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Tragédia oculta: as zonas mortas do mar

OESP, Vida, p. A23
Autor: REINACH, Fernando
25 de Set de 2008

Tragédia oculta: as zonas mortas do mar

Fernando Reinach

É fácil sensibilizar o mundo para o desmatamento da floresta amazônica: fotos de troncos carbonizados fazem metade do trabalho. O que poucos sabem é que um desastre semelhante está ocorrendo nos oceanos. Ao longo da costa, acompanhando as grandes ocupações humanas, pipocam zonas mortas, onde a biodiversidade praticamente desapareceu. Apesar de não serem fotogênicas, elas vêm crescendo assustadoramente.

Hoje existem mais de 400 locais nos quais o oceano morreu. A grande maioria está localizada na costa leste dos EUA e no norte da Europa. No Brasil há pelo menos cinco regiões bem documentadas. A zona costeira de Santos e Guarujá e a Baía de Guanabara são as mais conhecidas. No total, estima-se que 245 mil km2 estejam morrendo - isso equivale a cerca de 5% da área coberta pela floresta amazônica.

A causa desse fenômeno é a queda na quantidade de oxigênio dissolvido na água. Sem oxigênio, os peixes e outros animais desaparecem. É um fenômeno semelhante ao que ocorre de forma aguda na Lagoa Rodrigo de Freitas quando milhares de peixes aparecem mortos, asfixiados.

A diminuição da quantidade de oxigênio é desencadeada pelo aumento na quantidade de nutrientes nas regiões costeiras. A abundância provoca aumento rápido dos organismos que utilizam nutrientes, luz e gás carbônico. Em um primeiro momento, esse crescimento atrai outros animais, mas logo a água se turva com o excesso de algas e bactérias. Sem luz, eles morrem. Os cadáveres se acumulam no fundo do mar e permitem a multiplicação de organismos que consomem oxigênio para degradar a matéria orgânica acumulada. Nessa fase, o oxigênio diminui e os peixes desaparecem. Na falta de oxigênio, só sobrevivem os organismos anaeróbicos (que crescem na ausência de oxigênio) que produzem compostos de enxofre, o que torna o ambiente inóspito para a maioria dos animais.

A causa primária desse fenômeno é o uso excessivo de adubos químicos, principalmente compostos nitrogenados, que acabam sendo carregados pelos rios até o mar. Na foz do Mississippi, o excesso de adubo utilizado no cultivo de milho faz com que a zona morta atinja 15 mil km2. Entre 1973 e 1990 uma zona morta de 40 mil km2 surgiu no Mar Negro em conseqüência dos subsídios ao uso de adubos químicos na União Soviética. Com o fim dos subsídios, a zona morta desapareceu.

As zonas mortas, apesar de escaparem aos olhos e não serem sentidas pelo coração de cada um de nós, não são menos importantes que o desmatamento da floresta amazônica. Na realidade, é mais um problema a ser enfrentado à medida que nos preparamos para dobrar a produção de alimentos. É bom lembrar que nos próximos 50 anos o número de bocas a serem alimentadas no planeta vai dobrar. Como alimentar essas pessoas preservando a Amazônia e os oceanos é um dos desafios tecnológicos a serem enfrentados por uma nova geração de agrônomos e ecólogos.

Biólogo - fernando@reinach.com

OESP, 25/09/2008, Vida, p. A23

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