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Um diplomata holandês meio indígena

Radio Nederland Wereldomroep - http://www.rnw.nl
Autor: Alex Hijmans
18 de Ago de 2010

O que um diplomata foi fazer na floresta e o que fazem dois pajés no consulado holandês em Salvador? A improvável parceria entre um holandês e uma etnia indígena da região amazônica.

Hans Leusen, cônsul honorário holandês em Salvador, estava exausto quando chegou à reserva indígena dos Huni Kuin, no fim do ano passado. Principalmente a região glútea do seu corpo estava dolorida por ele ter sentado um dia inteiro em uma canoa.

Foi a partir de então que a aventura de Leusen começou de verdade: viver como os Huni Kuin em um mundo sem energia elétrica mas cheio de tradições e conhecimentos seculares. Leusen e o etnomusicólogo Ricardo Pamfilio passaram um mês na reserva indígena. Junto com os Huni Kuin fizeram uma impressionante reportagem fotográfica que no próximo mês enfeitará as paredes do espaço de exposição do consulado holandês em Salvador.

Esbanjando alegria
Em algumas fotos está o próprio Leusen, com seu rosto branco pintado na forma de complicados padrões nativos. Seus olhos azuis brilham de felicidade. "Já faz um tempo que eu tinha um desejo profundo de conhecer melhor a população oriunda do Brasil e fazer algo por eles", afirma ele enquanto olhamos as fotos.

Esse desejo se concretizou no projeto Livro Vivo montado pelos Huni Kuni e a AMEI, a associação para a ajuda ao desenvolvimento que Leusen fundou. O conhecimento tradicional medicinal dos pajés estará documentado em um livro. Mas o projeto tem mais pés no chão.

Curso de pajés
O pajé e cacique Inka Muru explica: "Não é por nada que se chama livro vivo. Queremos plantar um jardim de experimentos com 237 plantas medicinais que nosso povo usa há séculos. Agora precisamos ir até a floresta para procurar o que precisamos. Queremos também construir um laboratório nativo onde os pajés do futuro possam ser formados".

Inka Muru e o seu filho Isaca, cacique e pajé de outra comunidade Huni Kuin, estão há um mês em Salvador para trabalharem no projeto da associação AMEI. Ambos são esperançosos com relação ao futuro. "Nosso povo cresce rapidamente. Quando a gente saiu de lá, éramos em 2016 Huni Kuni; agora já devemos ter crescido. Isso porque haviam pelo menos quatro mulheres ao ponto de dar a luz", brinca Inka Muru.

Computadores à energia solar
Mas ele continua a conversa em um tom mais sério. "Nós temos nossa própria reserva, onde nenhuma árvore pode ser cortada. Essa luta nós já vencemos. Agora queremos que o resto do Brasil veja que nossa cultura continua vívida." Assim é hora de trabalhar na reserva, onde, no total, três computadores funcionam à energia solar. Eles não possuem conexão com a internet. E Hans Leusen está decidido a seguir todos os desenvolvimentos bem de perto.

Quem sou eu?
"Antes disso eu trabalhei intensivamente no meu condicionamento físico, porque foi um verdadeiro empreendimento chegar na reserva. Eu não sou mais tão jovem." Quase não se nota que o holandês tem mais de 70 anos. Mentalmente, a floresta também é um desafio. "O mês que eu cheguei lá entrei em um terrível conflito comigo mesmo. Eu fui forçado a me perguntar 'quem sou eu'. Mas isso é uma experiência muito rica."

Mas Leusen não é um principiante. Após concluir os estudos de agricultura tropical, em 1962, Leusen trocou o sul da Holanda pela mata atlântica no sudeste do Brasil. "Lá eu construí minha própria casa, no meio da mata. Assim, estou acostumado a cobras, aranhas e outros animais selvagens."

Cigarros
Leusen conquistou seu maior êxito em São Félix, cidade próxima de Salvador. Lá ele deu nova vida à fábrica de cigarros Dannemann. A empresa de origem alemã e que atualmente está nas mãos de suíços, é uma das melhores sucedidas na área de tabaco. Leusen ainda é presidente de honra da empresa, mas ultimamente suas atividades se concentram no trabalho consular e na associação AMEI.

Posteridade
"Eu já sou viúvo há 18 anos. Não tenho filhos e por isso tenho que me manter ocupado", diz Leusen. "Sempre trabalhei para os outros com muito prazer e sucesso, mas agora eu quero deixar algo para a posteridade. E eu quero principalmente fazer algo pela população nativa, já que eu tenho o sentimento de que no Brasil a causa indígena não é muito popular."

http://www.rnw.nl/portugues/article/um-diplomata-holandes-meio-indigena

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