattos de Lemos. Ele ressalta que o homem precisa dar uma resposta rápida ao problema.
- O crescimento do Produto Interno Bruto dos países é acompanhado do aumento do consumo de recursos naturais - explicou Haroldo. - Um dos únicos países que descolou uma curva de crescimento da outra foi a Alemanha, que conseguiu apresentar mais eficiência energética.

Agressão à camada de ozônio diminui
Presidente da Câmara de Desenvolvimento Sustentável da prefeitura e professor da PUC-Rio, o economista Sérgio Besserman vê no relatório publicado ontem pelo Pnuma um conjunto de alertas que sinalizam a necessidade de mudanças. Ele destaca que, de 1992 até hoje, houve um aumento do número de pessoas que estão engajadas com as questões ambientais. Para o economista, o desafio é aliar o desenvolvimento econômico aos limites do planeta:
- Do ponto de vista das transformações objetivas, pouca coisa aconteceu. Temos uma janela de dez a 20 para transformar todo o conhecimento científico em ação.
Especialistas chamam atenção para outro ponto importante do relatório, a segurança alimentar. A produção de alimentos cresceu 45% desde 1992. O consumo de peixes e frutos do mar é 32% maior, e o de carne subiu 26%. Porém, em muitos casos, a exploração dos recursos é maior do que a capacidade de recuperação do planeta: apenas 15% dos estoques de peixes estão abaixo dos níveis de reprodução deles.
- A escala da produção pode provocar um sério problema - afirmou Haroldo. - Por exemplo, a Índia aumentou sua produção de alimentos porque usa mais água subterrânea que as chuvas conseguem repor.
O relatório também mostra dados positivos. A produção de substâncias que atacam a camada de ozônio na atmosfera caiu 93%. Esse era o principal problema discutido na conferência do Rio em 1992. O relatório mostra, ainda, que o percentual de pessoas morando em favelas no mundo passou de 46% para 33% entre 1990 e 2010, ainda que, em números absolutos, tenha aumentado de 656 milhões para 827 milhões.
- O relatório mostra que, quando há uma reação, é possível alterar drasticamente a trajetória de tendências perigosas que ameaçam o bem-estar humano. As iniciativas para acabar com produtos químicos que prejudicam a camada de ozônio compõem um exemplo vivo e poderoso - disse o Subsecretário Geral da ONU e Diretor Executivo do Pnuma, Achim Steiner.
O relatório do Pnuma ressalta, porém, que faltam dados sólidos e sistemas de monitoramento ambientais. A Cúpula Eye on Earth, que será realizada em dezembro, em Abu Dhabi, reunirá cientistas e representantes de governos que discutirão, entre outros tópicos, o compartilhamento de informações.

Brasil: metas globais de sustentabilidade
País apresenta à ONU suas propostas a serem debatidas na conferência Rio+20

Catarina Alencastro

BRASÍLIA. O governo brasileiro apresentou ontem às Nações Unidas suas propostas para a Rio+20, conferência de desenvolvimento sustentável que acontecerá no Rio de Janeiro, de 4 a 6 de junho de 2012. As sugestões são genéricas e, junto com propostas de outros países, formarão o texto base a ser discutido durante a cúpula. A principal proposta brasileira é a adoção de objetivos globais de desenvolvimento sustentável, a exemplo dos Objetivos do Milênio fixados pela ONU para os países em desenvolvimento.
Entre esses objetivos estão a erradicação total da pobreza no mundo, o empoderamento das mulheres e o acesso de todos aos recursos hídricos. Outros propósitos que o Brasil sugere são equidade intergeracional, inovação tecnológica para a sustentabilidade e adequação da pegada ecológica à capacidade de regeneração do planeta. Ou seja, que os países não consumam nem descartem mais produtos do que a Terra é capaz de suportar. Este é um dos princípios ecológicos que vem sendo pregado por ambientalistas desde a primeira conferência ambiental da ONU, em Estocolmo em 1972.
O governo ainda quer que sejam adotados índices de sustentabilidade para referência de investimentos e o incentivo a financiamentos internacionais para projetos de cunho ambiental. A ideia é que bancos de fomento, como o Banco Mundial, procurem criar linhas de crédito específicas para a sustentabilidade ecológica. O Brasil também propõe que os governos deem o exemplo às indústrias, favorecendo o componente ambiental em suas compras públicas. Caso os países não definam números específicos para cada uma das metas, o Brasil sugere a formação de um grupo de trabalho para acompanhar seu cumprimento.
Economia verde e erradicação da pobreza entre os temas da conferência
Outra proposta é pela reforma do Conselho Econômico e Social das Nações Unidas (Ecosoc) para que o órgão também inclua o componente da sustentabilidade em suas ações e que o Pnuma (Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente) passe a receber doações obrigatórias dos países. Hoje, as contribuições financeiras são voluntárias.
O embaixador Luiz Alberto Figueiredo Machado, subsecretário-geral de Meio Ambiente, Energia, Ciência e Tecnologia do Itamaraty, disse que a conferência não pretende resolver problemas nas negociações de mudanças climáticas, mas que provavelmente soluções que resultem na redução de emissões de gases-estufa serão encontradas durante a cúpula.
- Há várias ideias sobre objetivos na área de eficiência energética e energias renováveis, assuntos que têm incidência direta sobre a crise climática - afirmou.
A ministra do Meio Ambiente, Izabella Teixeira, acredita que, embora o documento final aprovado pela conferência não obrigue legalmente os países a segui-lo, certamente trará consequências práticas.
- Quando você negocia leis, há todas as amarras no processo de negociação. O contexto de engajamento político do debate dá outro contexto, você tende a ter mais liberdade de negociar e buscar saídas em conjunto do que quando você está discutindo uma lei. É uma oportunidade de debater sem as amarras políticas tradicionais. É uma conferência para construir soluções. Não é uma conferência para embates - disse a ministra, lembrando que os temas principais da conferência são erradicação da pobreza, economia verde e a governança de desenvolvimento sustentável.

O Globo, 02/11/2011, Ciência, p. 30

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