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Temer recua da nomeação de general e lideranças querem um índio na Funai

Amazônia Real- http://amazoniareal.com.br
Autor: Elaíze Farias
07 de Jul de 2016

Diante dos protestos das lideranças indígenas, o governo interino do presidente Michel Temer recuou na nomeação do general Roberto Sebastião Peternelli Junior para a presidência da Fundação Nacional do Índio (Funai) nesta quarta-feira (6), mas a mobilização contra possíveis retrocessos na política indigenista brasileira vai prosseguir, diz a Articulação dos Povos Indígenas do Brasil (APIB).

Conforme a Amazônia Real publicou no último dia 30, o general Roberto Peternelli foi indicado pelo Partido Social Cristão (PSC) e pelo senador Romero Jucá, ex-ministro do Planejamento e ex-presidente da Funai, além de ser o autor do projeto que prevê a regulamentação da mineração em terras indígenas. O Projeto de Lei de Jucá é contestado por organizações indígenas.

Em entrevista à Amazônia Real, o general Roberto Peternelli confirmou que seu nome foi indicado pelo PSC, presidido pelo pastor Everaldo Pereira, e descartou influência do senador Jucá.

Everaldo Pereira disse à reportagem que não indicou o general. Jucá também negou. No entanto, o nome do general Peternelli foi investigado pela Agência Brasileira de Inteligência (ABIN) como é de praxe para qualquer cidadão que será empossado para assumir um cargo público.

Na tarde desta quarta-feira (06), o ministro da Justiça Alexandre de Moraes se reuniu com uma comitiva de índios Pataxó, Tupinambá e Tumbalala, da Bahia, acompanhado do ministro da Casa Civil, Eliseu Padilha, e da Secretaria de Governo, Geddel Vieira Lima. Na reunião as lideranças foram comunicadas que o general Peternelli não seria nomeado, conforme publicou a Agência Brasil.

"Não será ele [o general Peternelli ] o presidente da Funai. Nós já estamos em negociação com outro tipo de perfil, que já tenha histórico de diálogo com todas comunidades indígenas", afirmou o ministro Alexandre Moraes, para a Agência Brasil.

Na reunião, o cacique Aruã Pataxó disse que com a declaração de Moraes o governo assume o compromisso de não nomear um militar para o cargo. "A gente passou tempos de horrores na ditadura militar, quando vários indígenas foram assassinados", disse.

Chegou a vez dos índios?

Aruã Pataxó também defendeu que um indígena seja o novo presidente da Funai, mas o ministro da Justiça divergiu. Para ele, a indicação de um indígena para a presidência da Funai esbarra na diversidade dos povos.

Já para o cacique Aruã Pataxó, é possível chegar a um acordo para que um indígena preside a Funai. "Acho que é possível as etnias chegarem ao consenso sobre o nome de um indígena para ocupar o cargo, desde que tenha perfil técnico, conhecimento na área, compromisso com a causa indígena e currículo em gestão pública", disse Aruã Pataxó à Agência Brasil.

O cargo de presidente da Funai está vago desde a exoneração de João Pedro Gonçalves (PT) no último dia 3 de junho. Ele está sendo ocupado pelo substituto, Artur Nobre. Daí o Partido Social Cristão (PSC) tenta emplacar um político da sua base na presidência da Funai. O nome do próprio pastor Everaldo Pereira foi indicado. Procurado pela reportagem na ocasião, ele negou interesse na pasta da política indigenista brasileira.

O PSC foi um dos partidos que apoiaram o afastamento da presidente Dilma Rousseff da Presidência da República para o processo do impeachment no Senado.

Além do PSC, o DEM mostrou-se interessado no cargo. O indígena Sebastião Manchinery, do Acre, chegou a publicar que foi indicado em suas redes sociais na internet, mas a informação não foi confirmada pela Funai. O nome de um servidor do Distrito Sanitário (Dsei) Xavante foi sondado também, como apurou à Amazônia Real.

Fórum alertou influência de Jucá

Foi o vice-presidente da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara dos Deputados, Paulo Pimenta (PT-RS), que informou à Amazônia Real sobre a indicação do nome do general Roberto Peternelli para presidir a Funai. Segundo ele, a indicação do militar foi formalizada por parte da liderança do PSC, e contou "com a aquiescência do senador Romero Jucá".

O Fórum Nacional dos Direitos Humanos pela Democracia já tinha divulgado uma nota rejeitando o nome do general Roberto Peternelli para a Funai pelo fato de seu partido, o PSC, integrar as bancadas ruralista e evangélica no Congresso, além do militar não ter experiência na questão indígena brasileira.

