VOLTAR

Tesouros em pedra sob a floresta amazonica

O Globo, Ciencia e Vida, p.48
23 de Mai de 2004

TESOUROS EM PEDRA SOB A FLORESTA AMAZÔNICA
Arqueóloga revela em livro a riqueza oculta do patrimônio de arte pré-histórica da Amazônia brasileiraUma herança de povos da floresta há séculos desaparecidos começa a emergir de alguns dos lugares mais remotos da Amazônia. São centenas de pinturas e gravuras em pedra espalhadas pela floresta, algumas com até 11 mil anos de idade. Obra de tribos antigas que já intrigava os primeiros viajantes nos séculos XVII, a arte rupestre amazônica ganha agora um inventário. Em Arte rupestre na Amazônia — Parᔠ(Editora Unesp/Museu Paraense Emílio Goeldi), a arqueóloga Edithe Pereira apresenta um detalhado levantamento das pinturas e gravuras do Pará, o mais estudado dos estados amazônicos no que diz respeito à pré-história.A beleza das figuras geométricas e representações de figuras humanas peculiares marcam a arte rupestre escondida sob a copa da maior floresta tropical do mundo. Revelar essa arte ao restante do Brasil e mostrar que a Amazônia detém um dos mais ricos patrimônios arqueológicos do país é justamente o maior sonho de Edithe, do grupo de arqueologia do Emílio Goeldi.O nome da Amazônia costuma remeter ao futuro. Mas arqueólogos como Edithe almejam que a floresta seja lembrada por seu rico passado, ainda terra incógnita devido às dificuldades da busca de vestígios pré-históricos em meio a milhões de quilômetros quadrados de mata e à falta de pesquisadores. No Pará há apenas cinco arqueólogos que vivem e trabalham na Amazônia, segundo Edithe.— O patrimônio arqueológico da Amazônia é fantástico. No livro, há 111 sítios registrados só no Pará, mas sabemos que o número real é muito maior. Faltam gente e dinheiro para estudá-lo — diz Edithe. Ela salienta que em Amazonas e Roraima também já foram realizadas descobertas importantes.Desde 1989 a pesquisadora se dedica a esquadrinhar a floresta e relatos de viajantes dos séculos XVII, XVIII, XIX e XX em busca de pistas sobre lugares com arte rupestre — basicamente, toda aquela realizada em pedra. Não é tarefa fácil. As distâncias são imensas, o acesso, difícil. Para alguns lugares, rios são os únicos caminhos.Na floresta a arte está em todo lugar. Por trás de cachoeiras, sob grandes árvores, em grutas, à beira de rios, em paredões rochosos. Poucos sítios foram datados. Entre eles destaca-se o de Monte Alegre, cuja antigüidade remonta a 11 mil anos. Datar pinturas e gravuras rupestres é um processo complexo e nem sempre confiável. A idade dos sítios, em geral, é estimada através do estudo de outros objetos arqueológicos encontrados neles.— As tribos de hoje não reconhecem os desenhos como delas, nem de seus antepassados. Sabemos, por relatos históricos, que quando os colonizadores chegaram os autores dessa arte já eram desconhecidos — observa a pesquisadora.Os pintores de pedras se foram. A arte rupestre é uma forma de manifestação cultural típica da pré-história. Os índios brasileiros hoje não pintam mais a pedra. Edithe diz que no Pará há um estilo bem característico, em que o rosto humano tem seus detalhes representados. O maior temor da cientista é que boa parte desse patrimônio seja destruída antes mesmo de ser estudada. O turismo mal planejado e o vandalismo ameaçam um número cada vez maior de sítios.

O Globo, 23/05/2004, p. 48

As notícias aqui publicadas são pesquisadas diariamente em diferentes fontes e transcritas tal qual apresentadas em seu canal de origem. O Instituto Socioambiental não se responsabiliza pelas opiniões ou erros publicados nestes textos. Caso você encontre alguma inconsistência nas notícias, por favor, entre em contato diretamente com a fonte.