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Tribunal anula julgamento do caso Dorothy e manda prender fazendeiro

OESP, Nacional, p. A9
08 de Abr de 2009

Tribunal anula julgamento do caso Dorothy e manda prender fazendeiro
Acusado de ser o mandante do crime, Bida, que havia sido absolvido em 2008, será julgado de novo

Carlos Mendes, BELÉM

A Justiça do Pará anulou ontem o segundo julgamento do fazendeiro Vitalmiro Bastos de Moura, o Bida, acusado de ser o mandante da morte da missionária Dorothy Stang, em fevereiro de 2005, e também decretou a sua prisão. O Tribunal de Justiça determinou ainda que seja realizado um novo julgamento do pistoleiro Rayfran das Neves Sales, o Fogoió, acusado de matar a freira com seis tiros. O novo júri dos dois acusados deve acontecer no segundo semestre.

Esta é a segunda reviravolta no julgamento dos envolvidos no assassinato da americana. Em 2007, Bida foi condenado a 30 anos de prisão, mas acabou beneficiado pela lei - revogada no ano passado - que mandava a novo júri réus condenados a penas que ultrapassassem 20 anos. No segundo julgamento, no ano passado, o fazendeiro foi absolvido por 5 votos a 2.

A defesa, nesse segundo julgamento, apresentou um novo depoimento, gravado em vídeo, de Amair da Cunha, o Tato - fazendeiro acusado de ter intermediado o contato entre Fogoió e Bida. Da prisão, onde cumpre pena de 18 anos, Tato disse que seu colega fazendeiro não tinha nada a ver com o assassinato.

O promotor Edson Cardoso reagiu, afirmando que o vídeo era uma prova inédita, à qual não tivera acesso e por isso não deveria ser aceita no julgamento. Mas não adiantou: o júri absolveu o fazendeiro.

"A apresentação da prova feriu o princípio constitucional do contraditório", disse Cardoso. "O pior é que esse depoimento foi decisivo para que os sete jurados absolvessem o Bida."

A promotoria recorreu ao TJ do Pará e teve sucesso. Os desembargadores Milton Nobre, revisor do processo, Vânia Silveira, relatora, e Brígida Gonçalves anularam o júri e determinaram a prisão de Bida. O seu defensor, Eduardo Imbiriba, vai recorrer da decisão.

Fogoió está preso numa penitenciária de segurança máxima nos arredores de Belém. Ele foi condenado a 28 anos de prisão, no primeiro dos julgamentos envolvendo o assassinato da religiosa. Irá novamente a júri porque, segundo os desembargadores, naquela ocasião os jurados não levaram em conta a promessa de recompensa - de R$ 50 mil - pela morte da freira.

A promessa, de acordo com a acusação, foi feita pelos fazendeiros Bida e Regivaldo Pereira Galvão, o Taradão. Este último até hoje aguarda julgamento. O quarto envolvido no crime, Clodoaldo Batista, que acompanhava Fogoió e presenciou o assassinato, cumpre pena de 17 anos.

A desembargadora Vânia Silveira disse, ao justificar seu voto, que a materialidade e a autoria do crime foram comprovadas. Segundo sua argumentação, existem provas de que tanto Bida como Sales "foram os responsáveis pelo homicídio qualificado praticado contra a vítima, a missionária Dorothy Stang, um na qualidade de executor (Sales) e o outro na qualidade de mandante (Bida)."

Cronologia

12/2/2005 - A religiosa Dorothy Stang é assassinada a tiros, em Anapu, no Pará

11/12/2005 - Rayfran Sales, o Fogoió, que seria autor dos disparos, é condenado a 27 anos de prisão

16/5/2007 - O fazendeiro Vitalmiro Moura, o Bida, apontado como mandante do crime, é condenado a 30 anos

22/10/2007 - Fogoió é submetido a novo julgamento e o tribunal do júri confirma a pena de 30 anos

18/12/2007 - TJ do Pará anula segundo julgamento de Fogoió

6/5/2008 - Bida vai a novo julgamento e é absolvido pelo júri

7/4/2009 - Justiça anula absolvição de Bida e determina novos julgamentos para ele e Fogoió

''O circo foi desmontado''

Roldão Arruda

O anúncio da decisão do Tribunal de Justiça do Pará, que anulou a sentença do pistoleiro Rayfran Neves Sales, o Fogoió, e a absolvição do fazendeiro Vitalmiro Bastos Moura, o Bida, foi comemorada por organizações de defesa dos direitos humanos. Na opinião de Mary Cohen, presidente da Comissão de Direitos Humanos da Ordem dos Advogados do Brasil, no Pará, a resolução "restabelece a credibilidade do Poder Judiciário no Estado".

Segundo a advogada, a absolvição do fazendeiro Bida, após ter sido condenado a 30 anos, provocou indignação no Brasil e no exterior. "O que vimos ali foi uma farsa, um circo, denunciado desde o início pelo Ministério Público e pelos advogados que atuavam na acusação. Agora o circo foi desmontado e se restabeleceu o devido processo legal."

Em relação às dificuldades para se chegar a uma conclusão definitiva no julgamento, a advogada observou que estão ligadas a dois fatores. O primeiro era a lei que determinava um segundo julgamento para réus com sentenças acima de 20 anos. "Era uma excrescência jurídica herdada do século 19, que já foi derrubada."

A segunda dificuldade está relacionada ao tribunal do júri - que, no caso em debate, condenou um réu a 30 anos e o absolveu no espaço de um ano. "Será que o tribunal do júri não está precisando de uma reformulação? Embora, teoricamente, seja a mais democrática, esta forma de julgar não poderia comportar situações tão absurdas."

Os bastidores e reviravoltas do julgamento dos assassinos da religiosa constituem um dos temas do documentário Mataram Irmã Dorothy, que estreia em circuito comercial dia 17, em cinemas de São Paulo, Rio, Brasília e Belém.

OESP, 08/04/2009, Nacional, p. A9

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