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Terra do guaraná aguarda sua descoberta

FSP, Turismo, p. F12
16 de Mar de 2006

Terra do guaraná aguarda sua descoberta

Maués, município a 267 km de Manaus e só alcançável por barco ou avião, abriga índios que descobriram a bebida

Maués, um município pacato e desconhecido dos ouvidos de várias pessoas, esteve e está na boca do povo de alguma forma. A terra dos "papagaios faladores" -significado de Maués na língua do povo indígena sateré-maué- fica no Amazonas e é mais conhecida como a terra do guaraná.

Chegar a esse rincão, com uma área de 39.988 km2, maior que países como a Bélgica (30.528 km2), e de cerca de 46 mil habitantes, é uma aventura. A cidade só é alcançada por via aérea ou fluvial, em três opções.

De avião, há vôos às segundas, quartas e sextas, com saídas sempre às 11h do aeroporto Eduardo Gomes, de Manaus. O trajeto dura em média 50 minutos, custa R$ 245 (ida) e é operado pela empresa Rico (0/xx/92/3652-1164). O destaque da viagem é a vista aérea do encontro das águas dos rios Negro e Solimões, que formam o rio Amazonas.

Quando o avião sobrevoa Maués, a 267 km da capital do Amazonas, a impressão é a de que o viajante vai pousar no lugar errado. Afinal, onde está a cidade rodeada pela floresta? Uma orla contínua de 6 km com areia branca, que mais parece uma cidade litorânea, se revela como uma das belas riquezas naturais da terra do guaraná. O que se vê do alto são as praias fluviais do rio Maués-Açu e de outros afluentes.

A outra opção é a viagem de barco, que sai de segunda a sábado do porto de Manaus (0/xx/92/ 3621-4301), entre 15 e 17h, e chega a Maués 18 horas depois. A passagem custa R$ 78; a viagem é uma oportunidade de observar o ecossistema local.

Outra possibilidade é ir de ônibus de Manaus a Itacotiara (175 km). A viagem dura quatro horas, custa R$ 24,15 e é feita pelas empresas Aruanã (0/xx/92/3642-5757) e Eucatur (0/ xx/92/3648-1524). De lá pega-se o barco "a jato", que faz o trajeto até Maués em cinco horas. Sai às terças e sextas, às 11h30, e custa R$ 40 (somente ida; 0/xx/92/9995-5011).

A estrutura turística de Maués é incipiente, e a hospedagem fica por conta de cinco hotéis e pousadas simples. O preço médio da diária vai de R$ 50 a R$ 70. A maioria não tem chuveiro elétrico, já que a energia é termoelétrica (a diesel). A falta de banho quente, entretanto, é compensada pelo calor, inclusive à noite.

"Parintins [onde acontece a festa dos bois Garantido e Caprichoso, também no Amazonas] atrai turistas do mundo inteiro. Maués tem uma biodiversidade para ser outra referência no interior. A dificuldade é que Maués hoje não é passagem para ninguém. Isso deve melhorar com o porto e a ampliação do aeroporto", afirmou o prefeito, Sidney Leite (PPS).

Em Maués é possível desfrutar de um encontro de águas semelhante ao que acontece na formação do rio Amazonas. As águas escuras do Urariá se aproximam das águas claras do Maués-Açu, mas não se misturam. Em passeio no rio é possível ver o salto de vários botos e o vôo de pássaros silvestres. O período indicado para ir à cidade é de setembro a janeiro, antes do período das chuvas.

Outros atrativos naturais são ilhas fluviais, como a de Vera Cruz, grutas e cachoeiras. As praias mais movimentadas e de fácil acesso são as de Lombo, Antarctica e Ponta da Maresia, onde há 26 anos acontece, no último final de semana de novembro, o Festival do Guaraná.

Para conhecer todas as etapas da cadeia produtiva do guaraná, que corresponde a 25% da economia de Maués, uma boa opção é a fazenda Santa Helena, um centro de pesquisa com mais de mil hectares, que pertence à Ambev. As visitas podem ser agendadas pelo tel.: 0/xx/92/3542-1153.

