Temperatura global atingirá novos recordes até o fim da década

Temperatura global atingirá novos recordes até o fim da década
Calor será ainda maior entre 2016 e 2020, segundo climatologistas

RENATO GRANDELLE
renato.grandelle@oglobo.com.br

O calor que quebra constantemente recordes históricos tende a piorar até o fim da década. A previsão é do Met Office, o instituto de meteorologia do Reino Unido. De acordo com os cálculos, a temperatura global entre 2016 e 2020 deve ficar até 0,77 grau Celsius acima da média registrada entre 1981 e 2010. Para efeito de comparação, o ano de 2015, o mais quente já registrado, terminou com um índice de 0,44 grau Celsius superior ao visto naquele período.
Com o boletim, o Met Office ressalta que o aquecimento global ocorrerá em uma velocidade superior à prevista no último relatório do Painel Intergovernamental de Mudanças Climáticas ( IPCC), divulgado em 2014.
Dough Smith, especialista em previsões decenais do Met Office, adverte que, devido à ação do El Niño, é praticamente certo que 2016 chegue ao fim com temperaturas médias acima das registradas no ano passado.
- No entanto, a sequência de recordes anuais quebrados deve terminar em 2017, com o encerramento do El Niño - explica. - Ainda assim, os altos níveis de gases- estufa na atmosfera continuarão influenciando o clima e nos levarão a anos muito quentes.
Professor de Climatologia da Universidade Federal de Viçosa e ex- coordenador- geral de Mudanças Climáticas do Ministério da Ciência, Tecnologia e Inovação ( MCTI), Marcos Heil Costa acredita que a previsão do Met Office, se for confirmada, levará a resultados "desastrosos" em regiões já vitimadas pelo aquecimento global, como o Oeste da Amazônia e o sertão nordestino.
Os cientistas alertam que o planeta pode passar por uma catástrofe climática se a temperatura média global passar de 2 graus Celsius até 2100, em relação aos níveis registrados antes da Revolução Industrial. Estima- se que o mundo já teria chegado à metade deste índice tolerável.
- A previsão do Met Office é muito pessimista, mas é inegável que a temperatura do planeta avançará por muitos anos, mesmo se houver medidas imediatas contra o aquecimento global - avalia Costa. - Como os gases de efeito estufa ficam muito tempo na atmosfera, a temperatura que temos hoje é vinculada às emissões crescentes nos últimos 30 anos. Então, não sentiremos qualquer efeito contra as mudanças climáticas antes da década de 2040.
Costa também teme que, nas próximas décadas, o Oceano Pacífico devolva à superfície os gases- estufa que sugou no fundo do mar. Esta absorção é um dos principais motivos para que os termômetros não tenham avançado ainda mais, mesmo com a multiplicação de poluentes e poluidores.
AUGE DAS EMISSÕES
A expectativa dos climatologistas é que, em 2020, o planeta atinja o pico das emissões de combustíveis fósseis. Daí em diante, a implementação de projetos contra o aquecimento global poderia levar a uma gradual desaceleração do avanço dos termômetros, e seu freio total a partir de meados do século.
Presidente do Painel Brasileiro de Mudanças Climáticas, Suzana Kahn avalia que os chefes de Estado começarão nos próximos anos a pôr em prática grandes projetos contra o aquecimento global. Não serão suficientes para conter a temperatura no nível desejado pelos cientistas, mas reforçarão a busca por fontes de energia renováveis.
- Nos últimos anos, a demanda por combustíveis fósseis aumentou significativamente - lamenta. - A Europa e os EUA recorreram a eles devido ao seu baixo custo em um momento de recessão econômica. Agora, porém, os países não querem ficar dependentes de uma matriz energética. Devem diversificar seus investimentos, e isso contribui para reduzir a emissão de gases- estufa. Podemos evitar que o aumento da temperatura global chegue a 3 graus Celsius.

O Globo, 02/02/2016, Sociedade, p. 23

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