Indagado pela reportagem sobre a rejeição das lideranças indígenas ao seu nome, o general Roberto Peternelli respondeu com perguntas, e afirmou que estava à disposição para conversar com lideranças indígenas:

"Você acha que a resistência é por eu ser militar? E você acha certo qualquer resistência de preferência disso, ou de profissão? Você acha adequado? Mas não tem nada confirmado além disso. Eu apenas sou um bom cidadão que se colocou à disposição para ajudar no que for necessário. Não posso falar de uma coisa que não existe ainda. Simplesmente foi uma proposta", afirmou o general Peternelli.

Para Sônia Guajajara, presidente da APIB, o recuo ao nome do general Peternelli pelo governo interino de Michel Temer não suspende a mobilização que está em curso. "Vamos continuar com a pressão. Isso não vai enfraquecer o movimento. Claro que nesse momento a gente focou na não nomeação dele. Mas temos outras pautas. Então, não adianta dizer que agora parou. Pelo contrário. A mobilização continua", afirmou.

Com a divulgação da indicação do nome do general Peternelli para assumir a Funai, as lideranças indígenas, as organizações de direitos humanos e o movimento social iniciaram uma onda de protestos pelo país. Na segunda-feira (04), a Associação Nacional dos Servidores da Funai (Ansef) protocolou um documento no Ministério da Justiça contra a nomeação.

Nesta quarta-feira (06), um documento com mais de 4.700 assinaturas de representantes de 80 de universidades, instituições de pesquisa, organizações indígenas, movimentos sociais e de direitos humanos foi protocolado na Presidência da República, na Casa Civil e na Secretaria do Governo contra a ida de Peternelli para a Funai.

Chegaram à Brasília no início desta semana comitivas de índios Pataxó, Tupinambá e Tumbalala, da Bahia, e ainda devem chegar grupos de Kayapó e Kaingang.

Segundo Sônia Guajajara, foram divulgadas mais de 20 notas de repúdio enviadas por aldeias e organizações regionais e nacionais indígenas contra a nomeação de Peternelli. Ela disse que já na segunda-feira havia sinalização de que o impacto da rejeição ao nome do militar mostrava que o governo não aceitaria a indicação feita pelo PSC.

"O pastor Everaldo é que estava resistindo, insistindo com o nome ele. Teria que ter confirmação do Ministério da Justiça, da Casa Civil. E estava na mão do deputado André Moura (PSC), líder do governo na Câmara. O senador Romero Jucá também estava fortemente junto dessa indicação, embora ele tenha negado. Mas ele é quem está querendo ditar todas as indicações e regras para a Funai. Não é segredo e dúvida para ninguém", afirmou Sônia Guajajara.

Conforme a presidente da APIB, é preciso "continuar atento" porque as articulações políticas entre o governo interino e o Congresso vão continuar. "Qualquer um que assumir vai estar conivente com a violação de direitos indígenas. Quem eles querem colocar vai estar submisso, fazendo isso, que é cumprir acordos. Eles têm alianças formadas. Alianças para impedir demarcação de terras, para criminalizar a própria Funai, com a CPI. Eles querem revogar demarcação de terra", disse.

No próximo dia 13, as organizações indígenas vão realizar um protesto chamado Ocupa Funai, que consiste na ocupação de todas as coordenações regionais e técnicas do órgão e da própria sede da presidência, em Brasília, para chamar atenção à causa. "Será um protesto contra a nomeação, contra o retrocesso, contra a medida que reduz os cargos da Funai, contra a violência aos Guarani-Kaiowá. As manifestações continuarão", afirmou Sônia Guajajara.

A professora de Antropologia da Universidade de Brasília (UnB), Marcela Coelho de Souza, estava no grupo que protocolou 11 notas diferentes assinadas por mais de 4 mil pessoas e instituições contra a nomeação do general Roberto Peternelli. Ela disse que a resposta do governo foi "rápida" diante da mobilização, mas, segundo Marcela, continua temerosa a prerrogativa de que a nomeação do novo presidente da Funai continua com o PSC.

"O importante era para bloquear (o nome do general), pois era especialmente preocupante. Todavia, tememos que o cargo continue para que seja nomeado pelo PSC. Caiu o nome dele (Peternelli). Foi uma primeira vitória importante. Esse nome seria inadmissível. Mas há risco que seja indicada outra pessoa com perfil similar. O governo não está preocupado em conversar com o movimento indígena e nem com a Comissão Nacional de Política Indigenista. A negociação se passa pelo Congresso e suas partes interessadas", afirmou Marcela.

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