Para quem tiver mais tempo, é possível visitar comunidades indígenas, que ficam a até 24 horas de barco do centro -a cidade está dividida em 170 comunidades "brancas" e 33 indígenas. Os remanescentes da tribo sateré-maué preservam o ritual da tucandeira -para marcar a entrada dos índios na vida adulta, os adolescentes colocam um luva trançada com cipós e se submetem às picadas de formigas tucandeiras.

Bebida foi "inventada" pelos nativos

Saterés-maués criaram processo que transforma a semente do arbusto em pó "revitalizante"

Os refrigerantes e o pó de guaraná são resultados de um longo processo, muitas vezes manual, que começou em Maués. O povo indígena sateré-maué foi o primeiro a transformar a planta típica da floresta amazônica em um arbusto cultivado e a desenvolver o processo de beneficiamento da semente.

O guaraná é um fruto vermelho que dá em cachos em arbustos de cerca de 1,5 m de altura. O período de colheita é entre setembro e dezembro, quando os frutos se abrem, e as sementes, que parecem um olho, ficam expostas. Elas são separadas -a casca e a polpa servem de adubo- e vão para o processo de beneficiamento, que inclui a secagem, a torrefação e a pilagem.

A cultura do guaraná é responsável por um quarto da economia de Maués. Cerca de 2.500 famílias trabalham na cadeia produtiva. Um terço da produção é utilizado para a produção do pó, e o restante é comprado pela Ambev, que tem uma fábrica de extrato de guaraná na cidade desde 1940 (Antarctica), além da fazenda Santa Helena, que é um centro de pesquisa.

Outro local de estudo é o Campo Experimental da Embrapa (Empresa Brasileira de Agropecuária) de Maués, que desde 1974 pesquisa o melhoramento genético da cultura do guaraná. As mudas selecionadas são produzidas em larga escala e distribuídas gratuitamente para os produtores. "Analisamos mais de mil espécies para selecionar 12 que são resistentes a fungos e têm uma produtividade até dez vezes maior que a das plantas nativas. Até 2015 queremos substituir totalmente a produção das plantas nativas", afirmou o supervisor da Embrapa em Maués, José Ribamar Cavalcanti Ribeiro, 45.

Até hoje é costume em Maués o consumo do "sapó" -bebida indígena feita com um concentrado do guaraná e da raiz, ralado e diluído na água.

O pó das sementes se transforma em um elaborado artesanato. Misturado com água, o guaraná vira uma espécie de barro. As peças são revestidas por um verniz para conservar o material e custam entre R$ 6 e R$ 400 (tabuleiro de xadrez).

O artesanato do guaraná foi desenvolvido no final do século 19 pela família Doce e vem sendo passado a cada geração.
O atual representante é Naílson Macedo, 33, que, além de fazer em média cem peças por mês, ensina a técnica para dez artesãos da cidade por meio de uma parceria com o Sebrae. "Neste ano o artesanato de guaraná foi exposto em vários Estados do Brasil e até no exterior, na França", afirmou Macedo.

Peixes brilham sobre a mesa

O turista que visitar Maués não deve ter problemas com a alimentação se gostar de peixes. A especialidade dos seis restaurantes são os peixes pirarucu e tambaqui. Os pratos para duas pessoas custam de R$ 15 a R$ 25. Opções: pirarucu à casaca, que é o peixe desfiado com farinha e banana, e tambaqui assado na brasa. Entre as sobremesas, os destaques são os doces com frutas típicas, como o araçá, e com pó de guaraná.

Festa celebra colheita do fruto

Uma das principais festas do Amazonas é a do Guaraná de Maués, que celebra a colheita do fruto no último final de semana de novembro. Na festa, é encenada a lenda da índia Cereçaporanga, da tribo sateré-maué, que se apaixona por um índio mundurucu, tribo rival. O casal morre numa tempestade. No local onde a índia foi enterrada, nasce o primeiro pé de guaraná, que lembra os olhos negros da índia.

FSP, 16/03/2006, Turismo, p. F12

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